A morte trágica do sertanejo Cristiano Araújo provocou um misto de comoção e surpresa em todo País. Muitos não entenderam até agora como é que um artista pouco conhecido no eixo Rio-São Paulo-Brasília tinha uma legião tão grande de admiradores, a ponto de 30 mil pessoas acompanharem o seu velório em Goiânia.
O cantor Cristiano Araújo não é o único desconhecido dos grandes centros. Com a cara virada para o Atlântico, o Brasil sabe muito pouco do que está acontecendo nas suas costas. É incrível! Mas, no mundo do “tempo real”, o Oeste brasileiro – com toda a sua pujança econômica, social, cultural, turística – tem uma presença muito rala na mídia nacional.
Enquanto pelas bandas de cá estamos aturdidos com o fato de que o superávit primário de 2015 é o pior dos últimos 17 anos, no Sul do Mato Grosso do Sul, mais precisamente na cidade de Dourados, a grande preocupação é se o preço de um saco de 60 quilos de soja continuará valendo R$ 62.
Pelas bandas de lá, as atenções estão voltadas para a Bolsa de Chicago e não para as enfadonhas peripécias do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, na sua cruzada para se autopromover, criando constrangimentos ao atual governo. Um rápido giro por cidades como Londrina, Ponta Grossa, Guarapuava, Guaíra e Cascavel, no Paraná ou Nova Andradina, Dourados e Bonito no Mato Grosso do Sul tem-se a nítida sensação de que estamos num outro Brasil. Lá, a crise ainda não chegou.
Demissões em massa não aconteceram, até agora. Quase todos os empresários do agronegócio apostam que em 2015 teremos uma safra de grãos acima dos 200 milhões de toneladas conquistadas no ano passado. A construção civil continua no mesmo ritmo de 2014. Também não houve reflexos perceptíveis na venda de veículos utilitários e maquinário agrícola. Para alguns, especialmente novos lançamentos de SUVs, há filas de espera.
Em todas as cidades acima citadas são visíveis os conjuntos habitacionais do Minha Casa Minha Vida estalando de novos. A mendicância e a violência nas ruas existem. Mas, não são escancaradas como no Rio e São Paulo. A miséria e a pobreza de lá conseguem manter uma certa dignidade.
Os analistas econômicos do Sul Maravilha quando se debruçaram sobre a numeralha do minguado PIB de 2014 constataram que o estrago poderia ter sido maior não fosse o exuberante desempenho da agricultura e da pecuária. Pois é, o sertanejo Cristiano Araújo é fruto deste outro Brasil que avança apesar de todos os pesares. E, que por sinal continua indo bem, obrigado.
3 Comentários
[…] ocorre Brasil a dentro, como mostrou recentemente Arnaldo César, nesta página com o artigo “O Brasil não conhece o Brasil“. Depoois reclamam da perda de leitores e de […]
O cantor participou do programa do Faustão (Globo), foi entrevistado pela Angélica (Globo) era contratado da Som Livre (Globo) e era desconhecido em boa parte do Brasil.
Num primeiro momento, fiz essa mesma leitura: o Brasil intelectualmente mais sofisticado desconhece o Brasil das massas, o do povo, o “verdadeiro” Brasil. Mas ao ler o comentário aí de cima, que resume toda essa linha de argumentação, eu me dei conta: tem uma parte do Brasil que consome os conteúdos criados pelas Organizações Globo e uma parte que tem acesso a outros conteúdos. Portanto, dizer que “o Brasil não conhece o Brasil” equivale a dizer que o Brasil “que vale”, o “verdadeiro”, é o Brasil da Globo. Será que é mesmo? Afinal, que país é este?