Apenas transcrevo, com a devida autorização do autor, mais um belíssimo artigo do professor Afranio Silva Jardim, que nos leva a uma reflexão do risco que estamos correndo. Resta saber o que e como fazer, para não nos tornarmos “uma sociedade de idiotas, por várias gerações ainda”?
Na busca de ilustração para esta postagem, encontrei o site Jornal da Besta Fubana, onde, coincidentemente, um artigo do goiano Braga Horta fala sobre o mesmo tema, mas em outra abordagem: A geração de idiotas está chegando. Neste artigo, Horta afirma:
“(…) já estamos aptos a gerar uma geração de patetas. A dúvida é se eles já chegaram ou ainda estão para vir. Quero dizer: não sabemos se nossas crianças já estão emburrecidas ou se estão sendo preparadas para, em poucos anos, serem adultos pouco inteligentes, mas no passo que a coisa vai essa é a perspectiva”. Ao final, o autor sugere a sua resposta para uma parte da questão:
“(…) É o que se avizinha e que temos a obrigação de impedir que aconteça. Para que essas crianças possam manter-se em níveis de inteligência, capacidade, ética, honestidade, moralidade e criatividade semelhantes aos nossos será necessário que adotemos sérias providências para que elas voltem a, como nós, terem um nível satisfatório de contato social, ao invés de isolarem-se em si mesmos, como vem acontecendo! Só assim o destino previsto pela sentença de que está por vir uma geração de idiotas poderá ser evitado”. Uma questão, no mínimo controversa.
Se aprofundarmos a nossa reflexão, vamos constatar algo bastante perverso e preocupante.
A grande imprensa, além de (de)formar a opinião pública, depois passa a dar publicidade daquilo que lhe interessa dizer qual seria a opinião pública, criando um círculo vicioso. Sem qualquer pesquisa séria ou científica, a mídia nos diz como pensamos, segundo seu desejo.
Em outras palavras, a mídia nos diz como devemos pensar e depois nos diz, cinicamente, como pensamos (ou melhor, como ela quer nos fazer acreditar de como pensamos). Trata-se de “propaganda da propaganda”…
Vale dizer, se não “pegar” em um primeiro momento, vai “pegar” no segundo. Ficamos acreditando que este é o pensamento dominante. Como diz o povo, “está tudo dominado”.
Desta forma, ficam acuados os poderes da república, mormente o Poder Judiciário.
Desta forma, a população acaba absorvendo a ideologia dos grandes grupos econômicos, que se fazem presentes na grande imprensa e “sequestraram” a nossa frágil democracia.
Consciência crítica não interessa a quem tem o poder social. Eles precisam de consciências ingênuas que acreditam em tudo o que veem na perniciosa “telinha da televisão”. Por isso, alguns trabalhadores estão favoráveis às reformas trabalhistas e da previdência social, sem notar o quanto vão perder em termos de bem estar social.
Trata-se do conhecido fenômeno de o dominado absorver a ideologia do dominante.
Para distrair o povo e lhe tirar a consciência de sua triste realidade, a televisão privilegia a ficção, através de infindável série de novelas, todas trazendo “valores” que fazem as pessoas cultuar atores e “famosos”. Os pobres não sabem porque são pobres, apenas querem ficar ricos…
Enfim, ou se faz alguma coisa, pelo menos, a médio prazo, ou vamos ter uma sociedade de idiotas, por várias gerações ainda.
(*) Afranio Silva Jardim, Procurador de Justiça aposentado, professor associado de Direito da UERJ, Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal (UERJ).
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Em dois artigos, você terá o governo das sombras, o poder invisível que guia suas ações.
A BANCA, A FARSA E A DITADURA INVISÍVEL
Pedro Augusto Pinho
O romance 1984 de George Orwell, pseudônimo do súdito nascido na Índia Eric Arthur Blair, lançado em 1949, é uma crítica a Stalin e à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e, de modo sutil, a glorificação de Winston Churchill, nome do herói – Winston – do romance. Logo no início do livro travamos conhecimento da existência do Ministério da Verdade e da Novilíngua, graças aos quais se difundiam lemas governamentais: “liberdade é escravidão”, “ignorância é força”.
Parece ridículo a você, caro leitor, que alguém fosse atingido por tais farsas? Mas outra coisa não lhe é feita, desde os anos 1980, com as palavras e expressões tais como globalização, mercado livre, política ou decisão inevitável, modernização trabalhista, ações indispensáveis, contenção de despesas públicas, superavit fiscal, déficits públicos e baboseiras semelhantes.
A ensaísta e premiada escritora francesa Viviane Forrester publicou, em 2000, Uma Estranha Ditadura (UNESP, 2001) que desmascara a novilíngua neoliberal, que tomou conta de todas as notícias da imprensa, das análises supostamente técnicas e mesmo da academia, como demonstra com precisão e objetividade o filme de Charles Ferguson, Trabalho Interno (Inside Job), lançado em 2010.
Vamos analisar os verdadeiros significados destas palavras, os objetivos desta farsa e, como é óbvio, quem é beneficiado com este reeditado “1984”.
Tomemos um caso concreto – a reforma da previdência social no Brasil. Como já foi sobejamente demonstrado esta previdência é superavitária, mesmo sem a cobrança de milhões de reais devidos por empresas privadas. O economista J. Carlos de Assis, nas páginas do jornal Monitor Mercantil e em vários blogs e portais virtuais, lançou o desafio a qualquer membro do governo, economista chapa branca ou independente, analista de jornal, rádio e emissora de televisão e doutos acadêmicos para debater com ele o “déficit previdenciário”. Ninguém se ofereceu a este repto que já completa dois meses.
Vejamos alguns elementos desta novilíngua. Primeiro este “pensamento único”, por si já prova do sentido ditatorial, que se autodenomina neoliberal. Que magnífica composição: neo, dando a ideia de novo, de atual, e liberal, que lembra imediatamente liberdade, independência. Mas significando efetivamente a selvageria do cada um por si, de nenhuma restrição ao abuso, da satisfação de desejo, o mais iníquo, e a competitividade destruidora de pessoas e bens.
Viviane Forrester levantou, para março de 1996, sete grandes empresas multinacionais que tiveram cotações em bolsa elevadas com a divulgação da demissão de empregados. O resultado desta “competitividade” foi transferir o dinheiro de salários para os maiores lucros dos acionistas, um processo de concentração de renda e de expansão da miséria. Mas a competitividade parece atender a voz divina que manda os ricos ficarem mais ricos e os pobres ainda mais pobres. Ou você não havia notado esta novilíngua?
Para que serve a economia? Para promover concentração de riqueza ou existência digna para as pessoas?
Em Londres e em Nova Iorque houve manifestações (peço atenção do golpista Ministro da Educação (sic) – “houveram” remete-lo-ia (!) ao ensino Fundamental I) de mestres de escolas de economia em defesa do real estudo desta disciplina, pois, em suas próprias palavras, estava sendo transformada apenas e simplesmente em engenharia financeira. Mas a imprensa mundial, dominada pela banca (sistema financeiro), fez-se surda e muda.
Outro vocábulo da novilíngua é globalização. Viviane Forrester chama “obra-prima do gênero” farsante. Escreve esta crítica francesa: “seu nome por si só cobre todos os fatos de nossa época e consegue camuflar, tornando-a indiscernível no interior desse amálgama, a hegemonia do ultraliberalismo: um sistema político que, sem estar oficialmente no poder, comanda o conjunto daquilo que os poderes têm a governar, obtendo uma plenipotência planetária”.
Este avanço da banca à economia, à política, à comunicação social, a toda sociedade já é descrito até por seus executivos e membros de um organismo da banca: o Fundo Monetário Internacional (FMI).
E a imprensa, mesmo quando combate ações da banca, divulga a novilíngua, como se fosse inevitável a discussão nos seus termos e significados. É uma escolha a qual também devemos combater. Afinal expropriação privada é tirar de alguém, sem que haja interesse público, algo que lhe pertence, seja o salário, no exemplo dado por Viviane Forrester, seja o direito à saúde ou à educação. Chame-se de déficit público, de custo irrecuperável, de administração perdulária (como se altos juros não fosse o mais perdulário dos gastos públicos), de futura insolvência, como se alardeia às aposentadorias e pensões, sempre é você que está sendo tungado.
Já pensou o caro leitor quem vai receber suas contribuições previdenciárias se não for o Estado? e que garantia você terá da própria permanência da seguradora ou banco daqui a 30 ou 40 anos quando você resolver se aposentar?
É a farsa da banca que nos coloca nesta ditadura da própria linguagem, muito mais difícil de se insurgir do que a da censura, dos tanques nas ruas ou de um Estado totalitário. É a ditadura invisível que nos oprime neste século XXI. E que os coxinhas, batedores de panela ou simplesmente ignorantes colocaram no Poder no Brasil.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado
Este é um excelente e revelador artigo sobre a mídia de hoje, um dos braços do sistema financeiro internacional – a banca. Quando Thierry Meyssan, cartesianamente, pergunta qual a força que move o trust midiático, minha resposta é: o sistema financeiro (a banca).
A NOVA ORDEM MIDIÁTICA MUNDIAL
Thierry Meyssan*
Em alguns meses, o conteúdo das mídias nacionais e internacionais mudou profundamente no Ocidente. Assistimos ao nascimento de uma Entente da qual não conhecemos nem os verdadeiros iniciadores, nem os objetivos reais, mas de que observamos de imediato as consequências diretas contra a democracia.
Rede Voltaire | Damasco (Síria) | 9 de Março de 2017
O Ocidente atravessa uma crise sistêmica sem precedentes: forças poderosas orientam progressivamente a totalidade das mídias numa única direção. Simultaneamente, o conteúdo das mídias transforma-se: ainda no ano passado, elas agiam com lógica e tendiam à objetividade. Traziam pontos de vista diferentes dentro de uma sã emulação. Agora, agem como bandos, baseiam a sua coerência em emoções e tornam-se maldosas face aos indivíduos que denunciam.
A ideia de uma Entente das mídias é o prolongamento da experiência do International Consortium for Investigative Journalism «Consórcio Internacional para o Jornalismo de Investigação» (ICIJ) , o qual não associa as mídias, mas unicamente jornalistas a título individual. Ele tornou-se célebre ao publicar informações roubadas das contabilidades de dois escritórios de advogados das Ilhas Virgens Britânicas, do escritório da PricewaterhouseCoopers (PwC), do Banco HSBC, e do escritório panamenho Mossack Fonseca.
Estas revelações foram sobretudo utilizadas para desacreditar dirigentes chineses e russos, mas também, por vezes, para salientar delitos reais cometidos por Ocidentais. Acima de tudo, com o louvável pretexto da luta contra a corrupção, a violação do sigilo dos advogados e dos bancos desferiu um pesado prejuízo a milhares dos seus clientes honestos sem nenhuma reação das opiniões públicas.
Desde há uns quarenta anos, assiste-se a um agrupamento progressivo das mídias no seio de trusts internacionais. Atualmente, 14 grupos partilham entre si mais de dois terços da imprensa ocidental (21st Century Fox, Bertelsmann, CBS Corporation, Comcast, Hearst Corporation, Lagardère Group, News Corp, Organizações Globo, Sony, Televisa, The Walt Disney Company, Time Warner, Viacom, Vivendi). Agora, a aliança operada pelo Google Media Lab e a First Draft tece laços entre estes grupos que detinham já uma posição dominante. A presença nesta Entente das três principais agências de imprensa do planeta (Associated Press, Agence France-Presse, Reuters) assegura-lhe uma influência hegemônica. Trata-se sem nenhuma dúvida de uma «entente ilícita», que não é estabelecida com um objetivo de fixação de preços, mas de fixação das mentes, de imposição de um pensamento já dominante.
Pode-se observar que todos os membros —sem exceção— da Entente do Google têm já, no decurso dos seis últimos anos, dado uma visão unívoca dos acontecimentos passados no Médio-Oriente Alargado. Não havia, no entanto, alinhamento prévio entre eles, ou, pelo menos, não sabíamos de nada. É intrigante que estejam presentes nesta Entente cinco das seis televisões internacionais que participaram na célula de propaganda da OTAN (Al-Jazeera, BBC, CNN, France24, Sky, mas aparentemente não a Al-Arabiya).
Nos Estados Unidos, na França e na Alemanha, o Google e First Draft («primeiro rascunho») reuniram as mídias presentes tanto localmente, nesses países, como outras presentes à escala internacional para verificar a autenticidade de certos argumentos . Além de que se ignora quem se esconde por trás da First Draft e que interesses políticos têm puxado uma sociedade comercial especializada em informática a financiar esta iniciativa, o seu resultado não tem muito a ver com o retorno à objetividade.
Primeiro porque as imputações verificadas não são escolhidas pelo lugar que têm no debate público, mas porque elas foram citadas pelos indivíduos que esta Entente das mídias entende denunciar. Pode-se crer que estas auditorias nos permitirão chegar perto da verdade, mas não é nada disso: eles confortam o cidadão com a impressão de que estas mídias são honestas, enquanto as pessoas que elas denunciam não o são. Esta abordagem não visa levar a uma melhor compreensão do mundo, mas a colocar de joelhos as pessoas a abater.
Em seguida, porque uma regra não escrita desta Entente das mídias impõe que só se verifique as imputações de fontes exteriores à Entente. Os membros interditam-se de exercer um espírito crítico entre eles. Trata-se de reforçar a ideia de que o mundo se divide em dois : «nós» que dizemos a verdade, «os outros» que são mentirosos. Esta abordagem mina o princípio do pluralismo, condição prévia à Democracia, e abre a via a uma sociedade totalitária. Não é nada de novo porque já o vimos em ação na cobertura das Primaveras Árabes e das guerras contra a Líbia e a Síria. Mas, pela primeira vez, ela atira-se a uma corrente de pensamento ocidental.
Finalmente, porque as acusações que terão sido qualificadas como «falsas» jamais serão encaradas como erros, mas sempre como mentiras. Trata-se a priori de atribuir aos «outros» intenções maquiavélicas para os desacreditar. Esta démarche prejudica a presunção de inocência.
É por isso que o funcionamento do ICIJ e que a da Entente criada pelo Google e a First Draft violam a Carta de Munique adotada pela Organização Internacional de Jornalistas (Título II, artigos 2, 4, 5 e 9).
Não é indiferente que ações de justiça aberrantes contra os mesmos alvos visados pela Entente das mídias tenham sido postas em ação. Nos Estados Unidos, ressuscitou-se a lei Hogan contra a equipa Trump, quando este texto nunca, absolutamente nunca, foi aplicado desde a sua promulgação, há dois séculos. Na França, ressuscitaram a lei Jolibois contra os tweets políticos de Marine Le Pen, quando a jurisprudência tinha limitado a sua aplicação à distribuição sem “blister” de algumas revistas ultra-pornográficas. Sendo o princípio da presunção de inocência das pessoas erradicado, é possível sujeitá-las a investigação sob qualquer pretexto legal. Além disso, as ações intentadas contra a equipe Trump e Marine Le Pen em nome de leis adormecidas deviam sê-lo contra inúmeras outras pessoas, mas não o são.
Por outro lado, os cidadãos não reagem quando a Entente das mídias dissemina, ela própria, falsas imputações. Assim, nos Estados Unidos ela imaginou que os Serviços Secretos russos tinham um dossiê comprometedor sobre Donald Trump e o chantageavam. Ou, na França, onde esta Entente inventou que se pode empregar ficticiamente uma assistente parlamentar e acusou disso François Fillon.
Nos Estados Unidos, as grandes e as pequenas mídias membros desta Entente atiraram-se ao Presidente. Eles sacam as suas próprias informações de escutas telefônicas à equipe Trump abusivamente ordenadas pela Administração Obama. Eles estão coordenados com magistrados que os utilizam para bloquear a ação do governo atual. Trata-se, sem dúvida, de um sistema de mafioso.
As mesmas mídias norte-americanas e franceses atacam dois candidatos à eleição presidencial francesa: François Fillon e Marine Le Pen. Ao problema geral da Entente das mídias junta-se a impressão errada que estes alvos são vítimas de uma cabala franco-francesa, quando o principal mandante é norte-americano. Os Franceses constatam que as suas mídias são manipuladas, erradamente interpretam esta campanha como estando dirigida contra a Direita, e continuam ainda erroneamente a buscar os manipuladores no seu país.
Na Alemanha, a Entente ainda não está em ação e só deverá estar atuando nas eleições legislativas.
Quando do Watergate, as mídias reivindicaram formar um «Quarto Poder», após o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Elas afirmaram que a imprensa exercia uma função de controle do governo em nome do Povo. Descontemos o fato de que o que foi censurado ao Presidente Nixon era comparável ao que fez o Presidente Obama : colocar a sua oposição sob escuta. Sabe-se hoje, qual a fonte do Watergate, «Garganta Profunda», longe de ser um «revelador» cidadão era, na realidade, o diretor do FBI, Mark Felt.
O noticiário sobre este caso foi uma batalha entre uma parte da Administração e a Casa Branca, na qual os eleitores foram manipulados pelos dois campos ao mesmo tempo.
Aceitar a ideia do «Quarto Poder» implica que se assimile a mesma legitimidade aos 14 trusts, que controlam a grande maioria das mídias ocidentais, que aos cidadãos. O que é afirmar a substituição da Democracia por uma oligarquia.
Resta um ponto a esclarecer : como são os alvos da Entente escolhidos? A única ligação clara entre Donald Trump, François Fillon e Marine Le Pen é que eles desejam restabelecer contatos com a Rússia e lutar junto a ela contra a matriz do jiadismo: os Irmãos Muçulmanos. Embora François Fillon tenha sido Primeiro-ministro de um governo implicado nestes acontecimentos, os três juntos encarnam a corrente de pensamento que contesta a visão dominante das Primaveras Árabes e das guerras contra a Líbia e contra a Síria.
Thierry Meyssan, escritor e jornalista
Tradução Alva