Quem costuma lançar mão dos jornais e revistas impressas para se informar sobre o caótico momento pelo qual o País passa, deve estar estarrecido tamanha é a parcialidade praticada hoje em dia.
Pressionados pela Internet e comprometidos com um esdruxulo projeto político, os veículos convencionais de informação partiram para um universo de terra arrasada. De um vale tudo insano. Sem qualquer receio de serem manipuladores e irresponsáveis.
A credibilidade, a coerência, a busca da verdade e o respeito aos leitores foram mandadas às favas. Para derrubar um governo legitimamente eleito por 54 milhões de votos aceita-se qualquer baixaria. Especialmente, as que forem desfechadas abaixo da linha da cintura.
Rigor – Muitos devem achar que sempre foi assim. Não conseguem perceber o estado de decadência em que se encontra o jornalismo brasileiro. Sou testemunha de que os profissionais de comunicação deste País já viveram momentos melhores. E, muito mais dignos.
Nos idos dos anos 90, por seis anos trabalhei como repórter e depois editor da revista Veja, na sucursal do Rio de Janeiro. Tomo a liberdade de narrar dois – entre milhares – de episódios por mim vivenciados naquela Casa. Isso para que os leitores deste blog tenham uma compreensão mais apurada do que estamos falando:
1 – As orgias de Collor: No auge do processo de impeachment do ex-presidente, uma senhora visivelmente alcoolizada entrou na redação e despejou um rosário de histórias sobre as aventuras sexuais (nem um pouco ortodoxas) do então jovem mandatário. Foi dito a ela que aquilo só interessava se tivessem provas incontestáveis. Por exemplo, uma foto.
Para surpresa geral, a informante com os braços cobertos de pulseiras, garantiu que havia, pelo menos, um registro fotográfico de um bacanal patrocinado pelo ex-presidente, numa casa de praia, em Búzios. A foto em questão estaca em poder de um cabeleireiro, dono de um salão, numa galeria de lojas, nas cercanias da praça Praça Nossa Senhoras da Paz.
Eu e o fotógrafo Paulo Jares fomos atrás deste senhor. Depois de um chá de cadeira de duas horas conseguimos ser recebidos. De início, negou, peremptoriamente, que tivesse participado destas “comemorações presidenciais”.
Quando ameaçamos promover um encontro dele com a informante confirmou a posse da foto. Pedimos para ver. Fomos à sua casa, em Copacabana. Depois de uma tensa negociação, onde não faltaram ameaças de chamar a polícia, a foto dentro de saco plástico nos foi exibida.
De fato, ela existia. Collor aparecia nu, deitado de bruços, num destes colchões infláveis utilizados para boiar nas piscinas. Ao lado dele, igualmente sem roupa, havia uma bela senhora. O cabeleireiro aparecia, sentado no chão, recostado do colchão, limpado as narinas.
Conseguimos que nos cedesse. Mas, a presença daquela mulher dificultou ainda mais a nossa tarefa. Estabeleceu-se, então, outra negociação com o cabeleireiro. Ele não queria, de maneira alguma, ser taxado pela sua clientela de “dedo duro”. Garantimos que o nome dele não apareceria na matéria. Tratava-se do popular “off”. A senhora desnuda, ao lado do ex-presidente, morava numa das travessas requintadas de Ipanema.
Da casa do cabeleireiro, ligamos para Mário Sérgio Conti, o diretor da Veja na época e avisamos que havíamos conseguido a tal foto e passamos a descrevê-la. A primeira indagação dele foi: sabemos quem são, exatamente, as outras duas pessoas que aparecem na cena. Relatei sobre o “off” e avisei que estávamos a caminho da casa da senhora.
Fomos atendidos pela irmã da socialite. Ela mandara avisar que estava muito abalada e que não falaria conosco. A irmã, contudo, confirmou que ela aparecia na foto e que teve um fortuito relacionamento com o então “caçador de marajás”.
Depois de todos esses cuidados e da maratona para conseguir o flagrante, a reportagem levou duas semanas para vir para as páginas. Nestes 15 dias uma série de rechecagens e confirmações foram exigidas pelo editor da matéria, o hoje laureado escritor Laurentino Gomes.
2) – O Opala verde: Ao longo dos oito meses que antecederam a queda de Collor uma concorrência – ou uma gincana – saudável se estabeleceu entre as revistas Veja e IstoÉ. Uma revelava os interiores da casa da Dinda e a outra respondia com a localização da Fiat Elba.
O editor deste blog, Marcelo Auler, também trabalhava na sucursal neste período. Ao atender uma ligação telefônica, daquelas que ficam tilintando por minutos na redação, recebeu a denúncia de que o filhos do presidente da República, no Rio, eram atendidos por um opala verde, blindado em São Paulo, que alegavam pertencer a um amigo do pai.
Dirigido por motorista da família, o carro, sempre que transportava Arnon Affonso e Joaquim Pedro, os filhos de Collor, era acompanhado por policiais federais encarregados da segurança deles. O que chamou atenção da fonte – mais tarde identificada como um agente da Polícia Federal, hoje delegado aposentado -, foi a saída do carro de circulação após o nome de PC Farias, o tesoureiro da campanha de Collor, surgir nos jornais envolvidos em nebulosas transações.
Com a ajuda da então repórter Mônica Bergamo, que visitou oficinas especializadas em blindagem em São Paulo, foi possível identificar-se a placa do carro: VY 2745 (SP). Através dela, confirmou-se nos registros do Detran que ele pertencia à empresa de PC Farias, a EPC Empresa de Participações e Construção Ltda..
No Rio, o então superintendente da Polícia Federal, delegado Edson Antônio Oliveira (hoje falecido) que antes recusara-se a falar sobre o carro, diante da placa confirmou a notícia. Mas em “off”. A revista também apurou, até junto a familiares dos dois meninos, que eles usavam um opala. Mas ninguém cravava a cor verde.
Mário Sérgio Conti, mesmo com toda essa apuração, não se deu por satisfeito. Exigiu depoimentos de moradores do requintado condomínio Praia Guinle São Conrado, vizinhos de Lilibeth, se tinham visto o opala verde transitar por lá com os meninos a bordo..
Na noite chuvosa da sexta-feira (03/07) eu e a então repórter Telma Alvarenga fomos para a porta da garagem deste prédio com a missão de coletar, pelo menos uma testemunha. Até ás 3 horas abordamos todos os que entraram e saíram do condomínio. A confirmação surgiu por parte do empresário Levy Fonseca, ao admitir que “já vi os meninos no Opala verde”.
Relaxamento – Os dois relatos acima são singelos. Há milhares de exemplos espetaculares de esforço de reportagem praticados por profissionais brasileiros. O que costumávamos chamar de: “rolar – ou ralar – no espinho por uma matéria”. Mesmo singelos esses episódios demonstram ainda o nível de exigência para se colocar uma reportagem nas páginas.
Naquela época o País não estava dividido como agora. Oitenta por cento dos eleitores pediam a saída de Collor. O que, em momento algum, impediu não só que a Veja, mas todas as demais publicações, não abrissem mão dos fundamentos sagrados da nossa profissão.
Desgraçadamente, o sectarismo ideológico nas redações aliado à postura retrógada das seis famílias que controlam os principais veículos de comunicação brasileiros, a nossa profissão mergulhou no mundo das trevas.
Tanto que basta um delegado qualquer da Polícia Federal ou um Procurador Federal falarem que ouviram dizer que o juiz disse que um delator revelou que a Presidente da República pagou o seu cabeleireiro com dinheiro de propina para que isso passe a constar de um parágrafo, numa análise do seu principal articulista e vire manchete do jornal O Globo.
Não se deram nem ao trabalho de ouvir o cabeleireiro e muito menos a presidente. Cada um pode pensar e escrever o que bem entender sobre o que bem quiser. A liberdade de expressão existe para isso. A lei também existe para coibir os excessos e as mentiras.
Só que sob o ponto de vista puramente jornalístico, não podemos permitir que um tribunal tempos depois viesse dizer se o jornal estava correto ou não. Nem todos os leitores são dotados de técnicas para filtrarem o que leem nas páginas.
Independente do que desejam os patrões, “rolar – ou ralar – no espinho” pelos que acreditam na gente é nossa obrigação. Sem credibilidade não valemos nem dois réis de mel coado.
(*) Arnaldo César é jornalista
5 Comentários
Opa!
Existe uma ferramenta filosófica que merece ser considerada aqui: a navalha de Occam, que muito aproximadamente resulta em que, na imensa maioria dos casos, a explicação mais simples é provavelmente a verdadeira.
Pode-se usar a tal navalha para imaginar se realmente “A partir de 2013, o alto comando do golpe, nos EUA, cooptou a burocracia do Estado Brasileiro (PF, MP e PJ). Montou-se então o exército institucional para aplicar o golpe de Estado.” é a explicação mais simples e provável.
Adicionalmente, considerava a Veja não conservadora mas francamente reacionária e provavelmente desonesta. Mas peguem as capas antigas (estão no site) e vejam se ela não estava na verdade fazendo o papel da imprensa livre, ao alertar para a decadência ética do primeiro partido de massas do Brasil.
Agora, se o jogo é para elaborar a teria da conspiração mais rocambolesca para demonstrar que o mensalão ou o petróleo nunca existiram (apesar do mensalão ter sido provado publicamente pelo STF para quem quisesse assistir) é bom avisar. Mas esta dos EUA cooptando todos no Brasil está mesmo muito boa!
Caro Flavio,
Se todas as pessoas com quem conversamos ou debatemos idéias concordassem conosco, não teríamos o contraponto e a oportunidade de rever ou aprimorar conceitos e conhecimentos. A maioria dos que comentam neste blog se mostram equilibrados, educados e com boa capacidade argumentativa; você mesmo é um exemplo disso. Ao citar um trecho do meu comentário, você o usa como mote para concordar em parte e ao mesmo tempo colocar em cheque outra parte do que expus no longo comentário que postei. Indo direto ao ponto: você questionou o que eu disse sobre o chamado mensalão. Há tempos afirmo que foi uma farsa e um espetáculo midiático. Mas não sou eu o primeiro ou o único a afirmar isso. Segue abaixo uma artigo histórico de Luís Nassif, publicado no GGN no último dia 5. O artigo dispensa comentários. Leia e constate o que eu comentei aqui.
Saudações respeitosas,
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O xadrez da manipulação dos fatos e das leis
DOM, 05/06/2016 – 06:45
ATUALIZADO EM 06/06/2016 – 09:52
Luis Nassif
A base de toda sociedade democrática é a informação. Sobre a base da informação, formam-se os conceitos. Dos conceitos nascem os pactos. Os pactos se consolidam em leis. Das leis, derivam os contratos. É esse ciclo que garante a convivência civilizada de opostos, as eleições, a alternância de poder e a construção da democracia, impedindo abusos, selvageria.
Essa é a expressão final do termo segurança jurídica.
Hoje em dia, vive-se um estado de exceção no país, porque esta cadeia foi corrompida. A corrupção de informações e conceitos tornou-se tão ampla e disseminada, que criou-se um novo normal jurídico, onde a exceção tornou-se regra.
Ponto de partida – a era dos factóides soltos
A primeira trinca no sistema de informações ocorreu com o pacto entre os grupos de mídia, proposto por Roberto Civita, da Editora Abril, inspirando-se no australiano-americano Rupert Murdock.
Os princípios do pacto eram a formação do cartel e, sem contraditório, a disseminação de todo tipo de factóide, de notícias falsas, por mais inverossímeis que fossem, acreditando no poder sempiterno da repetição.
Ali encerrou-se um ciclo de mídia em que houve relativa competição entre os veículos, relativo respeito à informação, relativo acatamento das teses legitimadoras, impedindo a disseminação de notícias falsas.
Sem o apoio de uma fonte diária de fatos, o modelo era alimentado pela parceria com organizações criminosas, como a de Carlinhos Cachoeira, com a indústria de dossiês associada, que emerge com o caso Lunus de José Serra e que torna-se elemento central da disputa política brasileira.
As eleições de 2006 e 2010 marcaram o coroamento dessa excrescência. A busca de factóides a qualquer preço gerou as peças símbolos do período: a escandalização da tapioca comprada com um cartão corporativo pelo Ministro dos Esportes Orlando Silva. Ou a denúncia de que um servidor da Casa Civil havia comprado os serviços de vinte bailarinas – e bailarina era um tipo de vaso ornamental para flores.
Segundo passo – o julgamento do mensalão.
Com o mensalão, o sistema ganha musculatura, porque o julgamento passou a garantir um fluxo continuado de fatos com viés claro.
A ênfase inicial no julgamento deveu-se à tática de competir com a geração de fatos da CPMI de Carlinhos Cachoeira – que expunha as parcerias da mídia com organizações criminosas.
Em pouco tempo o fato AP 470 se sobrepôs ao fato CPMI de Cachoeira. E a mídia descobriu a eficácia da parceria com o sistema judicial, explorando episódios que garantissem um fluxo diário de fatos.
Ali houve a primeira contaminação, a primeira quebra grave no sistema judicial, fundando-se em uma notícia falsa como peça central de um julgamento relevante.
Esqueça-se o petismo e o anti-petismo, as polêmicas em torno de José Dirceu, a malandragem pouco sutil de Pizolatto, e concentre-se no fato: todo o julgamento baseou-se em uma informação falsa: o desvio de R$ 75 milhões da Visanet. Os próprios funcionários do Banco do Brasil – que detestavam Pizolatto – asseguraram que jamais ocorreu o tal desvio.
Posteriormente, a Lava Jato escancarou o gigantesco processo de propinas da Petrobras. Mas a AP 470 se baseou em uma mentira.
A informação falsa foi a peça central da acusação, aventada pelo Procurador Geral Antônio Fernando de Souza, endossada pelo grupo de procuradores que trabalhou no processo e acatada pelo ex-procurador Ministro Joaquim Barbosa e pelo pleno do Supremo.
Como foi possível um fato de tal gravidade ter sobrevivido à tantos filtros? E como foi possível deixar de lado o laudo da Polícia Federal sustentando que a maior parte dos recursos de Marcos Valério foi bancado pelo grupo Opportuniy, do banqueiro Daniel Dantas?
Ali ficou claro que a Corte Maior havia se rendido às paixões políticas. E as análises colegiadas não serviam de filtro às narrativas do Procurador Geral. Pouco depois de deixar a PGR, aliás, Antônio Fernando assumiu um escritório de advocacia que conquistou um mega-contrato da Brasil Telecom, de Dantas.
Dali em diante, todo o sistema de informações do país entrou em curto-circuito. Mídia, partidos políticos, agentes do Estado, juízes passaram a tratar o fato de forma utilitária, adaptando-o às suas preferências partidárias, adulterando-o se necessário através do recurso da manipulação de ênfases e de interpretações.
Antes, à falta de fluxo constante de notícias, os grupos de mídia esfalfavam-se em factóides sem nenhuma verossimilhança. Com o julgamento do mensalão, descobriu-se o que os golpistas de 1954 sabiam: a base de toda ação desestabilizadora consiste em um evento, com geração diária de fatos e com o controle das versões pelos grupos hegemônicos de mídia. Foi assim na CPI da Última Hora, com Vargas. Foi assim na AP 470.
Terceiro passo – A campanha negativa a partir de 2012.
Valeram-se desde as falsas ênfases (enfatizar o fato negativo irrelevante para ocultar o positivo relevante) até as falsificações de notícias. No dia da inauguração da arena do Corinthians, a manchete de um jornal foi sobre a falta de sabonete nas pias do banheiro.
Ora, nos Estados Unidos houve o fenômeno mãe, o caso FoxNews, de Murdock. Mas as instituições dispunham de anticorpos, seja no jornalismo referencial de outros veículos, como o New York Times, seja no próprio processo de formação de opinião do Parlamento e do Judiciário. No Brasil todos os grandes veículos embarcaram no mesmo jogo do anti-jornalismo.
O grande problema foi quando o desvirtuamento das informações atingiu o sistema jurídico. Não apenas os fatos, mas os conceitos passaram a ser deturpados. E a parcialidade da Justiça abriu sua bocarra, através de Gilmar Mendes.
Quarto passo – o fator Gilmar Mendes.
Nenhum outro personagem foi tão daninho à ordem jurídica e ao sistema de informações quanto Gilmar Mendes. No início, meio sutil, depois escancarando sua parcialidade, mostrou seguidamente à opinião pública que a lei, ora a lei, é apenas um instrumento para legitimar a vontade do julgador. Vai perder uma votação? Basta pedir vista por tempo indeterminado. É “inimigo”? O peso da condenação. É “aliado”? A defesa por todos os meios, jurídicos e jornalísticos. O mesmo garantista que interrompeu a Satiagraha se tornou o mais iracundo acusador em operações contra “inimigos”.
A parcialidade criou uma pedagogia negativa, para o público uma demonstração da parcialidade do julgador, abrindo campo para que outros operadores da lei – juiz, procurador ou delegado — passassem a exercer o subjetivismo em favor de suas preferências pessoais.
Quinto passo – a Lava Jato
Chega-se, finalmente, ao ápice desse modelo na Lava Jato, com o uso disseminado dos vazamentos, praticados em inquéritos sob sigilo em Curitiba, na Procuradoria Geral da República e no Supremo Tribunal Federal, devidamente amarrados com a agenda do impeachment.
Nesse momentos, instaura-se o novo normal. Não interessam as coletas de provas, indícios, evidências: vale a versão publicada. Não interessa o processo jurídico: vale o julgamento midiático. Todos os vazamentos têm objetivos políticos claros e exibição de músculos por parte de seus autores. E abandona-se definitivamente a presunção da isenção para perseguições políticas ostensivas.
Sexto passo – a campanha do impeachment
A campanha do impeachment é mera conseqüência dos passos anteriores. E se tornou a comprovação mais acabada do desvirtuamento de fatos e de conceitos.
Agora não são mais procuradores e delegados transformados em editores de jornais, nem deputados paleolíticos com seus gritos guturais e seus rituais selvagens. São também juristas, Ministros do STF, ex-presidente que aderem ao jogo, ou se eximindo ou assumindo de público a constitucionalidade do golpe, em um momento em que todos os fatos são transmitidos em tempo real para o mundo. Por seis decretos de remanejamento de despesas, jogam-se no lixo 54 milhões de votos e assumem interinos, sem mandato popular, comportando-se como conquistadores espanhóis empenhados em destruir a civilização anterior.
É nesse momento que o processo de desconstrução dos fatos, de livre criação de narrativas, ainda que inverossímeis, definem a nova cara institucional do país, o novo normal, trazendo de volta o fantasma da insegurança jurídica.
A reação instintiva das ruas
E aí ocorre um fenômeno interessantíssimo.
Em que pese todo fogo de barragem dos grupos de mídia, todo o poder de disseminação de versões, de boatos, de factóides, a narrativa do impeachment constitucional não pegou.
Agora, nas ruas, não estão mais as massas tangidas por um sentimento difuso de descontentamento com a crise política, com a falta de perspectivas e com os erros da presidente.
Os manifestantes não são meramente petistas, movimentos sociais, mas também grupos dos mais distintos, segmentos dos mais diversos que entenderam, seja pelos debates na Internet, seja por intuição, a importância da legalidade, do cumprimento das leis, da Constituição, os riscos de retrocesso, muito mais do que a erudição sem conseqüências de Ministros do Supremo, a exibição de músculos do Procurador Geral, o sebastianismo de procuradores evangélicos e a truculência de delegados barras-pesadas, todos armados até os dentes com instrumentos de poder de Estado.
É essa a grande batalha nacional, onde Dilma ou Temer se tornaram símbolos, muito mais do que protagonistas. Fora do poder, Dilma ganhou uma dimensão simbólica que jamais teve antes em seus tempos de presidente, nem quando gozava de índices elevados de popularidade, muito menos quando atropelou as esperanças populares, após as eleições de 2014.
A batalha do impeachment tornou-se definitivamente a luta da civilização contra a barbárie, dos fatos contra as manipulações, da democracia, ainda que imperfeita, contra o assalto ao poder.
E, dessa avalanche, surge finalmente o melhor do Brasil: a moçada que descobriu a nova política, não mais atrelada a partidos, mas a bandeiras.
O Brasil moderno está em plena efervescência. Não sei se a ponto de derrubar o castelo de manipulações erigido nos últimos anos, mas certamente para confrontar o atraso em um ponto qualquer do futuro.
Adendo ao comentário-réplica.
Há uma entrevista de Pepe Escobar a um jornalista francês e uma fala de Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, que confirmam tudo o que eu escrevi no primeiro comentário. Os links são: https://www.youtube.com/watch?v=iU6I4UWKsx8 e https://www.youtube.com/watch?v=P63XFVSgMFo
Prezado,
Concordo em gênero número e grau.
Creio ser importante observar que este movimento de cooptação das instituições citadas não se deu ao mesmo tempo. De todas a PF foi a que pulou mais cedo e alegremente no colo dos serviços secretos e de desestabilização de governos dos EUA.
Sou ácido crítico dos veículos da chamada ‘mídia tradicional’. Como leitor, tenho a mesma percepção demonstrada pelo jornalista que escreveu este artigo. Arnaldo César omite alguns fatos importantes, dentre eles o de que Collor foi promovido e alçado à condição de ‘celebridade’ e ‘caçador de marajás’ exatamente pela revista Veja, que na época fazia alguma coisa que se pudesse chamar de jornalismo, mas que era conservadora e já demonstrava ser assassina de certas reputações, ao mesmo tempo que blindava personagens com ‘culpa no cartório’. Passada a era Collor, Itamar Franco jamais teve tratamento benevolente da imprensa, como Collor no início. Depois, na era FH, toda a grande imprensa passou a ser bajuladora e cúmplice do presidente da república, do seu partido, dos seus aliados e auxiliares no governo.
O PT sempre foi hostilizado pela chamada ‘grande imprensa’ ou ‘grande mídia’. A lua de mel com Lula e o PT durou apenas uma ano; desde então os veículos da grande mídia se transformaram no PIG. O recrudescimento se intensificou a partir de 2010. Desde essa época os jornais e revistas se transformaram em panfletos políticos da direita reacionária e retrógrada, trabalhando em conjunto pelo aniquilamento da Esquerda, do PT e dos líderes desse partido e desse espectro político. Basta relembrar o que foi o chamado ‘mensalão’ e a AP-470 dele derivada. O jornalismo dos grandes veículos de mídia morreu definitivamente em 2010. De lá para cá, os veículos do PIG nada mais são do que fétidos cadáveres ambulantes. A partir de 2013, o alto comando do golpe, nos EUA, cooptou a burocracia do Estado Brasileiro (PF, MP e PJ). Montou-se então o exército institucional para aplicar o golpe de Estado. Com a eleição do pior, mais conservador, reacionário e corrupto parlamento brasileiro, em 2014, o ‘time’ do golpe ficou completo. O personagem usado para a linha de frente do golpe foi o campeão de corrupção Eduardo Cunha, que está sendo protegido não só pelos colegas da Câmara e do PMDB, que hoje ocupa o Planalto com anão político e moral Michel Temer, como também pelo PGR e pelo STF, que jogam para platéia, fingindo querer punir o deputado carioca, presidente afastado da Câmara. O PSDB e os demais da direita reacionária, neolibelê, privatista e entreguista posam de virgens, mas sua atuação é de fazer inveja às (e aos) profissionais do sexo.