De Claudio Fonteles: “Falta serenidade”
11 de abril de 2016
Do Paraná, o exemplo de Aliel!
12 de abril de 2016

Em Brasília, não existe acaso; tudo é ardilosamente planejado

Marcelo Auler*

De bobo e de anjo, Michel Temer nada tem. Portanto, ele não se engana, planeja. Foto - site Republica dos Bananas.

De bobo e de anjo, Michel Temer nada tem. Portanto, ele não se engana, planeja. Foto – site Republica dos Bananas.

Acredite quem quiser que Michel Temer errou ao usar o WhatsApp e, sem querer, vazou o discurso que preparou para o caso de a Câmara dos Deputados, no próximo final de semana, aprovar a admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

O vice-presidente pode ser tudo – falso, interesseiro, dissimulado. Só não é bobo. Se o fosse, não estaria aonde está hoje. É verdade que ele se considera um “vice-decorativo”. Agora, porém, conquistou a pecha de “vice-golpista”.

Mesmo que a oposição consiga 342 votos para recomendar ao Senado a abertura de um processo de impeachment, isto não significa que haverá impedimento da presidente. Logo, não existe razão para o vice anunciar à nação que está preparado para ocupar o cargo. Se a admissibilidade do processo passar, ele ainda continuará na função de “vice-decorativo”. Portanto, longe da cadeira que almeja.

Se hoje já não é certo que a Câmara admita o processo – a oposição sabe que não tem ainda o número de votos necessários – mais difícil ainda é prever se e quando os senadores aceitarão processar a presidente, condição sine qua non para o afastamento dela e a ascensão de Temer. Logo, discurso algum seria necessário, ou cabível, nos próximos dias.

Na Lapa, milhares de pessoas reuniram-se para ouvir Lula e grita que "não vai ter golpe". Foto - reprodução Tijolaço

Na Lapa, milhares de pessoas reuniram-se para ouvir Lula e gritar que “não vai ter golpe”. Foto – reprodução Tijolaço

O recado que ele alega, com um cínico sorriso nos lábios, ter sido fruto de um erro, tudo indica, foi bem planejado, por ser necessário.

Embora trancado no palácio Jaburu e no gabinete de vice, no Anexo II do palácio do Planalto, político experiente, ele deve estar bem informado do que se passa nas ruas. Como o que aconteceu na noite desta segunda-feira (11/04) no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro.

Ali,como mostraram televisões (TV Brasil, em especial), mídias alternativas e o próprio Tijolaço na reportagem Um mar de gente na Lapa, 38 ratos em Brasília. Quem vencerá?, do qual reproduzimos a foto acima, uma multidão se reuniu não apenas para ouvir Luiz Inácio Lula da Silva, mas para demonstrar mobilização para evitar o golpe via impeachment. Da mesma forma que estão conscientes de que não pode haver impedimento da presidente por não existir crime de responsabilidade contra ela, os manifestantes não acreditam em um governo de Temer.

A corroborar minha tese de que tudo foi ardilosamente planejado, Mônica Bérgamo – a quem devo parte do meu primeiro Prêmio Esso – publica na sua coluna desta terça-feira (12/04), na Folha de São Paulo, duas notas interessantíssimas:. Uma abre a coluna, a outra vem mais abaixo:

Temer planeja lançar campanha pró-impeachment nas redes sociais

“Michel Temer (PMDB-SP) deve se reunir nesta terça (12) com assessores para discutir campanha nas mídias sociais a favor do impeachment patrocinada pelo PMDB. Uma das ideias é a de divulgar ainda mais o áudio em que o vice-presidente fala como se o impedimento já tivesse sido aprovado, e que foi distribuído na segunda (11) a um grupo de parlamentares da legenda pelo próprio vice, por WhatsApp”.

(…)

“A TABELA
Os aliados de Temer calculavam que, no domingo, o impeachment contava com 321 votos no plenário da Câmara. Ainda faltariam 21 para sacramentar o afastamento de Dilma”.

Eleitores de Lula e Dilma, ou mesmo aqueles que neles não votaram mas dos seus governos se beneficiaram ou por eles foram conquistados, sabem que Temer assumindo – e, junto, os partidos atualmente na oposição – boicotará, ou mesmo eliminará, conquistas promovidas pelos governos petistas. Certamente irá dizer da necessidade de cortar gastos do governo para garantir superavit fiscal. Será a volta do neoliberalismo, em que políticas sociais são massacradas em favor do pagamento de juros de dívidas, muitas delas duvidosas.

Ainda que se diga que nas praças estão apenas militantes petistas – o que nem sempre pode se considerar verdade – as mobilizações crescem e motivam a militância, justo nos dias que antecedem a decisão da Câmara admitir ou não que a presidente deve sofrer o impeachment.

A mobilização, portanto, pode levar à pressão junto aos parlamentares, inclusive com cobranças da manutenção das políticas sociais conquistadas. Temer tenta barrar isto.

Se o impeachment não passar, a oposição irá apostar suas fichas no trabalho do ministro Gilmar Mendes, que estará na presidência do TSE, para cassar a chapa Dilma/Temer. Caindo um, caem os dois.

Se o impeachment não passar, a oposição irá apostar suas fichas no trabalho do ministro Gilmar Mendes, que estará na presidência do TSE, para cassar a chapa Dilma/Temer. Caindo um, caem os dois.

Única chance – O vice-presidente sabe que sua chance de assumir é esta. Caso não passe o impeachment de Dilma, a oposição, com o beneplácito e a cooperação do futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, jogará suas fichas na cassação da chapa Dilma/Temer.

Apelarão para as delações premiadas da Operação Lava Jato nas quais empreiteiros “confessam” ter feito doações à campanha da presidente com recursos, provenientes de superfaturamento e/ou propinas pagas para conquistarem obras públicas. Não é algo fácil de provar – que o dinheiro das doações está diretamente ligado às maracutaias. Mas, caindo um, caem os dois.

Conhecendo-se Gilmar Mendes como se conhece, o mais provável é que ele tente levar essa discussão e o julgamento do caso para o ano de 2017 pois, assim, ele garante ao próximo presidente a eleição indireta, por este Congresso que todos nós conhecemos. Única chance palpável hoje de os tradicionais partidos oposicionistas – PSDB, DEM, PPS e o próprio PMDB – conseguirem retornar ao Palácio do Planalto. Independentemente do nome que apresentarem, como mostrou a última pesquisa Datafolha.

Portanto, a Temer interessa, nestes próximos dias, evitar que a oposição perca votos no plenário da Câmara. Ele sabe que não adianta preparar discurso antes de garantir os votos. Como se constata pelo teor do “discurso vazado” – que pouparei aos leitores reproduzir, mas aos interessados indico a reportagem do JornalGGN de Nassif – Temer se diz governo de salvação nacional em áudio antecipado – o que ali está é um desmentido a todos que o acusam de ser uma ameaça às conquistas sociais. Acreditará nele quem quiser, mas a sua cartada é justamente para evitar perda de votos por pressão popular e tentar conquistar os que lhes faltam.

Com isso, fez uma jogada de risco em busca de salvar a admissão do impeachment, primeiro passo para sonhar com a cadeira de presidente da República, a qual, pelo voto, jamais conquistaria. Mas, ao mesmo tempo, sabe que a pecha de golpista lhe acompanhará pelo resto da vida. Pode, inclusive, estar antecipando sua aposentadoria. Acontecendo, só lhe restará se dedicar à mulher Marcela.

* Uma satisfação aos leitores. Este artigo começou a ser escrito na noite de segunda-feira (11/04) mas o sono e o estresse falaram mais alto e eu tive que deixar para terminar nesta manhã de terça-feira(12/04). Isso me possibilitou incorporar ao mesmo as notas da brilhante  e bem informada Mônica Bérgamo, publicada na Folha de São Paulo.

16 Comentários

  1. […] um outro ponto que Gasparti destacou e que nos passou desapercebido quando escrevemos Em Brasília, não existe acaso; tudo é ardilosamente planejado. O atual vice-decorativo, mandou um recado claro a governadores e prefeitos sobre a possibilidade […]

  2. Luiz disse:

    Auler, uma dúvida. A Marcela continuará se dedicando a ele?

  3. Esse Temer é mesmo duvidoso: é pura canalhice ou mera traição?…
    Tem gato nessa tuba, que vaza cartas e áudios marqueteiros.
    E, pelo histórico, só pode ser o Gato Angorá…

    • Luiz disse:

      Aguinaldo, Temer é a reencarnação do traidor Joaquim Silvério dos Reis. Até a data da delação premiada ao Conde de Barbacena é a mesma, 11 de abril. Veja o blog do Franklin Martins.

  4. Messias Franca de Macedo disse:

    *TSE não tem poder para cassar Dilma, diz jurista Dalmo Dallari195
    Felipe Amorim

    Do UOL, em Brasília 07/10/2015 11h45

    (…)

    FONTE: http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/10/07/tse-nao-tem-poder-para-cassar-mandato-de-dilma-diz-jurista-dalmo-dallari.htm

    Respeitosas saudações democráticas, civilizatórias, progressistas, nacionalistas e antinazifasciterroristas e antigolpistas,

    Messias Franca de Macedo
    Feira de Santana, Bahia
    República de ‘Nois’ Bananas?!
    A conferir!

    • Messias Franca de Macedo disse:

      Prezado, conspícuo e impávido jornalista Marcelo Auler,
      parabéns por mais este belíssimo e elucidativo texto!

      Aproveito o ensejo para, humildemente, propor uma reflexão:
      “o supremo DEMoTucano” gilmar mendes (PSDB/MT) &$ os demais vulgares nazifascigolpistas sabem que o TSE não tem competência para depor a digníssima e absolutamente honrada presidenta Dilma Vana Rousseff…
      O eminente, catedrático e honrado jurista *Dalmo Dallari já se manifestou publicamente a respeito do tema…
      E temos agora mais um depoimento cabal…

      Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos diz que vazamentos anulam investigação:

      11/04/2016

      (…)

  5. antonio augusto brito disse:

    Caro Marcelo,

    Ótimo artigo, porém noto uma contradição. Se Temer não pode assumir em caso de impedimento – pois a chapa seria cassada – por que buscar mais votos no Congresso para o impeachment? Por que não esperar 2017 para Gilmar decretar eleições indiretas?

    • ZeLuiz disse:

      Prezado Antonio Augusto, Temer seria cassado se o TSE cassar a chapa Dilma/Temer por irregularidades nas eleições 2014. Em caso do Senado aceitar a denúncia da câmara, a Dilma fica impedida e o golpista-mor assume. São situações distintas.

    • Attila Louzada disse:

      Antônio Augusto, se Dilma sofrer impeachment, Temer assume. Se Gilmar Dantas, oops, Mendes conseguir que a chapa Dilma-Temer seja, digamos, cassada, então ambos deixam o governo. Esta hipótese não interessa a Temer, que sabe muito bem que não será escolhido presidente lá adiante para completar o mandato atual. Por isso ele joga suas fichas no impeachment dela.

    • olivires disse:

      São duas coisas diferentes:

      1. Impeachment da Dilma – só ela cai, assume o vice até o final do mandato, como ocorreu com Collor-Itamar;

      2. Cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, por abuso de poder econômico, no caso, receber dinheiro ilegal de empreiteiras.

      No caso da cassação da chapa no TSE, há vacância dupla dos cargos de presidente e vice.

      A linha de substitutos (pres. CD, pres. SF, pres. STF) não está autorizada, pela Constituição, a cumprir o mandato até o final, há mera substituição por 30 dias ou por 90 dias.

      Se a chapa pres.-vice cair nos 2 primeiros anos de governo, há eleições diretas em 90 dias, com Cunha presidindo o país por esse período.

      Se a chapa pres.-vice cair nos 2 últimos anos de governo, há eleições indiretas (só Congresso vota) em 30 dias, com Cunha presidindo o país por esse período.

      OBS.: Há uma jurisprudência esdrúxula criada no TSE em que a chapa cassada é substituída pela chapa que ficou em segundo lugar na eleição.

      Foi o que ocorreu com a cassação da chapa do governador Jackson Lago, no Maranhão, que foi substituída pela chapa de Roseana Sarney, segunda colocada nas eleições, por decisão do Tribunal Eleitoral.

      Esse entendimento não está embasado em legislação alguma, é mero casuísmo do TSE e afronta a obrigatoriedade constitucional do eleito para cargo do Executivo (salvo prefeituras com menos de 200 mil eleitores) ter a maioria absoluta dos votos válidos.

      O segundo colocado jamais deteria a maioria absoluta, a não ser que fossem inutilizados todos os votos do vencedor.

      Mas aí cairíamos na regra de que uma eleição com mais da metade dos votos anulados deve ser REFEITA, e não alçar ao cargo o segundo colocado.

  6. José Ribeiro disse:

    Temer no áudio “vazado” falou de tudo, menos da Lava Jato.

  7. C.Paoliello disse:

    Alguém ainda tem dúvidas sobre a conexão lava jato-CIA?

    https://wikileaks.org/plusd/cables/09BRASILIA1282_a.html

  8. Ricardo Pimpão disse:

    Show de bola Marcelo!
    Continue o bom trabalho de informar de forma isenta.

    Com relação ao Temer, acredito que a Policia Federal, que tanto bateu no PT, não perde por esperar, em um governo dele, o sangue vai correr, hehehehhehe

  9. Desiderius disse:

    Sempre bem elucidativo!

  10. […] Ele descarta a hipótese do acaso ter sido o responsável pela sua distribuição: “Em Brasília, não existe acaso; tudo é ardilosamente planejado“. […]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Social Media Auto Publish Powered By : XYZScripts.com