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 Marcelo Auler

A reportagem publicou declarações de Marcelo Crivella que contestam a Nota de Esclarecimento da Arquidiocese. Alguém faltou com a verdade. Quem?

A reportagem publicou declarações de Marcelo Crivella que contestam a Nota de Esclarecimento da Arquidiocese. Alguém faltou com a verdade. Quem?

Um dos principais papeis da imprensa, quando não quer ser mera correira de transmissão, é questionar, investigar, levantar dúvidas para, ao tentar responde-las, esclarecer/informar os leitores. Por isso que hoje já nem concordo tanto com a qualificação de “jornalismo investigativo”. Investigar é uma função jornalistica por natureza, seja em que área for.

Coloco isso a propósito da reportagem publicada na terça-feira, dia 1/11, em O Globo, de autoria de Ruben Berta: APERTO DE CINTO: Crivella anuncia o fim do ciclo das grandes obras. Ali, nó pé da matéria, uma nota chamou a atenção de muitos. Menos, ao que parece, do jornalista e de seus editores. Ela registra:

“Crivella também revelou uma curiosidade da campanha: disse que em momentos difíceis do 2º turno recebeu, muitas vezes de madrugada, mensagens de apoio do arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta.

— Dom Orani, puxa vida… De madrugada… Nos momentos mais impactantes… Quando havia aqueles abalos císmicos, quem mandava mensagem? Dom Orani, os padres…

Ao publicar esta afirmação do prefeito eleito, bispo licenciado da Igreja Universal, o jornal não deveria, imediatamente, questionar a Arquidiocese do Rio de Janeiro? Afinal, no último dia 25 de outubro, logo após um grupo de padres católicos declararem apoio a Marcelo Freixo, a Cúria soltou a nota de esclarecimento acima – que publicamos em O Papa Francisco, dom Orani e a eleição no Rio. Reclamou dos padres por tomarem posição. Mas, pelo que se vê agora, não foi bem por a Igreja ser apartidária conforme consta da nota, mas sim por terem optado pelo candidato da esquerda. Aquele que o conservadorismo da Igreja identifica como o novo anti-Cristo.

O blog, estranhando a informação de Crivella, na terça-feira, (01/11), procurou a assessoria de dom Orani e dela recebeu duas respostas:

Adionel. Boa tarde. Você e dom Orani viram isso? 
    Sim.
É verdade? 
     Não sei. Quando souber algo aviso
Até o momento em que postamos esta reportagem, (11h00 do dia 2/11) a resposta não chegou.

Dom Orani logo desautorizou o uso da foto ao lado do bispo licenciado da Universal no primeiro turno das eleiçõe. Mas depois o apoiou com telefonemas "de madrugada"

Dom Orani logo desautorizou o uso da foto ao lado do bispo licenciado da Universal no primeiro turno das eleiçõe. Mas depois o apoiou com telefonemas “de madrugada”

De todo este episódio, há questões que merecem esclarecimentos, não ao Blog ou ao editor dele, mas aos católicos. Se era para apoiar Marcelo Crivella – apesar do chute na Santa dado por um bispo da Universal do Reino de Deus, e de tudo que ele escreveu, como mostrou Fernando Molica, em O Globo – Em livro, Crivella ataca religiões e homossexualidade: ‘terrível mal’ – por que não o fez abertamente? Qual o motivo de mensagens para Crivella “de madrugada?” E qual seria o motivo de ter desautorizado o uso da foto em que os dois apareceram juntos? Não havia pré-disposição em apoiá-lo?

Ficam ainda algumas dúvidas: a repreensão aos padres que apoiaram Freixo foi por eles terem tomado partido nas eleições, ou especificamente por defenderem uma candidatura de alguém da esquerda? Qual será a reação dos “irmãos” de episcopado de dom Orani, em especial a cúpula da CNBB que andou criticando a PEC 241, que foi defendida pelo arcebispo do Rio e tem o respaldo de Crivella?

Há, porém, uma curiosidade maior: o que levou o bispo Crivella a revelar tais telefonemas? Foi um simples escorregão, ou o fez de modo pensando para deixar claro um apoio que, ao que parece, estava seno dado por debaixo do pano?

dom-orani-e-crivella

Na coluna Rosa dos Ventos, na revista Carta Capital, Maurício Dias falou das recomendações iniciais de dom Orani Tempesta, logo desmentidas pela Arquidiocese. Mas o recado, tal como ele informou, foi ouvido em missas de domingo.

Crivella confiável? – Cabe aqui um registro desse comportamento de dom Orani. Como Mauricio Dias noticiou na sua coluna Rosa dos Ventos, da revista Carta Capital e nós reproduzimos na reportagem O discreto troco de dom Orani Tempesta a Marcelo Crivella, no início do segundo turno dom Orani chegou a recomendar a um grupo de padres de sua maior confiança que lembrassem que “católico não vota em que não é católico” e que “prefeito não faz leis”. Era um recado, indireto, pró-Freixo. Mas a pressão conservador foi maior.

Tanto que, sem alarde, surgiu a Carta Compromisso com o Povo Carioca, na qual Crivella comprometeu-se a “respeitar o magistério da Igreja Católica, defender e promover: o direito pleno à vida, desde a concepção até a morte natural; a família, constituída de acordo com a doutrina da Igreja; a infância e a juventude; o respeito à fé católica e todos os seus símbolos, ritos, manifestações e templos”, entre outras coisas.

Assinada no dia 21 de outubro, ela só ganhou um pouco de publicidade na página do Face Book do conservador Padre Augusto Bezerra. Ali, ele confessa que a Arquidiocese viveu dias difíceis até que “Marcelo Crivella decidiu de modo público firmar a carta compromisso com a Igreja Católica”. Para ele, o bispo licenciado da Universal fez isso

“procurando se emendar para estabelecer um canal de diálogo“.

Pelo jeito, conquistou o diálogo, de forma sorrateira, em mensagens de madrugada, e o apoio de diversos padres, como Bezerra, que publicamente apoiou o voto em Crivella sem ter os problemas que seus colegas que apoiaram Freixo tiveram.

O único mistério é o motivo de, após eleito, o bispo licenciado da Universal ter revelado os telefonemas que recebeu de dom Orani. Pode ter sido sim, o primeiro sinal, de que não será um prefeito tão confiável como alguns, na Igreja Católica do Rio, imaginavam que seria. Isso só o tempo confirmará.

 O Ovo da Serpente – Ainda sobre o mesmo assunto, recomendo a leitura de O Ovo da Serpente, texto postado no Face Book pelo sociólogo católico Luiz Alberto Gomez de Souza. Reproduzo, abaixo, dois trechos do artigo:

“Com um pouco de ironia poderia eu insinuar: Solidariedade corporativa entre dois bispos? Alguém, em troca, ingenuamente declararia: “Prova de ecumenismo”. Ora, nós sabemos que a Igreja Universal, com um plano de poder, não tem nada de ecumênica. Leiam o livro do bispo Macedo, tio do bispo Crivella, “Plano de poder” (2008). Ali ele fala da ascensão dos evangélicos como determinada pela Bíblia: ”grande projeto de nação pretendida por Deus… Bíblia é um livro que sugere resistência, tomada e estabelecimento do poder político ou de governo”. Na véspera, na coluna de Ancelmo Gois, do mesmo O Globo, podemos ler: “Marcelo Crivella… não esconde que sua meta é chegar à Presidência da República”. (…)

Talvez um dia muitos católicos integristas, unidos ao fundamentalismo de certos neo-pentecostais, descobririam um pouco tarde, que pavimentaram o caminho para um plano de poder anti-democrata, anti-laico e anti-plural, que se voltaria contra eles, sacrilegamente Bíblia em mão. É isso que estariam preparando com uma terrível irresponsabilidade”.

9 Comentários

  1. Joao Luiz Pereira Tavares disse:

    Tudo mesmo é uma QUESTÃO DE NARRATIVA. Sobretudo em Campanha Eleitoral…

    Vamos lembrar algumas. Veja:

    Por exemplo, “Golpe” é propaganda de sabonete!

    Ainda o PT tem o poder das NARRATIVAS. Perceba as ocupações e invasões de escolas secundárias e as contradições presentes… Ou, também, por outro lado, observar os nossos impulsos e comportamentos diários no âmbito da pu-bli-ci-dade… Que é uma espécie também de NARRATIVA (imagens; embalagens; fotos suculentas; slogans; frase-clichê: tipo «Coração Valente»).

    Por exemplo, analisando apenas uma frase-clichê de a pouco, a “não vai ter golpe” (substituída dissimulada e suavemente pela mais “moderninha”, ” chique” e mais recente “Fora Temer”). Eis:

    “Golpe” é sabonete com proteína.

    GOLPE é papo furado… Fique atento, reflita e pense. É clichê publicitário Petista (o dito «SLOGAN», compreende?). Do tipo que vem escrito nas caixinhas de SABONETE com proteína do leite e karité, hidratação DUPLA.

    SUI-GENERIS:
    Cabeças arejadíssimas e sui-generis são críticos do PT…
    Não é aquele papo repetitivo de Petistas, não… Confira e analise, para confirmar isso. Reflita.

    Eis:
    AS FRASINHAS DO PT: “casa grande e senzala; “burguesia”; «velha mídia»; “pobre viajando de avião”; minha casa minha vida; “PRONATEC” (a maior picaretagem do planeta!); “não vai ter golpe” substituído por “fora Temer”; “coxinha”; a picaretagem máxima de rir: “fascista” (inflação total do conceito!); “luz para todos”; “Coração Valente” e o clássico: “Nunca na história desse país”…, do Molusco.

    O PCdoB (puxa-saco SEM IDENTIDADE própria) assina embaixo de TUDO do PT!

  2. ari disse:

    Na juventude, fui militante da ação católica. A igreja acabava de fazer a maior autocrítica que uma instituição de seu porte já tinha feito. Vibrávamos com os ares de renovação. Foi a época da opção preferencial pelos pobres. Mas veio João Paulo II e levou-a de volta para a sacristia. Surgiu a renovação carismática, o mais refinado “ópio do povo”
    A CNBB, às vésperas do golpe, soltou uma nota no estilo “não sou contra nem a favor, muito antes…” e lá estavam seus deputados (Eros Biondini, Flavinho, Gussi e outros) votando a favor, fazendo o mesmo com relação à Petrobrás e a PEC 241.
    Em 14/10 último, o Blog Cartas Proféticas, em seu artigo Os cardeais Orani e Odilo massacram Jesus a marretadas ao apoiarem o golpe! denuncia o apoio desses cardeais ao Temer.
    Moro no norte da Bahia, onde posso sintonizar a Rádio Rural, da diocese de Petrolina (AM730.COM.BR). Ali, às 11,30, o bispo mostra o que é “igreja apartidária”. De vez em quando eu o ouço. Sofrendo de monomania em estado galopante, ele sempre dá um jeito de falar contra o PT, Lula e a Dilma de forma extremamente leviana, sem a menor preocupação com os fatos, como no dia 4 último, por exemplo, ao afirmar que eles quebraram um país que era maravilhoso quando o receberam em 2003. Para ele, o bolsa família é uma esmola, eleitoreiro e induz à ociosidade.
    Até hoje, nas vezes em que o ouvi, nenhuma crítica ao golpe ou aos golpistas.
    Infelizmente essa é a igreja. Dom Guilherme Werlang e alguns outros são exceções pontuais.

  3. Heitor disse:

    Os padres coxinhas fizeram desta eleição um verdadeiro plebiscito: a favor ou não da ideologia de gênero.
    Com isso tiraram a discussão da vida dos católicos.
    A maioria que não votou no Crivela por falta de confiança, foi induzida a anular o voto.
    Os padres, do nada, começaram a ligar esta ideologia ao comunismo e pior, a fazer a cabeça do rebanho que a esquerda é comunista.
    Os padres pregam a desinformação. Rebanho burro é mais fácil de conduzir.
    Um padre do bairro de Vila Isabel chegou a escrever um artigo no jornal de sua paróquia citando a proibição dos católicos votarem em comunistas, usando o canon 1933, no Código do Direito Canônico de 1917. Não só esse CDC está obsoleto (o vigente é de 1983), como omitiu em seu artigo que esse canon fora revogado em 1966 pelo Papa Paulo VI.
    Ou esse padre foi mal instruído no seminário ou estava mal intencionado. Ibdelies is fiéis daquela paróquia.

  4. […] Fonte: Crivella, dom Orani e a omissão da imprensa | Marcelo Auler […]

  5. No parágrafo que cita minha matéria no blog tem um problema de interpretação textual. Lá quando eu disse as palavras “Isso até que Marcelo Crivella decidiu firmar uma carta compromisso” estava falando da ausência de grandes manobras políticas e não de tudo ter se tornado mais fácil para a Arquidiocese a partir da carta, até porque isso nem seria verdade. Embora isso possa ser útil para a sua inclinação crítica, alguém comprometido com a verdade e a busca investigativa poderia de repente corrigir. Ora, tal carta só gerou uma reação desesperada da esquerda e causou mais confusão. É insustentável afirmar que ela foi tão tranquilizante assim como sugere esse parágrafo. Sua matéria se intitula investigativa mas há inverdades. Nem me aterei a elas, pois demandaria outro artigo praticamente. Faço a incisão somente onde me citou de maneira equivocada para não perder tanto tempo. Contudo tem o direito de livre expressão. Abraço. E obrigado pelo conservador. É um fortíssimo elogio no mundo em que estamos.

    • Fred Marques disse:

      Bom dia Padre.

      Se me permite gostaria de dizer que após ler a íntegra de seu texto aqui citado, a única interpretação possível é que existe um apoio não abertamente declarado, ou a menos uma sutil insinuacao a apoiar o bispo Crivella, em detrimento a uma inegável crítica ao candidato Freixo, e a qualquer outra causa política ligada a qualquer outro partido, dito, de esquerda.

      Existe uma evidente repulsa a idéia de que alguns nomes católicos teriam declarado apoio ao então candidato Freixo e uma perceptível omissão em estabelecer, ao menos nesse texto, uma crítica ao também candidato bispo Crivella.

      Pode-se perfeitamente conceituar uma idéia irreal, inveridica, falando a verdade.
      i
      Para isso, basta se falar apenas parte da “verdade”.
      i
      Como católico, com um filho de 11 anos frequentando o “catecismo” falo que a percepção dentre aqueles que desejam a manutenção da igreja católica no mundo é que “religiões” como a do bispo Crivella representam seguramente o maior perigo (e maior “inimigo”) para a existência de não apenas o catolicismo, mas de todas as outras religiões cristãs.

      Inclusive as demais ditas “evangélicas”, e essa sim, a meu ver, humilhante falando, deveeria ser uma posição definitiva e inflável da igreja católica, quaisquer que fossem o campo de algum “embate” da idéia de vida cristã.

      Afora o fato de tal “igreja”, e outras que surgiram em seu rastro (todas verdadeiras caça níqueis) serem extremamente danosas ao ser humano, em especial o mais humilde, quer seja em sua vida socio-finaceira, quer seja em sua alma.

      As ideias e interesses dos chamados, grupo de esquerda, ao olhar de um católica comum, mas lhe garanto, profundamente observador do ambiente político boa últimos 20 anos, parece muito mais próximo de uma vida cristã do que aquilo que o bispo Crivella, e sua igreja, representam.

      Em seu texto, transbordam críticas a dita “esquerda” o vigor que só observei em textos e falas de grupos políticos opositores ao então governo petista, e em origens de representantes do tal “conservadorismo”, sem que eu tenha encontrado ali um mero contraponto, uma simples menção a um “apoio” ao bispo Crivella.

      O que torna um apoio velado, repito, talvez por ausência de toda a verdade, ou de toda a idéia, o apoio, ou ao menos tolerância, ao candidato Crivella.

      Que a meu ver, diferentemente do que o senhor Padre entende, o conservadorismo hoje representa a negação a novas idéias, a não aceitação ao diferente, o uso de quaisquer meios para impedir a implementação de pessoas e idéias em lugares não “usuais”.

      A meu ver, o conservadorismo hoje “confronta” as idéias e práticas de nosso bom Papa Francisco.

      O melhor Papa que o catolicismo poderia ter escolhido para um.momento tão difícil para a humanidade.

      Bom dia.

  6. Fred Marques disse:

    Caro Auler.

    Depois de ver a transformação de meio irmão caçula de um católico passivo a um conservador preconceituoso e estimulador do ódio (com o aterrorizante detalhe de que isso tenha ocorrido sem que ele ao menos se dê conta que houve uma transformação, pois as melhores (e piores) ideias são aquelas que, quando implantadas, nos fazem crer de forma absoluta que sempre foram nossas) fico incontrolavelmente apavorado que esse processo, essas ação, essa transformação se entenda de forma nacional.

    E qual seria o campo onde essa transformação, essa manipulação tão eficiente, poderia alcançar todos os lares?

    Na TV existe a concorrência, mas no campo político pode-se eliminar a todos os demais elementos, sujeitos, instituições que não aceitem essa transformação.

    Que Deus nos proteja, ou que ao menos, Se salve.

    Grato.

    • Heitor disse:

      Fred, se der um olhada no Facebook se alguns seminaristas do Rio de Janeiro, poderá verificar que muitos são conservadoras ao extremo, travam discussões cheias de ódio e transpiram o fascismo.
      Não são dignos de postular o sacerdócio.

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