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Arnaldo César (*)

Sérgio Moro na BBC

Sérgio Moro na BBC

O depoimento sigiloso prestado pelo empresário Marcelo Odebrecht ao juiz Sérgio Moro, na última segunda-feira (dia 10), foi transmitido ao vivo pelo site “O Antagonista”. Como é de costume na “Lava Jato”, os trechos do depoimento escandalosamente vazado pela publicação de extrema-direita foram escolhidos a dedo.

Em tempo real, pode-se acompanhar o momento em que o herdeiro da maior empreiteira do País revelou que as alcunhas de “amigo” e “italiano” registradas nas planilhas de propinas pagas pela sua organização, referiam-se, respectivamente, a Lula e Palocci.

Como os advogados presentes reagiram de pronto e com veemência ao absurdo, o juiz Moro foi obrigado a registrar o vazamento na ata da audiência. E recolher celulares. Curiosamente, é a segunda vez que uma ordem dele é desrespeitada. Ocorreu parecido quando da condução coercitiva de Lula que ele determinara expressamente que não fosse filmada, e a Polícia Federal filmou e disponibilizou o vídeo, como mostramos em  Filme chapa branca, com verba pública.

A posição do magistrado com relação aos vazamentos é conhecida de longa data.

Em uma entrevista exclusiva ao enviado especial da BBC Brasil aos Estados Unidos, Ricardo Senra,  publicada na mesma segunda-feira (10/04) da oitiva de Marcelo Odebrecht – disponível áudio e vídeo em Moro diz que investigar vazamentos é como ‘caça a fantasmas’ -, o magistrado-mor da “Lava Jato” disse o que segue reproduzido abaixo:

“Pontualmente, realmente ocorreram vazamentos e muitas vezes se tenta investigar isso, mas é quase como se fosse uma caça a fantasmas, porque normalmente o modo de se investigar isso de maneira eficaz seria, por exemplo, quebrando sigilos do jornalista que publicou a informação. E isso nós não faríamos, porque seria contrário à proteção de fontes, à liberdade de imprensa. E, eu não estou reclamando destas proteções jurídicas, acho importante”.

Eduardo Guimarães, vítima de condução coercitiva e da apreensão do celular e equipamentos eletrônicos.

Eduardo Guimarães, vítima de condução coercitiva e da apreensão do celular e equipamentos eletrônicos.

O juiz Moro que proferiu as palavras reproduzidas acima (entre aspas) é o mesmo que, no dia 21 de março passado, determinou que o jornalista Eduardo Guimarães, fosse arrancado de casa, às 6 horas da manhã e levado coercitivamente à sede da Polícia Federal em São Paulo para esclarecer informações publicadas no seu “Blog da Cidadania”.

Guimarães divulgou com antecedência que o ex-presidente Lula iria ser levado coercitivamente para depor na Polícia Federal e teria sigilo bancário e fiscal quebrados no dia 04 de março do ano passado. Como se recorda, a operação espalhafatosa da Polícia Federal encontrou resistências na base aérea de Congonhas (SP) e se transformou numa comédia das mais ridículas.

O repórter da BBC também encurralou o nobre juiz sobre a recente condução coercitiva de Guimarães por conta da desculpa esfarrapada do magistrado de que o editor do “Blog da Cidadania” não poderia ser considerado jornalista. Muito embora, instituições especializadas na certificação de profissionais de imprensa (como é o caso da Federação Nacional de Jornalista, FENAJ) já tenham protestado contra essa tese marota.

O seletivo juiz que comanda a “República de Curitiba” acha que o direito de fonte e a Liberdade de Imprensa valem para uns e não valem para outros, especialmente, se eles tiverem – ou tenham tido – alguma ligação com o PT.

Moro, é bom não esquecer, que deixou vazar para o “Jornal Nacional” conversas telefônicas da então presidente Dilma Rousseff com o ex-presidente Lula, foi rispidamente censurado pelo falecido ministro Teori Zavascki, mas não se emenda. Para admiração geral é com esse notório senso de imparcialidade que ele vem julgando os envolvidos nas roubalheiras da Petrobras.

Marcelo Odebrecht, depoimento vazado

Marcelo Odebrecht, depoimento vazado

A postura de Moro na transmissão “real time” do depoimento de Marcelo Odebrecht da última sexta-feira (dia 10) está perfeitamente de acordo com o que reza os manuais da “lawfare” (a guerra travada através da manipulação das leis). No caso, passa-se a mão na cabeça dos aliados e espeta-se o coração dos adversários.

O problema é que a justificativa de “caça ao fantasma” assacado por Moro não pegou bem na alta corta da Justiça brasileira. A presidente do STF, Cármem Lúcia, foi uma das que reagiu às alegações capengas do juiz de primeira instância do Paraná. Logo depois de uma palestra, em Washington, ela defendeu que o vazamento fosse investigado com rigor e celeridade.

A razão para isso é muito simples: se o depoimento era sigiloso e foi vazado (com a anuência ou não do juiz), ele se torna inepto. Portanto, aqueles que acreditaram que iriam ferrar com o ex-presidente Lula e o ex-ministro Palocci acabaram favorecendo os dois.

Não há razão para que a “Lava Jato”, um processo legítimo de combate à corrupção e de moralização do Brasil, siga por caminhos tortuosos. Liberdade de Imprensa também pressupõe respeito às leis vigentes. Mesmo que isso contrarie os interesses pessoais de um juiz tão poderoso.

(*) Arnaldo César é jornalista e colaborador do Blog

3 Comentários

  1. taciana jales disse:

    Na realidade esse depoimentos podem até ser anulados, mas já produziram os efeitos a que se destinavam: ferrar com o nome de Lula frente a uma próxima eleição e dar pano para largas manchetes nas candinhas oficiais da Direitona.
    Se o Direito ainda existisse, saberíamos que eles de nada valem. Bastava pedir um exame de sanidade mental de Marcelo Odebrecht ou exigir-lhe as provas do que afirma.
    A propósito, ninguém até agora, pediu um exame desse rapaz, feito por uma junta de psiquiatras e psicólogos?

  2. João de Paiva disse:

    Gostei deste artigo. Direto, contundente.

    No final o autor lembra:

    “A razão para isso é muito simples: se o depoimento era sigiloso e foi vazado (com a anuência ou não do juiz), ele se torna inepto. Portanto, aqueles que acreditaram que iriam ferrar com o ex-presidente Lula e o ex-ministro Palocci acabaram favorecendo os dois. ”

    A ressalva que ele não fez é que essa previsão legal só valeria se o vazamento fosse contra um aliado político da Fraude a Jato. Como o TRF4 já deixou claro, ao instaurar o Estado Fascista de Exceção, a Fraude a Jato é excepcional e não segue a Lei. Para incriminar Lula valem quaisquer ilegalidades criminosas cometidas por agentes da Fraude a Jato.

    É na ONU que os advogados devem denunciar essas ilegalidades criminosas. Não nos iludamos com Cármen Lúcia ou qualquer outro ministro do STF.

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