Eu os conheci tarde. Em algum dia do primeiro semestre de 2016, quando do primeiro de uma série de encontros. Fui à São Paulo chamado por eles, Paulo e Kiko Nogueira que me contrataram, para, no Diário do Centro do Mundo, junto com este blog, publicarmos matérias sobre as peripécias e ladroagens de Michel Temer no Porto de Santos. Até então não tinha tido a oportunidade de encontrá-los. Ou, quem sabe, se os encontrei, bem no passado, não registrei na memória.
Mas, conheci sim, o pai deles, o saudoso Emir Nogueira. Numa luta sindical. Em São Paulo, no início dos anos 80, quando batalhei por David de Moraes na disputa pelo Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Emir concorria contra ele, em uma chapa antipetistas, apoiada por Audálio Dantas. Venceram. Nem por isso, quando precisei do Sindicato – ainda trabalhava na condição de estagiário – Emir se negou a me apoiar. Foi mais um aprendizado de que, lutas políticas à parte, tínhamos em comum a profissão. E o desejo de restabelecermos a democracia no país, tendo como trincheira, principalmente, o dia a dia profissional. Foi duro, mas conseguimos.
No encontro que eu, Paulo e Kiko tivemos, almoçando junto com Erika, e o filho menor do casal, acho que relembrei estas passagens minhas com Emir. Depois, ainda conversamos mais algumas vezes. Até ser pego de surpresa na manhã desta sexta-feira (30) com a notícia do falecimento de Paulo. Nem soube da sua luta contra o maldito câncer. Kiko, com quem estive há cerca de um mês, me informou hoje que o próprio Paulo exigia discrição. Não queria visitas. Por isso, ele nada me disse desta última vez que nos vimos e Paulo já estava nessa luta.
É mais um excelente profissional que se vai por conta desta maldita doença. Nem assim crio vergonha de largar o tabagismo, ainda que desconheça se houve alguma relação no caso de Paulo Nogueira.
Foi um profissional importante, que sabia muito e tinha muito para nos ensinar. Lamentavelmente, não tive chance de lhe agradecer – então o faço através do Kiko – a boa oportunidade que me deram ao me desafiarem a enveredar pelas mutretas de Temer em Santos.
O resultado deste trabalho, modesta às favas, como diz o ministro do Supremo, não ficou nada a dever. Levantamos um bom material, sempre com o apoio irrestrito – e financeiro – do Diário do Centro do Mundo. Falta, porém, uma parte, que eu e Kiko já conversamos, mas que ainda não concretizei por independer somente de nós dois.
Devemos aos leitores e cidadãos uma boa matéria com Érika, não a de Paulo, mas aquela que, mesmo sem total consciência do papel importante que estava tendo, trouxe a público as revelações das falcatruas que aconteciam – acontecem???? – nos bastidores da zona portuária santista e, principalmente, na Companhia Docas do Estado de São Paulo – Codesp, desde que ela ficou sob o domínio político do inescrupuloso Temer. Ela não foi responsável por nada de errado que fizeram por lá e com o dinheiro público, mas sem dúvida foi a única que sofreu consequências diretas de tudo isso. Falta conseguir convencê-la, embora entendamos todos os seus receios.
De qualquer forma, neste momento de despedida que sou obrigado a fazer à distância, fica aqui meu agradecimento ao Paulo – bem como ao Kiko – pela chance que me criaram e pelo profissionalismo na inesperada, mas produtiva relação profissional que mantivemos. Independentemente de qualquer divergência política/ideológica, se é que elas existiam. Sequer houve tempo de discuti-las.
Agora, resta ao Kiko a difícil tarefa de tocar o DCM sem deixar a peteca cair. Terá que fazer o trabalho dos dois. Mas ele conseguirá, pois Paulo, junto com Emir, lá de onde estiverem, juntos e no merecido descanso, iluminarão seus caminhos. Boa Sorte Kiko. Conte conosco no que for preciso.
Descanse em paz Paulo. Vá com a certeza que você cumpriu, muito bem, seu papel entre nós. Deixou sua marca registrada. No jornalismo, não só nas muitas redações por onde andou, mas principalmente com o DCM.
Na vida, com seus exemplos, que certamente se refletirão na sua prole – Emir, Pedro, Camila e Fernando, este com apenas 2 anos. Eles ainda lhe darão muita satisfação e felicidade.
Inevitavelmente, vale o velho clichê, mas dura realidade: o jornalismo brasileiro, desde a noite de quinta-feira, sofreu nova perda importante.
A cada dia, nossa profissão fica mais pobre. E mais triste.
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1 Comentário
Paulo Nogueira foi jornalista com ‘J’ maiúsculo. Como Jânio de Freitas ele conseguiu exercer todas as funções que um profissional de imprensa pode almejar, em grandes veículos do oligopolio; ele conseguiu essa façanha sem se corromper, Sense transformar num “jp”, num puxa-saco dos patrões.
É o texto conciso, límpido, claro, cristalino, sem sobras ou faltas; cortante, incisivo, mas sempre elegante. Como esquecer as cartas abertas que ele escreveu aos golpistas, dentro eles José Serra e FHC?
Como o repórter editor do blog pôde constatar, Paulo Nogueira e o pai, Emir Nogueira, jamais foram petistas; mas Paulo era acusado de se-lo apenas por ser de Esquerda. A tristeza e a indignação se tornam maiores porque Paulo Nogueira foi acometido por essa desgraça que é o câncer, que ceifou-lhe ávida e deixou mais pobre o jornalismo brasileiro; isso numa época sombria, em que o trabalho de jornalistas independentes como ele é mais do necessário, mas essencial.
Infelizmente Paulo não terá substituto, embora o irmão Kiko e a equipe do DCM tenham seu talento e valor.