Tem momentos na vida pública em que o que nos parece dissabor acaba tornando-se um trunfo, ou troféu, para o resto da vida. Lembro-me, lá pelos idos de 1996, quando dois procuradores da República, amigos meus até hoje, resolveram endossar uma “queixa crime” que um policial federal do Rio apresentou contra mim em consequência de uma série de matérias que publiquei em O Dia, sobre crimes cometidos por policiais federais do Rio. Apesar das informações verdadeiras, calçadas em documentos públicos, os procuradores, caso não falhe a minha memória, se apegaram ao título da matéria: “Mocinhos e Bandidos”. Me denunciaram por calúnia ou injúria, ou as duas coisas. O que me parecia ser mais um aborrecimento, tornou-se em um ganho maravilhoso. A denúncia foi prontamente rejeitada por um dos juízes mais duros em suas sentenças e até hoje um magistrado altamente respeitado, o atual desembargador federal Guilherme Calmon. Ao rejeitá-la, registrou que a reportagem era um trabalho em prol da sociedade. É um verdadeiro diploma que guardo comigo até hoje.
Este episódio me vem à memória ao ver o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) ser acusado junto ao Conselho de Ética da Câmara dos Deputados por ninguém menos do que o deputado Paulo Pereira (SD-SP), o Paulinho da Força. É o “roto” falando do “bom caráter”.
Em situações normais não deveríamos sequer temer uma denúncia como esta. Mas, o problema é que não vivemos situações normais, principalmente em um parlamento dominado por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) companheiro de momento – pois políticos como eles se fazem companheiros apenas nos momentos que interessam – do, usando a expressão de Chico Alencar, “Paulinho mandado“.
Na Câmara Federal dominada por Cunha, tudo pode acontecer. Logo, precisamos, como diz Caetano Veloso na música “Divino, Maravilhoso”,
“… estar atento e forte
Não temos tempo de temer a morte”,
para que o mal não vença. e, no final das contas, Chico Alencar consiga, a partir desta denúncia espúria, um atestado de bons antecedentes. Isto, porém, só se conseguirá com a pressão da sociedade a favor do bem. Como estamos vendo, o Conselho de Ética da Câmara pode ser capaz de tudo, até mesmo de barganhar a situação do Chico Alencar com a de Eduardo Cunha, justamente denunciado pelo PSOL e pela Rede.
Esta denúncia nada mais é do que uma forma de intimidação ao parlamentar do Rio apontado pelo site Congresso em Foco, recentemente, ao lado do senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) como os dois melhores parlamentares do país, em eleição feita por jornalistas (Para jornalistas, Chico Alencar e Randolfe Rodrigues são os melhores parlamentares do país),
Para se entender o despautério desta denúncia, republico abaixo a carta de Chico Alencar com as explicações sobre a acusação que lhe fez “Paulinho mandado“.
“Os cães ladram, Sancho. É sinal de que estamos avançando”
(Miguel Cervantes, D. Quixote de la Mancha)
Na divulgação da Representação ao Conselho de Ética contra mim, no último 29/10, reiterada em 3/11, em Plenário, o deputado Paulo Pereira da Silva/SD disse que estava “oferecendo oportunidade para que eu me explicasse”. O deputado acrescentou que “tinha sido alvo do mesmo procedimento pelo PSOL, em 2008”, revelando ânimo vingativo por fatos que agora o tornaram réu no Supremo.
A pressão para rápido recebimento das informações que ele havia pedido à Diretoria Geral da Câmara, inclusive através de um servidor que disse ser “da Presidência”, indicam que há outros interesses por trás da referida Representação (ou, melhor dizendo, Retaliação ao PSOL). Seu autor é um “Paulinho mandado” de Cunha.
Mesmo com esses “vícios de origem”, contesto, desde já, as acusações do indigitado deputado, em respeito à população, à companheirada e, por óbvio, à minha própria história. Faço-o com base no texto que o acusador entregou à imprensa, pois ainda não recebi a notificação.
No documento de 11 páginas (que pede a cassação de meu mandato!), detectei nada menos que 25 mentiras, falsidades, afirmações enganosas e impropriedades. Mas me atenho às “acusações” centrais, para não abusar de sua paciência:
1) “Financiamento ilegal de campanha”. O acusador parte do fato de que sete servidores DE LONGA DATA do meu gabinete doaram recursos próprios para minha campanha a deputado federal em 2014. Ora, estas doações VOLUNTÁRIAS são um direito líquido e certo, foram feitas dentro da legalidade e declaradas na prestação de contas, aprovadas na Justiça Eleitoral.
O acusador colocou, no quadro dos doadores, a remuneração de cada companheiro(a) como Secretário Parlamentar, como se esta fosse obrigatoriamente a única fonte de renda de cada um. Omitiu propositadamente que o teto destas doações LEGAIS é de 10% do rendimento bruto declarado no I.R. do ano anterior ao da eleição.
Mais: tenho orgulho dessa colaboração cidadã, derivada de consciência política e movida a ideal. Doações que se somaram às de 82 outras pessoas físicas, inclusive deste parlamentar. Doações de servidores que também foram recebidas por diversos outros dos atuais deputados, de diferentes legendas e estados. Ainda há quem faça política com grandeza e espírito coletivo!
Destaque-se, ademais, que não consta que o deputado Paulinho tenha sequer proposto a vedação desse tipo de doação nos recentes debates sobre a Reforma Política. Até porque ele também recebeu contribuições de pelo menos cinco assessores.
Por fim, esclareço que minha campanha ano passado totalizou gastos de R$ 180.746,65 (cento e oitenta mil, setecentos e quarenta e seis reais e sessenta e cinco centavos), uma das menores somas entre os 46 eleitos pelo Rio de Janeiro.
Reitero: as contas foram julgadas e aprovadas pela Justiça Eleitoral.
O Conselho de Ética não pode ser transformado em tribunal revisor da Justiça Eleitoral, como quer o acusador. Aliás, “líder” sindical de campanhas milionárias (R$ 2.859.448,49 em 2014) que recebe polpudas doações … do patronato! Só da Odebrecht, da UTC e da Queiroz Galvão (todas com executivos condenados na Operação Lava Jato) o deputado recebeu R$ 207.038 (duzentos e sete mil e trinta e oito reais), mais que o nosso total.
2) “Vultosas quantias da Verba Indenizatória foram empregadas na elaboração de material de campanha, em especial de conteúdo eletrônico via internet (…) pela empresa Sede Informática Ltda, baixada na Receita desde 31/12/2008”.
A primeira afirmação é absolutamente falsa, sem indício comprobatório mínimo.
De fato, a referida empresa encontrava-se baixada desde o fim de 2008, supostamente por trânsito do status de Limitada para Micro Empresa Individual, como soube muito depois. Sua situação irregular, entretanto, NUNCA NOS FOI INFORMADA, BEM COMO A COORDENAÇÃO DE GESTÃO DA COTA PARLAMENTAR – COGEP, DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, TAMBÉM NÃO DETECTOU O PROBLEMA, relativo às notas fiscais apresentadas.
Como ressaltei no arrazoado do RESSARCIMENTO à Câmara, feito de forma voluntária e a despeito da COMPROVAÇÃO DO SERVIÇO PRESTADO (justamente para evitar exploração política baixa como esta da inepta Representação), só tomei conhecimento da situação irregular da empresa em 24/7/2014. Esta informação me chegou através de Comunicação do então presidente Henrique Eduardo Alves, a respeito do arquivamento do Aviso 591 do TCU, que incidia sobre vários deputados em situação similar (ao menos 23).
De minha parte, o informe do arquivamento pela CD não satisfez: surpreso, busquei a origem do problema, dialoguei com o representante da ONG que fiscaliza as contas dos parlamentares (OPS), autora da reclamação ao TCU e ao MP. E, em carta ao Diretor Geral da época, Dr. Sérgio Contreiras, decidi pelo RESSARCIMENTO AOS COFRES PÚBLICOS do que tinha sido reembolsado em notas fiscais irregulares, malgrado a comprovação do serviço prestado, repito. E do entendimento de que a responsabilidade primeira pela própria situação fiscal é da empresa, e sua verificação, pela COGEP, conforme Ato da Mesa 43/2009 de 21/5/2009. É patente que fui vítima da irresponsabilidade da Sede Informática e da desatenção do órgão de controle da CD.
O acusador alega que um contrato de fevereiro de 2009, com a mesma empresa – mero ajuste para colocação de novo endereço de meu escritório no Rio – não consta da documentação solicitada pelo Ministério Público do Distrito Federal à Procuradoria da Casa, fantasiando com isso uma absurda “omissão de informar”. Com isso, agride não só a mim como aos próprios órgãos da Câmara dos Deputados! Envio desnecessário, por sinal, já que não continha nenhuma novidade em relação ao contrato original. Mas, ainda assim, encaminhado ao MP. Minha falta de ciência da condição de baixada na Receita, reitero, só foi superada em julho de 2014.
Face a tudo isso, não poderia ser outra a decisão do MP/DF: PROMOVER O ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO CIVIL 1.16.000.031100/2014 (arquivamento que o meu acusador, arrogantemente, contesta!)
Em resumo, a Procuradora Mirella de Carvalho Aguiar concluiu pela “boa-fé do deputado, inexistência de qualquer dano ao erário, comprovação do serviço prestado” e, ainda assim, “ressarcimento aos cofres públicos”. Além da disponibilidade voluntária deste deputado em prestar todas as informações sem ter sido convocado para tanto. A Promoção do Arquivamento pelo MPF afirma, enfaticamente, inexistência de qualquer improbidade administrativa.
AS QUESTÕES OBJETO DE ATAQUE DO DEPUTADO PAULO PEREIRA, PORTANTO, JÁ FORAM EXAMINADAS E DECIDIDAS PELOS ÓRGÃOS DE CONTROLE COMPETENTES E PRÓPRIOS – TRE/TSE E MPF -, como determina o ordenamento republicano.
Não é cabível que contas de campanha aprovadas pela Justiça Eleitoral e mesmo o uso da Cota Parlamentar, quando já apreciado pelos departamentos da Casa, venham a ser objeto de disputa política (baixa, menor) no âmbito do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da CD. Isto apequena a missão do órgão e abre perigoso precedente para uma “guerra de todos contra todos”.
Vale destacar a média de gasto anual da chamada Verba Indenizatória que nosso mandato faz: 2011 – 74%; 2012- 45%; 2013 – 52%; 2014 – 38%; 2015 – 39% (até 23/10).
Estes porcentuais já revelam o absurdo da “denúncia” de que “montei esquema engenhoso para benefício próprio”, chegando o acusador a inventar um calunioso “sistema criminoso de ciclos”, envolvendo “contratação de cabos eleitorais, empresas fantasmas, serviço de boca de urna, recolhimento forçado de doações eleitorais” e outras sandices, sem O MENOR INDÍCIO DA MAIS ELEMENTAR PROVA.
No âmbito jurídico, poderíamos falar de “denunciação caluniosa” e “litigância de má fé”.
Por fim, invoco minha história de vida, com 16 anos de magistério em sala de aula e minha vida parlamentar no sétimo mandato eletivo. Estes foram conquistados sempre em torno de ideias e causas, com empenho austero, exortando o chamado “voto de opinião”. Como é notório, exercidos com transparência e posições claras.
Com este lastro, REPUDIO as mentiras de uma peça encomendada, com evidente intuito intimidatório – inócuo, por suposto. E cujo autor é réu no STF, acusado de crime contra a ordem financeira (com recursos do BNDES), lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Trata-se de um caso em que o currículo de quem acusa – um Paulinho mandado – honra o “acusado”.
3 Comentários
Caro Marcelo Auler,
O Deputado Paulinho, por seu histórico no movimento sindical, por algumas de suas alianças políticas, por suas declarações públicas, sempre me passou uma péssima impressão, para dizer o mínimo, de uma pessoa nada comprometida com as boas causas e os “bons combates”.
Não o vejo, portanto, com a menor autoridade para atacar um homem da envergadura moral de deputado Chico Alencar, paralamentar de primeira linha, incansável na defesa do que acredita ser o melhor para esse País e sempre, impecavelmente coerente com seus belos ideais. Minha irrestrita solidariedade a Chico Alencar, com a certeza de que as acusações contra ele dirigidas se revelarão, gritantemente infundadas.!!
CHICO ALENCAR-DEPUTADO
Edmílson Martins
04/11/2015
Chico Alencar deputado
Homem de fé coerente
Quer ética na política
Nisso é intransigente
Sua vida tem lisura
Sempre Clara e transparente.
É Francisco franciscano
Político por amor
Vereador deputado
Escritor e professor
Conhece a História e o mundo
Pois é historiador.
É teimoso na esperança
Político combatente
Defende com muito ardor
Direitos dos mais carentes
Tá sempre em companhia
Daqueles que são decentes.
Chico, nosso companheiro
De fé, luta e caminhada
Sempre fiel, solidário
Sem nunca largar a estrada
Combatendo o bom combate
Na luta, bom camarada.
Chico é nossa esperança
Na Câmara desvairada
Composta de deputados
Que têm ações tresloucadas
Que só agem com cinismo
De forma bem debochada.
Chico Alencar mais alguns
Lutam com muita bravura
Levando iluminação
Àquela senzala escura
Cujos escravos só servem
Aos senhores da usura.
Resista, Chico sem medo
Pois você não está sozinho
Tem muita gente ao seu lado
Com muito amor e carinho
Venceremos a batalha
Contra o inimigo mesquinho.
Quem anda com a Verdade
Nunca deve esmorecer
A vitória será certa
Um dia nós vamos ver
Teremos bonita noite
E um belo amanhecer.
Essa acusação ao Chico Alencar é o maior absurdo que se possa imaginar… Já compartilhei no Face Book, porque como muito bem lembrou Marcelo Auler em seu texto, citando Caetano Veloso, mais que nunca nesse momento “é preciso estar atento e forte… não temos tempo de temer a morte…”