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Após receber R$ 75 mil para soltar assassinos, juiz de Xinguara (PA) conquista aposentadoria

 Marcelo Auler

Juiz José Admilson Gomes: Doutora promotora, a senhora acha que é a ´rainha da cocada preta´”?… Foto site

Dois anos depois de instaurado o Processo Administrativo Disciplinar (PAD) 3374-63 para investigar o juiz José Admilson Gomes Pereira, , da 1ª Vara de Xinguara (PA), afastado desde outubro de 2014, finalmente o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por unanimidade, determinou a sua aposentadoria compulsória.

Na decisão, tomada na terça-feira (04/10), a partir do voto do conselheiro relator Gustavo Alckmin, com 170 laudas, foi determinada ainda a remessa de copia de todo o processo para o Ministério Público Federal e a Procuradoria Geral de Justiça do Pará promoverem ações criminais e de improbidade administrativa contra o magistrado. Teoricamente, caso ele venha a ser condenado judicialmente será expulso do serviço público, perdendo o direito à aposentadoria.

Mas isso dificilmente acontecerá. Na verdade, quando se trata de processo contra magistrados ou até mesmo membros do Ministério Público, não se sabe se por conta do spiritus corpus ou se por serem réus que aprenderam a usar as leis e códigos a favor da procrastinação, são raros os casos de aposentados compulsoriamente expulso do serviço público. O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-SP) é uma exceção

Um exemplo evidente é o do ex-ministro Paulo Geraldo de Oliveira Medina, do Superior Tribunal de Justiça. Ele, juntamente com os ex-desembargadores do TRF-2, José Eduardo Carreira Alvim e José Ricardo Regueira (falecido em 2008); e ainda o juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas, SP) Ernesto da Luz Pinto Dória; e o procurador Regional da República, José Sérgio Leal Pereira, foram pegos beneficiando o esquema de exploração de jogos eletrônicos, em 2007. Mas, até hoje não foram julgados pelas acusações surgidas na chamada Operação Furacão.

Ou seja, decorridos nove anos e meio, o Judiciário não conseguiu apreciar essas ações penais. Uma delas, ao que parece, está desaparecida. A outra, foi suspensa e provavelmente não levará a nenhuma punição.

Além da aposentadoria proporcional, o juiz Gomes Pereira ainda fará jus, como noticiamos em CNJ garante a juiz afastado, que não mora na comarca, auxílios moradia e alimentação, aos auxílios alimentação e moradia retroativos à data do seu afastamento, conforme o próprio CNJ decidiu. Isso lhe será pago mesmo ele não sendo mais visto na comarca onde deveria trabalhar. Supõe-se que esteja na capital do estado. Por não ser obrigado a cumprir jornada, pode se alimentar em qualquer lugar, inclusive em casa, mas receberá os atrasados do auxílio alimentação, como se trabalhando estivesse.

Conselheiro Gustavo Alkmin, voto de 170 páginas para propor a punição ao juiz do Pará - Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

Conselheiro Gustavo Alkmin, voto de 170 páginas para propor a punição ao juiz do Pará – Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ

Embora o processo contra Gomes Pereira foi aberto  após diversas e variadas denuncias relatadas à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Pará e ao CNJ, por reclamantes distintos – OAB, advogados, juiz,- a principal causa de sua “punição” foi pelo recebimento de quantia indevida em contra partida a soltura de réu.

Anteriormente, julgado pelo Tribunal de Justiça do Pará, ele chegou a ser inocentado em um processo administrativo. Isso levou a Corregedoria Nacional do CNJ avocar o caso. Em seguida, o Conselho instaurou o PAD julgado na sessão de terça-feira.

Decisão negociada – Em 17 de março de 2014, Gomes Pereira soltou Carlos José Campos Souto, José Carlos Gomes Lacerda e  Cícero Cardoso  do Nascimento, presos desde outubro de 2013, apontados como responsáveis pelo assassinato de Tales Santana Silva. A morte de Tales, que teve uma relação extraconjugal com a mulher de Campos Souto, foi encomendada por este aos outros dois.

Com base em documentos bancários e fiscais relacionados ao magistrado e seus parentes, o processo no CNJ comprovou os depósitos ilegais em favor do juiz e de seus familiares. Curiosamente  tais documentos foram encaminhados ao Conselho como prova compartilhadas pelo Tribunal de Justiça do Pará, o mesmo que absolveu o juiz no processo administrativo.

Segundo mostrou a documentação, três dias antes de os presos serem libertados, Deuzimar da Silva,um motoqueiro que presta serviços para Eciene Maria da Silva e Souza, corretora de seguro na cidade, fez um depósito, sem identificação, de R$ 75 mil na conta do professor Valmir Gomes Pereira, irmão do juiz e residente do Amapá. O dinheiro, em espécie, foi repassado a Eciene pela irmã de Campos Souto, Marcia Campos. Cópias do comprovante de depósito circularam pela cidade. Uma delas foi enviada anonimamente à OAB do município paraense que representou contra o magistrado.

Em sua defesa, o Gomes Pereira alegou que se tratava de uma transação de Valmir com João Santos. Mas os documentos encaminhados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) confirmaram que o depositante foi realmente Deuzimar. Conforme o relator do processo no CNJ, o “suposto empréstimo é nebuloso, pois nem o CPF do João Santos foi informado ou qualquer detalhe que permitisse a confirmação”. Alkmin destacou ainda que “não há maiores informações sobre relação de João Santos com Deuzimar”.

Não foi o único valor suspeito remetido ao juiz Gomes Pereira. Sua cunhada, Norma Letícia Cruz Ferreira, recebeu depósitos de R$ 89,3 mil sendo que R$ 44 mil não identificados e R$ 45 remetidos pelo irmão do magistrado. Ela sacou os R$ 89 mil o que, segundo o voto do relator “sugere a utilização de “conta-passagem”, nos termos do relatório do MPF”.

Lindalva, companheira do juiz, recebeu um montante de R$ 83 mil de crédito, dos quais R$ 69 mil destinados por depositantes não identificados; R$ 7 mil por Gomes Pereira; e R$ 3 mil por Norma Letícia.

O próprio juiz, segundo destacou o relator Alkmin, recebeu em suas contas, no período de 2013/15, um montante de R$ 77 mil, dos quais R$ 65.800 relativos a créditos não identificados.

Ao propor seu afastamento com a aposentadoria compulsória proporcional ao período trabalhado, o relator ainda confirmou outros casos de desrespeito à legislação. O juiz, por exemplo, reviu – sem ter poderes para tal – decisão de colegas seus. No voto, Alkmin diz que, ao fazer a reconsideração, o magistrado proferiu “decisão com conteúdo ofensivo e desrespeitoso. Em uma interferência direta e pública fazendo papel do corregedor que ele não tem”. Uma medida que demonstrou “total falta de urbanidade, expondo e criticando publicamente seu colega”.

A demora no processo no CNJ fez com que o caso passasse por dois conselheiros na relatoria do caso. Em março de 2015, o primeiro relator, conselheiro Flávio Sirangelo, ao justificar ao plenário a necessidade de estender o prazo de apuração do processo, explicou:

“Impressiona a conduta do juiz processado ao procurar agir para procrastinar o andamento do PAD, mediante tentativas ostensivas de evadir-se da citação inicial, o que sugere a conduta intencional e maliciosa de fazer expirar o limitado prazo de tramitação do processo e, com isso, obter o seu retorno à jurisdição, deixando evidente, contudo, o perigo que esse retorno poderia causar para o bom andamento da instrução processual”, argumentou o conselheiro no voto apresentado ao plenário

Na verdade, o que impressiona é a nossa legislação beneficiar um magistrado, mesmo depois dele cometer crimes que deveria, por dever de ofício, combater e punir seus responsáveis. Mas ele não apenas ajudou criminosos como também cometeu seus delitos. Não foi apenas um, mas vários. Apesar disso, ficará em casa recebendo dos cofres públicos.

Não se trata de caso isolado. Segundo um levantamento do blog junto ao site do CNJ, hoje estariam nessa condição – recebendo para ficar em casa – pelo menos 44 magistrados que foram aposentados compulsoriamente. Não existe no site informações de quanto esses juízes recebem. Mas, em uma conta conservador, calculando-se um salário médio de R$ 15 mil, conclui-se que se gasta R$ 660 mil mensais, R$ 8.580.000, anuais. O equivalente a 9.750 salários mínimos. Trata-se como falamos de uma conta conservadora. Provavelmente deverá ser mais. Muito mais.

3 Comentários

  1. Atreio disse:

    Boa noite, Auler!
    Parabéns pela repaginada no site! Jornalismo é sempre refrescante e nos últimos anos tem sido cada vez mais raro encontrarmos alguém exercendo.
    Vc, nassif, azenha, rosário,família nogueira, povo do 247 e outros são heróis da resistência! Admiro muito seu trabalho e de todos estes citados. Aproveito pra levar-lhes congratulações de amigos que não andam muito por aqui (internet, blogs de jornalismo…) mas lêem oq apresento pra eles e têm elogiado muito as matérias q tenho apresentado neste momento estranho q passamos. Como sempre coloco a fonte, eles me retornam: “muito legal aquele artigo q vc mostrou! de onde vc tirou essa cara? vou procurar mais coisa dele!” .
    Sou agrônomo e lido muito com trabalhadores rurais e fornecedores de insumos, faço oq posso pra espalhar informações relevantes e sempre tento evitar parecer panfletário. Admito q as vezes até imprimo (pq ando por lugares sem internet), deixo na bolsa, espero o assunto surgir, geralmente com as pessoas replicando o q o bonner e/ou boechat falaram no dia anterior, como se fosse a realidade. Nem discordo, nem corrijo. Se me questionam: falo q não sei, pergunto se conhece tal cara q escreveu tal artigo e mostro – hj em dia tem o zap tb, qndo dá passo por ali. O trabalho de vocês é fundamental ao povo brasileiro e posso afirmar que muda a vida das pessoas pra melhor.
    Temos ótimos jornalistas no Brasil e saibam que o trabalho de vcs inspira muitos jovens a acreditar que vale seguir. Agradeço muito todo este trabalho e toda disposição de todos vcs para oq está por vir – contem comigo. E se gilmar abdelmassih vai ficar sentado em cima do projeto de lei de regulamentação da mídia, como já está há 2 anos, façamos nossa parte. Não sei se conhece: after.tv Sugiro q veja o trabalho dos caras…. acho fantástico e já sou fã!.

  2. João de Paiva disse:

    Prezado Jornalista Marcelo Auler, prezados leitores.

    Competência, boa índole e coragem são atributos essenciais aos profissionais que pretendem fazer o verdadeiro jornalismo, colocando o interesse público em primeiro lugar. A série de reportagens mostrando as ilegalidades criminosas cometidas pelos integrantes da ORCRIM da Fraude a Jato, sobretudo delegados da SR/DPF/PR, já se tornou histórica.

    Na trama golpista que derrubou o governo legítimo, que promove o desmonte do Estado Brasileiro, que persegue e prende líderes petistas, que promove o linchamento do ex-presidente Lula e da família dele, assim como da presidenta Dilma Rousseff e de ex-ministros e servidores dos governos petistas, vemos que a PF, MP e o PJ ocupam papéis decisivos. Sérgio moro comete crimes continuados; o TRF4 instaurou o Estado Fascista de Exceção, o qual foi confirmado pelo STF, matando e enterrando a CF/1988 no dia em que ela completaria 28 anos. A atuação criminosa e descaradamente político-partidária da Fraude a Jato não engana mais ninguém. O STF foi conivente e ator do golpe de Estado; o PGR e a PGR constituem o alto comando nacional do golpe; o golpe tem o alto comando nos EUA, conforme já demonstrei. Hoje ficamos sabendo que o nazifascista alexandre de moraes, atual ocupante do ministério da “justiça”, está metido em negociatas, tendo recebido mais de R$ 4 milhões de uma empresa suspeita de envolvimento em escândalos de corrupção e pagamento e suborno. Conforme mostrado em reportagens publicadas aqui e no DCM, michel temer está metido em grossos esquemas de corrupção, envolvendo a CODESP e empresas que operam no porto de santos, além de ter recebido milionárias propinas, disfarçadas de doação eleitoral ao PMDB.

    Nesta e noutras reportagens sobre juízes que cometeram crimes e que receberam como “punição” aposentadoria com vencimentos integrais fica comprovado que Judiciário é um poder que padece dos mesmos vícios que os demais (poderes políticos, Legislativo e Executivo), com a agravante de ser não-democrático e os cidadãos não poderem punir ou afastar os que cometem irregularidades ou crimes, do exercício da função pública. Mais grave é que os integrantes do PJ e do MP são uma espécie de casta jurídica, pois não se sujeitam às leis como os demais cidadãos, mostrando que na prática aqueles artigos da CF que afirmam que todos ão iguais perante a Lei nada mais são que letra morta ou falácia.

    Parabéns a Marcelo Auler e outros jornalistas independentes pela coragem de mostrar as vísceras podres e fétidas desse poder que hoje comanda a ditadura e o Estado Fascista de Exceção que assolam o Brasil. Além do trabalho dos jornalistas, é preciso que líderes políticos da Esquerda subam nos palanques e façam publicamente a denúncia desses vários crimes(e criminosos) impunes dos integrantes do PJ, que ainda escarnecem dos brasileiros, ao ser agraciados com aposentadoria integral, auxílios e uma série de mamatas, como demonstrados nas reportagens. Como esquecer os casos relatados aqui ou aquele (Flávio Roberto) de um juiz do TJ-RJ que confessou ter subtraído R$ 830 mil em moedas estrangeiras, os quais estavam sob a guarda do TJ-RJ?

    Vá em frente, Marcelo Auler. Não deixe pedra sobre pedra. Apure, investigue, publique, denuncie os criminosos de toga.

  3. C.Poivre disse:

    Neste setor vamos precisar recomeçar do zero. Quando? Não se sabe.

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