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Marcelo Auler (*)

Os relatórios de Ramagem na Abin sobre Flavio Bolsonaro são as provas do uso das instituições publicas a favor da família de Jair Bolsonaro (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O afastamento imediato do diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem e de seu assessor, o Agente da Polícia Federal Marcelo Bormevet, Coordenador-geral de Credenciamento de Segurança e Análise de Segurança Corporativa, tanto de seus cargos comissionados na agência, quanto de seus cargos efetivos na Polícia Federal, foi solicitado na manhã desta sexta-feira (18/12) à ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), pelos advogados Ladyane Souza representando a Rede de Sustentabilidade, e Rafael Araripe Carneiro, em nome do Partido Socialista Brasileiro (PSB).

O pedido foi protocolado junto a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6529/DF que o PSB e a Rede de Sustentabilidade impetraram em agosto passado. Nela, o plenário do Supremo, em 15 de outubro, impediu a remessa de informações pelos órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência à Abin, sem que se comprovasse o real interesse público “afastada qualquer possibilidade desses dados atenderem interesses pessoais ou privados”.

Condicionou ainda os pedidos ao “controle de legalidade pelo Poder Judiciário”, considerando “imprescindível procedimento formalmente instaurado e a existência de sistemas eletrônicos de segurança e registro de acesso, inclusive para efeito de responsabilização, em caso de eventuais omissões, desvios ou abusos”. Foi o que propôs a ministra relatora, Cármen Lúcia.

Nada disso, ao que tem sido mostrado, foi cumprido. Tanto que, de forma paralela, sem controle dos sistemas oficiais, Bormevet teria elaborado relatórios com informações do interesse particular da defesa de Flávio Bolsonaro, tal como tem sido noticiado pelas revistas Época e Crusoé.

Os advogados do PSB levaram ao conhecimento da ministra as informações veiculadas pelas revistas a respeito desses relatórios feitos pela Abin – em desrespeito às ordens do Supremo – abastecendo a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no famoso Caso Queiroz. Trata-se do escândalo em torno das “rachadinhas” promovidas por Flávio quando atuava como deputado da Assembleia Legislativa do Rio. Por conta disso, o atual senador e seu antigo assessor, Fabrício Queiros foram denunciados, com mais 12 pessoas, por crimes como peculato organização criminosa e lavagem de dinheiro. Juntando aos autos novas reportagens das revistas Época e Crusoé, Ladyane Souza e Araripe Carneiro sustentam que por descumprir a decisão do Supremo, Ramagem precisa ser afastado, junto com seu assessor.

Perícia de celulares pode provar desobediência

A Crusoé deixa claro que os “relatórios” da ABIN foram enviados por WhatsApp. Resta o PGR pedir perícia dos mesmos.

Na quarta-feira (16/12), diante das negativas do próprio Ramagem e do ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, que em informações enviadas à ministra negaram que a Abin tivesse feito algum relatório, os mesmos advogados, impetraram pedido para que o senador Bolsonaro fosse intimado pessoalmente.

Os advogados explicam que os “relatórios” não eram oficiais, daí a justificativa do diretor da Abin e do ministro negando os fatos. Mas sustentam que eles existem, ainda que feitos de forma “paralela” – tal como a revista Crusoé demonstra na sua edição desta sexta-feira, o que significa o descumprimento da ordem do plenário do STF.

Carmen Lúcia, na manhã desta sexta não acatou o pedido de intimar o senador Flávio. Mas entendeu necessário esclarecimento de tudo, por se configurar um possível crime. Determinou que fosse encaminhado ofício à “Procuradoria-Geral da República para investigar os fatos descritos, os quais, pelo menos em tese, podem configurar atos penal e administrativamente relevantes (prevaricação, advocacia administrativa, violação de sigilo funcional, crime de responsabilidade e improbidade administrativa) (…)”.

Como Augusto Aras já admitiu que se trata de um caso grave, cabe a ele determinar investigações. Ele pode, inclusive, pedir de pronto a perícia do WhatsApp dos celulares de Ramagem, Bormevet e de Flávio Bolsonaro. Com isso, teoricamente comprovaria o envio das mensagens. Já os celulares dos advogados do senador, que também receberam as mensagens, estão garantidos pela prerrogativa do sigilo profissional.

Nesta sexta-feira, porém, os advogados do PSB, antes de terem ciência da decisão de Cármen Lúcia, recorreram a ela para ampliarem o pedido feito dia 16. Querem agora o afastamento de Ramagem e do agente da Polícia Federal que, segundo a Crusoé, foi o autor dos “relatórios” encaminhados pelo diretor da Abin ao senador Flavio por meio de mensagens do WhatsApp. Na petição, explicam:

Ora, Excelência: infelizmente, parece-nos que o temor da existência de uma Abin paralela efetivamente está se concretizando no mundo real. Fazem-se relatórios paralelos, não oficiais, não registrados, fora de qualquer rastro de controle de juridicidade e constitucionalidade, mas utilizando-se de servidores públicos e dos sistemas da Abin, com o aparente único fito de promover fins pessoais do Sr. Presidente, que deveria ser da República, e de seus familiares.

A Abin não é um órgão que serve a quaisquer tipos de fins, mas somente aos públicos. Se autoridades querem promover uma espécie de contra investigação para apurar eventuais nulidades, que isso se dê de forma particular, com a contratação de perícias particulares, serviços advocatícios especializados e outros. E frise-se que isso até poderia ser legítimo, justamente para resguardar a mais ampla defesa. Não se pode, contudo, utilizar a estrutura pública para tal finalidade. Ou simplesmente podemos apagar o termo “República” do art. 1º da nossa Constituição Federal, pois será mera letra morta”.

Prosseguindo, respaldados nas notícias veiculadas por Época e Crusoé, os advogados avançam:

Contudo, diante novos gravíssimos fatos relatados pela imprensa (Crusoé e Época) na data de hoje, as partes autoras pedem vênia para complementarem o pedido feito há dois dias, na medida em que, àquela época, não se sabia a real densidade dos fatos. Então, em complemento aos pedidos da petição do dia 16/12, requerem, em tutela provisória:

a) o afastamento do Diretor-Geral da Abin, Delegado da PF, Alexandre Ramagem, e do Coordenador-geral de Credenciamento de Segurança e Análise de Segurança Corporativa da Abin, o agente da PF Marcelo Bormevet, tanto de seus cargos comissionados na Abin, quanto de seus cargos efetivos na Polícia Federal, até que a Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência delibere efetivamente acerca dos requerimentos apresentados sobre o caso;

b) após a determinação do afastamento, a intimação pessoal dos Srs. Alexandre Ramagem e Marcelo Bormevet para que esclareçam os fatos estarrecedores narrados pela imprensa na data de hoje, apresentando todos os documentos, oficiais ou não, produzidos por eles referentes ao “caso Queiroz”; e

c) nova intimação para o Ministro do GSI, General Augusto Heleno, manifestar-se sobre os fatos novos.

O processo voltou para as mãos da ministra que poderá decidir sobre o pedido antes do recesso de final de ano. Já a perícia nos celulares dependerá de pedido da Procuradoria Geral da República. Aras, em recente manifestação, considerou o fato grave. Ressaltou, porém, que faltava prová-lo. Logo, em busca de tais provas, ele não terá justificativa para deixar de pedir a perícia nos dois celulares, após a respectiva quebra dos sigilos telefônicos do senador e do diretor da ABIN. Pedido que, provavelmente, cairá nas mãos de Luiz Fux, presidente do STF que responderá pelo Supremo no recesso, até dia 15 de janeiro.

(*) Matéria reeditada às 23H50 do dia 18/12 para acertar a data em que a AID 6529/DF foi apreciada pelo plenário do STF. Foi em 15/10/2020, não em agosto, como mencionado, erroneamente, antes. Pelo erro, pedimos desculpas aos leitores.

 

 

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