Nas oportunidades em que comentamos a solidariedade que o blog e o jornalista que o edita têm recebido (leia aqui e aqui) em função da censura a que fomos submetidos, destacamos que não se trata de algo pessoal, mas sim da defesa de uma bandeira que atinge a todos os cidadãos: o direito à livre manifestação de idéias, informações e opiniões.
É exatamente desta forma que enxergo o editorial do jornal Folha de S. Paulo desta quinta-feira, (02/06) – Operação censura. A opinião do jornal, coincidente com a que defendemos – respeitado o direito dos que se sentirem atingidos buscarem reparo judicial, condena bravamente a censura – não deve ser vista como uma solidariedade ao blog e ao jornalista. Tampouco pode ser confundida com um apoio do jornal à linha editorial deste blog. Trata-se sim da defesa de uma bandeira que está hasteada desde a redemocratização do país e da qual a sociedade – e não apenas jornalistas, escritores, artistas, etc – não pode abrir mão: o direito à livre circulação de ideias, informações e opiniões.
É um NÃO à censura! Ou, usando uma expressão da ministra Carmem Lúcia na histórica decisão do Supremo Tribunal Federal que sepultou, em 10 de junho de 2015, as mordaças e liberou a publicação de biografias não autorizadas:
“Cala boca já morreu…..”
Lamento, apenas, que nem todos os colegas -seja por divergirem ideologicamente do blog, seja por esquecimento ou falta de percepção – não notaram que a censura imposta pelos 8º e 12º Juizados Especiais de Curitiba a pedido dos delegados Erika Mialink e Maurício Moscardi, não é uma questão pessoal deste blog. Ela afeta a sociedade brasileira, como bem definiu nosso colega Fernando Molica na sua página do Facebook, já em 29 de maio, ao postar:
“Ao atropelar a Constituição e censurar o blog do Marcelo Auler, o judiciário ataca direitos de todos nós“.
O nós, no caso, não são apenas os jornalistas, mas antes e acima de tudo a população pois, na verdade, o que a Constituição prevê e o Supremo tem garantido, não é o direito do jornalista exercer a liberdade de expressão para uma satisfação pessoal e/ou profissional. Mas, sim o direito do cidadão receber informações livres de filtros, para ele sim, tomar as conclusões que achar que deve sobre os fatos que acontecem no país, municiado das mais diversas informações e opiniões.
Trata-se, portanto, de um direito Social. É por enxergá-lo desta maneira que o Supremo tem garantido que este direito se sobrepõem, inclusive, aos direitos a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Afinal, o mesmo art. 5º da Constituição prevê o direito de resposta e, se for o caso, à indenização. Justamente para que o direito individual não se sobreponha ao direito social, da liberdade de informação.
Infelizmente, ao que parece, isto não foi entendido nem por quem pediu, nem por aqueles que decretaram a censura ao blog.
Na oportunidade, renovo novamente todo o apoio que venho recebendo de amigos, colegas de profissão, de diversos companheiros blogueiros como Luis Nassif e Fernando Brito e de leitores. Destaco aqui, personalizando nele meu agradecimento a todos, a solidariedade do colega Luiz Salgado Ribeiro (velho companheiro da Folha de S. Paulo) que, reconhecidamente discorda da linha deste blog mas, superando todas as diferenças ideológicas, percebeu o perigo desta censura e prontamente posicionou-se: Censura, não!
Abaixo, transcrevo o editorial da Folha de S. Paulo desta quinta-feira.
EDITORIAL
Não é estranho à condição humana que os aplausos recebidos diminuam a capacidade de autocrítica –e que, em seguida, decresça também a tolerância aos reparos que se possam receber de terceiros.
Acrescentem-se a isso as possíveis deformações advindas de uma posição de poder, sobretudo quando os ocupantes de tal posto supõem representar a salvação da pátria ou a derradeira reserva de moralidade institucional de um país.
O resultado não costuma ser outro que a tomada de iniciativas em favor da censura, repetindo o conhecido equívoco de considerar que a única liberdade de expressão válida seria aquela que reafirma nossas próprias convicções.
Vários personagens e instituições protagonizaram esse deprimente enredo ao longo da experiência política brasileira.
Chega a vez de alguns representantes da Polícia Federal vinculados ao sucesso técnico e popular da Operação Lava Jato: dois delegados da chamada “República de Curitiba” moveram ação judicial contra o jornalista Marcelo Auler, que os criticara em seu blog.
É direito de qualquer cidadão recorrer aos tribunais caso se sinta injuriado, caluniado ou difamado. Reparações, acordos e erratas são negociáveis; há, em último caso, as medidas previstas em lei.
A Justiça, porém, jamais deveria ordenar a retirada de circulação de textos opinativos, ainda mais quando versam sobre o comportamento de autoridades públicas.
Perverte-se a ideia de que o cidadão deva ser protegido dos abusos do poder (incluindo-se aqui o poder da imprensa) para fazer de um órgão judicial um mecanismo de auxílio aos poderes que porventura abusem do cidadão.
Tudo se torna mais escandaloso, no caso Auler, quando o Judiciário determina, ademais, que o jornalista se abstenha de publicar textos “com conteúdo capaz de ser interpretado como ofensivo” a um dos delegados da Lava Jato.
Não apenas censura, portanto, mas também censura prévia.
É espantoso que, depois de quase 30 anos de vigência de um regime constitucional democrático, magistrados ainda lidem mal com um princípio tão claro e inegociável nas sociedades civilizadas.
Nesse episódio específico, a disposição autoritária sem dúvida se camufla em meio ao ânimo messiânico e justiceiro que se cria em torno das necessárias —e sempre louvadas— ações contra a corrupção.
Nada seria melhor para as autoridades da Lava Jato, todavia, do que se mostrar imune a críticas —e não procurar silenciá-las, como se delas tivessem efetivo receio.
12 Comentários
[…] no Brasil e no exterior – veja em Elio Gaspari: “O ‘CALA-BOCA’ VAI BEM, OBRIGADO”; Da Folha de S.Paulo: Operação Censura; Jornalismo nas Américas: “a censura (no Brasil) tem sido prática recorrente”; O repúdio […]
[…] A propósito, vale repetir aqui o que constou do editorial da Folha de S. Paulo, em 02 de junho, ao criticar a censura imposta a este blog (Da Folha de S.Paulo: Operação Censura): […]
[…] Da Folha de S.Paulo: Operação Censura […]
O Brasil volta a sofrer de pereba republicana. Doença que de tempos em tempos, assola nossos homens publicos. Os sintomas são, medo, diarréia, irritabilidade e vontade de ter aumento de salário. Alô Fundação Oswaldo Cruz. Olha a vacina!
Um juiz quando vê que extrapolou numa decisão e, como diria meu pai, “sente a mancada”, i.é, fortes reações à flagrante falta de Direito em algum ato de sua lavra -como no caso da condução coercitiva de Lula-,trata de manifestar um pedido de desculpa a seus superiores, evitando puxões de orelha ao mesmo tempo que recompõe sua imagem (e dos demais magistrados), e passa a cuidar melhor de escamotear, seu parti pris, sua fé própria, nas virgulas e espaços dos artigos de leis que o conhecimento jurídico lhe permite. Não é o caso do policial, inspetor, delegado. Foram bacharéis em Direito, panoramicamente. Não necessitam do exame da OAB para o exercício da profissão, nem podem exercer a advocacia enquanto policiais. São soldados da lei, guardiões da justiça, servidores de juízes, mas por força institucional operam, cotidianamente, em autos de apreensão, detenção, inquisição, investigando, perseguindo, etc. com uso de força e armas em caso de resistência, arriscando sua integridade física. Lidam diariamente com a suspeição de crimes ou suas materializações, elaboradas ou prosaicas, por vezes espantosas, cruéis. Trabalho nada salubre! Assim, paulatinamente, discurso e prática de autoridade policial conseguem extravasar e impor-se além do horário de trabalho. O uso do cachimbo entorta a boca, e o fumo do cachimbo da Justiça entorpece a mente. Situado na base da pirâmide do sistema judiciário, mas dispondo de poder maior que o comum dos cidadãos, a começar pelo porte de arma, o policial tem pouca chance de desenvolver seu compromisso político-social, seu engajamento na cidadania: sua necessária neutralidade, o tal profissionalismo, leva-0 à omissão, ou falta de identificação com as comuns causas humanas. E alguns deles remetem ao inspetor Javert, dos Miseráveis, do sec. 19, para quem a lei era mais que religião, era a razão da vida, e de sua sequente morte. Para estes, a crítica, fora do ambiente de trabalho, é afronta, ameaça. Não podendo sacar arma, ou dissimular suas “mancadas” como os sabidos juízes fazem, apelam para a Justiça, desamparados como qualquer outro cidadão mas, acima de tudo, Policial, o braço forte, de mãos calejadas ou enluvadas, ás vezes sem dedo, sujas, a serviço da Justiça. Esta justiça que temos, com suas togas escuras e velhos disfarces, é que, sim, é “a cabeça” promotora do crime maior, pois enraizada pelo antigo e decrépito capitalismo, ainda julga pelos seus quase cegos olhos, ao invés de, sabiamente, ouvindo os clamores populares, entender e atender legítimas demandas da evolução social, econômica e política brasileira, para caminhar e encaminhar com o poder da nação. Contra o golpe! Contra o ajuste fiscal! Fora Cunha, fora Temer, fora Gilmar!
Caro Marcelo Auler, tenha o respeito dos polícias federais do Brasil. Todos têm ciência dos fatos por você, corajosamente, noticiados. Todos os fatos foram repassados ao atual MJ, assim como foi feito aos MJs anteriores. Algo de errado ocorre na COAIN, não é razoável período tal longo para finalizar sindicâncias. especialmente a do fumodromo, que é bastante simples. Tenha nosso respeito. Policiais Federais do Brasil.
Lamentável este triste episódio no jornalismo.
Enquanto a sociedade acredita na lisura da lava jato e espera uma resposta de seus administradores, eles invocam o direito ao silêncio na cpi da petrobrás e não fazem uso do direito de resposta neste episódio. Mais uma vez se escondem, pedindo para retirar matérias que expoem fatos sérios sobre a idoneidade da operação do ar.
Lamentável, muito lamentável e uma mancha na PF.
Pior de tudo é ver pessoas sérias e apelidadas de “éticas” compactuando com essa impunidade e obscuridade.
hãn?
Feito o registro do editorial e do ponto de vista de alguns jornalistas com opinião diversa do que conduz este blog, mas que se posicionam contra a censura, é bom que não criemos falsas expectativas em relação à Folha e a seu dono, Otávio Frias Filho.
Como escreveu Fernando Brito, credibilidade é como virgindade; uma vez perdida…
A Folha é integrante do PIG, conspirou pela queda da presidente Dilma, criminalizou a Esquerda e seus principais líderes (Lula, José Dirceu, José Genoíno), manipulou, mentiu distorceu, omitiu, blindou tucanos e políticos da direita, etc. Há poucos meses a FSP contratou Kim Kataguiri como colunista, uma verdadeira cusparada em jornalistas e analistas políticos como Jânio de Freitas, Ricardo Melo e mesmo Elio Gaspari. Antes já publicava coluna de opinião do atual senador tucano Aécio Neves. A mesma FSP, há poucos dias, publicou reportagem sobre os diversos processos contra os líderes do MBL, entre eles Renan Santos e família (são 125 ações judiciais, envolvendo ações cíveis, processos trabalhistas e por lavagem de dinheiro). Conforme reportagem publicada no DCM
“Áudios divulgados na imprensa na sexta-feira (27) mostraram que o Movimento Brasil Livre recebeu dinheiro e apoio de partidos como PMDB, PSDB, DEM e Solidariedade.
Os recursos foram usados no protesto do dia 13 de março de 2016, que reuniu 500 mil pessoas na Avenida Paulista.
A Juventude do PSDB pagou as caravanas e os lanches do protesto, enquanto o PMDB foi encarregado dos panfletos, de acordo com um áudio que vazou. As “máquinas partidárias” do DEM e do Solidariedade ajudaram o grupo com transporte.
Renan Antônio Ferreira dos Santos (32), um dos três coordenadores nacionais do MBL, é o personagem central da história.”
O portal UOL, do grupo Folhas, é que divulgou o áudio comprometedor.
Ora, a FSP há muito sabia o que eram esses movimentos pelo impeachment e quem os financiava. Mas criminosamente NADA fez antes que o golpe se consumasse. Portanto, esse editorial de hoje NÃO redime o jornal, seu dono e editores pelo desserviço que vêm prestando ao Brasil e pelo apoio sistemático que deram à quadrilha que perpetrou o golpe de Estado.
Por outro lado, a Folha está agora querendo dar uma de “diferentão” dos demais meios golpistas, para ganhar mercado, repetindo o que fez na campanha das diretas, quando desbancou o estadão. E, para isso, precisa dar umas escapadas do golpismo chapa-branca, como fez com as gravações do Machado. E, finalmente, a FSP deve se lembrar do governo Collor, que a invadiu a mando do Bernardo Bolero Zélia, o ministro da justiça.
Então o que ela está fazendo com este editorial é mais uma precaução a seu favor do que uma defesa do Marcelo Auler ou da blogosfera, que a FSP detesta e GOSTARIA DE FECHAR.
Auler, você sabe que policiais do Paraná foram perseguidos e criminalizados – injustamente, mediante fraude -, por tentar trazer a verdade à tona.
Você blogueiro, esses policiais, vocês não estão e nunca ficarão sozinhos nessa luta.
Força. Vamos juntos!
[…] Fonte: Da Folha de S.Paulo: Operação Censura | Marcelo Auler […]