Na reportagem aqui publicada – Operação “Carbono14”: mandados ficaram um mês na gaveta. Por quê? – no sábado (02/04) mostramos os fortes indícios da utilização política das investigações na Operação Lava Jato. Sequer tínhamos ideia da coluna que Janio de Freitas publicaria no dia seguinte na Folha de S. Paulo (domingo, 03/04).
Atento a um pequeno detalhe – mas, de importância relevante – reportado pela jornalista Paula Reverbel, da própria Folha, com relação à palestra do procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima, o colunista concluiu o mesmo que nós fizemos na reportagem deste blog. Sua conclusão decorreu da frase do procurador transcrita na íntegra por Paula no texto Governos anteriores ao PT limitavam investigações, diz procurador da Lava Jato:
“Um ponto positivo que os governos que estão sendo investigados, os governos do PT, têm a seu favor é que boa parte da independência atual do Ministério Público, da capacidade administrativa, técnica e operacional da Polícia Federal decorre de uma não intervenção do poder político”. (grifei)
É verdade que o procurador, naquele momento (quarta-feira, 30/04) jogava com a possibilidade do impeachment passar. Tanto que ele afirmou “esperamos que isso esteja superado!” referindo-se a governos futuros e fazendo alusão à prática de “os governos anteriores manterem o controle das instituições”. Na verdade, estes “governos anteriores” limitam-se aos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, ou seja, à era tucana.
Convém lembrar, como admitem os delegados federais Paulo Lacerda e Zulmar Pimentel, dois dos principais investigadores do escândalo que envolveu o ex-presidente Fernando Collor e seu tesoureiro, Paulo César Faria, que ali, a despeito de tudo o que fez, o então presidente também não interferiu nas investigações que provocaram seu impeachment. Tampouco houve interferência na era de Itamar Franco, quando a Polícia Federal foi comandada por militares.
A prática surgiu e persistiu com FHC que manteve na direção da Polícia Federal Vicente Chelotti – a despeito da oposição que lhe fazia o então chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Alberto Mendes Cardoso – contando ainda com o apoio daquele que passou para a História como o “engavetador-geral da República”, Geraldo Brindeiro, mantido à frente da Procuradoria geral da República, a despeito da falta de apoio da maioria dos seus pares.
O procurador, entretanto, pode ficar mais tranquilo. A partir de todos os indicativos que surgiram na semana passada (de 27/03 a 02/04) sabe-se agora que é pouco provável que o impeachment passe pelo plenário da Câmara dos Deputados, tal como admitiu aqui no blog Arnaldo Cesar, no artigo Hoje tem marmelada?
Ou seja, ele continuará tendo liberdade de investigar pois o governo petista continuará comandando o país e nada indica que venha a mudar sua prática, mesmo sendo o alvo direto das investigações dirigidas e seletivas do MPF como Santos Lima, consciente ou inconscientemente, acabou admitindo.
Abaixo o artigo de Janio de Freitas:
Intencional, por certo não foi. Muito melhor: foi autêntico, com a naturalidade das palavras que burlam, espontâneas, a censura protetora das nossas conveniências. Foi um pequeno trecho de frase, intercalado com ligeireza. A frase, por sua vez, destinava-se a outro fim –o reconhecimento da “não intervenção” dos governos do PT na ação do Ministério Público e da Polícia Federal, “porque os governos anteriores realmente mantinham controle das instituições”. A palestra, está claro, decorria com plena e descontraída franqueza do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, o comunicador da Lava Jato.
Eis o pequeno trecho que o auditório da Câmara Americana de Comércio pôde ouvir, sem sinal de notá-lo, e a repórter Paula Reverbel não excluiu, como fizeram outros, do seu relato para a Folha: “[…] os governos que estão sendo investigados, os governos do PT, […]”.
O que a Lava Jato investiga de fato, por meio de investigações secundárias, não é a corrupção na Petrobras, não é a ação corruptora de empreiteiras, não são casos de lavagem de dinheiro: são “os governos do PT”.
Deixa, portanto, de ser coisa de esquerdista, governista, lulista, petista & cia., como alegado por tantos, a dedução de que a Lava Jato procede com direcionamento e seletividade. E age muito além do alcance investigativo e processual a que foi legalmente destinada. Com finalidade que explica o seu descaso por indícios e mesmo por delações premiadas, tão valorizadas em seu método, de corrupção anterior ao primeiro governo do PT.
A Lava Jato é, agora declaradamente, uma operação judicial com objetivo político-partidário, cujos atos e êxitos contra a corrupção são partes acessórias do percurso contra três governos (partido e personagens). Não são esses os mandatos conferidos ao juiz e aos procuradores da Lava Jato, no entanto. Pode-se imaginar o fim visado. Mas de onde vêm tal presunção e tal objetivo da Lava Jato é uma incógnita para o próprio Judiciário, que, afinal de contas, é o primeiro Poder questionado.
Dentro da crise que se vê há outra, senão outras crises. Como a de autoridade, que até as simples aparências de opinião pública esvaziam.
3 Comentários
Muito bom.
Quanto a manutenção do Vicente Chelotti no governo FHC, o Bob Fernandes já explicou porque era mantido e quando caiu, porque caiu.
Marcelo, isso.aí tem gente lá dentro da PF, avisando há mais de dois anos.