“A Beija Flor não tem nada para ensinar”
18 de fevereiro de 2018
“Gatinho angorá”: intervenção no que destruiu
20 de fevereiro de 2018

 Arnaldo César (*)

No Alto Comando a duvida é “e se um dos nossos morrer?” – Foto Fernando Frazão/Agência Brasil

No início de janeiro passado, dois militares do 8º Batalhão da Selva do Exército saíram feridos de um embate com traficantes, no rio Japurá, na fronteira da Colômbia com o Amazonas. Eles tiveram que ser transportados para um hospital de Tabatinga (AM). Nenhum dos bandidos foi capturado por terem abandonado o barco em que estavam. Nele, foram apreendidas 1.200 quilos de skank.

O episódio passou despercebido da maior parte da grande mídia. Apenas a Folha de S. Paulo registrou no seu site – Dois militares são baleados em ação de apreensão de drogas no amazonas. Mas, no Alto Comando do Exército o caso foi utilizado para abrir, pele enésima vez, uma discussão sobre que papel aquela Força deve desempenhar na defesa da segurança do País.

Como se sabe, as Forças Armadas do Brasil – e de qualquer outra nação – não existem para tomar corridão de traficantes. A maioria dos generais, almirantes e brigadeiros com cargos de comando numa destas forças é contra ao papel de polícia que governantes incompetentes desejam lhes impor.

Nas cabeças desses comandantes uma inquietante questão vem sempre à tona: “Como proceder, no caso de um dos nossos vir a ser morto por um traficante, encastelado numa favela?”.

A preocupação não é nova. Vem, desde os tempos em que o então governador do extinto Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, botou na cabeça que tinha que remover as favelas para as áreas mais remotas do Rio, a base de canhonaços.

Naquela ocasião, as elites locais bateram palmas. Exatamente, como fazem hoje, quando passam por um canhão estacionado, na Praça Mauá, em frente ao “Museu do Amanhã”. Para esse pessoal, invariavelmente de direita, só os militares dão conta de conter a violência galopante na cidade.

O Exército promoveu Ação Social na favela Roquette Pinto como exemplo.

Na antevéspera da ECO-92, na favela Roquette Pinto, no bairro de Ramos, às margens da baía de Guanabara, um grupo de traficantes, fortemente armado, tentou invadir o 24 º Batalhão de Infantaria Blindada, vizinho à comunidade, no chamado Complexo da Maré.

Queriam armas e munições. Os mesmo bandidos haviam assassinado dois agentes da Polícia Federal, cujos corpos foram encontrados dentro da baía com pedras amarradas nas cinturas. Também em um tiroteio entre quadrilhas rivais, um sentinela do quartel saiu ferido.

Diante daquela situação delicadíssima, o provável era que o 24º Batalhão invadisse a favela e promovesse a remoção dos moradores. O então comandante Militar do Leste, General Bayma Denis Filho, resolveu usar da inteligência e não da força.

Mandou que a favela Roquette Pinto fosse invadida por médicos, agentes sociais, dentistas, professores e arquitetos militares. Promoveram incontáveis reuniões com a comunidade e a Roquette Pinto transformou-se, durante algum tempo, num dos lugares mais seguros para se viver na cidade.

Denis Filho repetiu, naquela favela, uma experiência do Exército de 1985. Trata-se do projeto “Calha Norte”. Uma combinação de segurança com ação social levada a 400 municípios de oito Estados brasileiros das áreas de fronteira com a Bolívia, Colômbia, Venezuela e Peru, ameaçados de ocupações estrangeiras.

O que foi feito na Roquette Pinto acabou se transformando num “case” de estudos nas academias militares das Forças Armadas brasileiras. Foi uma saída para que o Exército não tivesse que se voltar contra os seus próprios cidadãos.

Foi uma solução pontual. Localizada. Foi feita com o único intuito de mostrar às autoridades públicas responsáveis pela questão da violência que não é com fuzis e canhões que se consertam mazelas sociais seculares. Mesmo porque, é bom não esquecer, os Exércitos – daqui e de qualquer outro lugar do mundo – existem como força de eliminação e não de contemplação.

Temer, Moreira e Padilha: o interesse é abafar a derrota da Reforma da Previdência. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Quando Michel Temer e sua trinca de golpistas – Eliseu Padilha, Moreira Franco e Raul Jungmann – começou a discutir a intervenção militar, em nenhum momento passou pela cabeça deles que tal iniciativa poderá levar as forças treinadas para eliminar inimigos a ter que matar conterrâneos inocentes. Pessoas cujo único crime é estar vivendo numa favela conflagrada pelo tráfico.

A verdade é que o objetivo deles não tem nada ver com segurança pública, paz social ou combate à criminalidade. Os três patetas desejavam – e continuam desejando – encontrar única e exclusivamente um pretexto para adiarem o fiasco da Reforma da Previdência, que deveria ser votada nesta semana.

Escaldados pelas incontáveis vezes em que foram chamados para proteger o Rio dos traficantes ainda não se sabem as razões que levaram o general do Exército Walter Souza Braga Netto, Comandante Militar do Leste, a entrar nesta roubada. Nos bastidores de Brasília comenta-se que Temer e sua camarilha teriam prometido abrir os cofres do Tesouro para reforçar os orçamentos das três Forças.

O General Braga Netto assumiu a missão sem nenhum planejamento prévio. E o mais grave: o comando dele – como todos os demais do País – não têm recursos, nem ao menos para comprar o combustíveis necessário para movimentar as tropas. Da última vez em que foi chamado para uma aventura dessas, o Exército torrou R$ 600 milhões e teve que sair à francesa do Complexo da Maré, no Rio, para não sofrer um vexame ainda maior.

Braga Netto não terá tempo hábil e tampouco recursos para repetir o que fez o seu antecessor Bayma Denis. Mesmo porque, a trinca de trapalhões quer resultados imediatos. Afinal o seu chefe, o ministro impostor, Raul Jungmann, mandou avisar que está pensando na possibilidade de se candidatar ao governo do Rio, em outubro vindouro. Oportunismo pouco é bobagem!

Por isso, se o general Braga Netto entrar calado e sair mudo dessa história – sem que nenhum dos seus comandados seja alcançado por bala perdida ou bala atirada – já será um grande alívio para a sofrida população carioca.

(*) Arnaldo César é jornalista e colaborador deste blog.

 

Aos leitores: O Blog tem por objetivo tratar com detalhes assuntos de interesse público, buscando informações normalmente novas e análises diferenciadas. Busca também artigos que suscitem debates, como este. Por isso, costumamos apresentar menos postagens. Nossa sobrevivência depende da ajuda dos leitores, compartilhando nossos textos para um maior número de pessoas. Contamos ainda com contribuições financeiras para a manutenção desta página, em quaisquer valores e em qualquer periodicidade. Podem ser feitas na conta corrente cujos dados se encontram no quadro ao lado. Desde já agradecemos aos que vêm contribuindo e às novas contribuições.


4 Comentários

  1. Bruno Augusto disse:

    Bom, lendo seu texto, parece que a solução não está no uso das forças armadas. Ao contrário, a intervenção deveria ser feita com médicos, dentistas, engenheiros e outros profissionais, a fim de que a comunidade fosse “sufocada” com tantos serviços públicos. Achei bela a sugestão, mas completamente infantilóide a até ingênua diante da realidade que hoje vivemos.

    Soltar pombas brancas, promover passeatas ao som de canções como “imagine” não resolverão a situação. O Estado deve hj remover o câncer da violência ali instalada com a força bruta do exército. O remédio é amargo, mas, até agora, outros caminhos falharam, de modo que o Estado precisa se impor e eliminar todos os esses elementos que ainda insistem em traficar e viver a serviço da criminalidade organizada. É duro de reconhecer, mas é o que a urgência da atual situação demanda.

  2. […] plausível ainda, como disse Arnaldo César, aqui no Blog – E, se os traficantes matarem um militar? – não se desprezar a participação de outros dois golpistas – Raul Jungmann e Eliseu Padilha […]

  3. C.Poivre disse:

    As FFAA já comprovaram que não defenderão o nosso patrimônio nacional. Também estão permitindo passivamente que estrangeiros ocupem a Amazônia Brasileira a seu bel prazer. Se não servem para defender nossas riquezas e a nossa soberania, afinal pra que servem?

    https://dinamicaglobal.wordpress.com/2018/02/20/a-guerra-chegou-reducao-populacional-trafico-de-drogas-rentavel-invasao-da-amazonia/

  4. Ber disse:

    Tentam impor uma idéia irreal, como pacificar favelas, com traficantes totalmente chapados por drogas, carregando fuzis, metralhadoras, e até armas modernas, tipo lança rojões, granadas, etc, como se toma armas de gente assim? Vai-se pedir com toda gentileza e calma para que entreguem suas armas de bom grado, em nome da paz social, dos direitos humanos, etc? Isso não existe. Isso é demagogia. Podem enganar uma parte da população, ainda mais em ano eleitoral, mas não vão enganar a todos!! Eles são irrecuperáveis, apenas pagam muito bem a grandes escritórios de advogados criminalistas, como forma de garantir a tais bandidos manterem seus negócios como aceitáveis dentro da sociedade, bem como para manter esse lobby, de desacreditar cada vez mais o Exercito e as polícias….Só se resolve isso, com enfrentamentos firmes contra os traficantes e bandidos. Depois que resolver o problema aí, sim, é levar para as comunidades carentes tudo aquilo que o Estado Brasileiro é capaz de proceder, como assistência social, condições melhores de vida para as famílias carentes, empregos, condições melhores de poderem os mais carentes poderem ter ou construir suas casas, etc, aí, sim…

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Social Media Auto Publish Powered By : XYZScripts.com