Trago para o blog o artigo do jornalista Ricardo Kotscho que há muitos anos acompanha a trajetória de Lula e com ele este nos primeiros anos do primeiro mandato na Presidência da República, O texto original está no Balaio do Kotscho,, no portal R7.
Na longa travessia da roça sertaneja de Caetés, então distrito de Garanhuns, no interior de Pernambuco, de onde saiu com sete anos a bordo de um pau-de-arara, até o Palácio do Planalto, uma saga que o levou a ser um dos líderes políticos mais admirados do mundo, parece ser este o momento mais difícil da vida do ex-presidente Lula. Ao longo das últimas quatro décadas, como jornalista e seu amigo, acompanhei de perto esta trajetória única na nossa história.
Aos 69 anos, depois de vencer um câncer e dar a volta por cima nos mil obstáculos que encontrou pela frente, pela primeira vez Lula reclamou de cansaço em público. Nem precisava falar, bastava ver sua expressão angustiada nesta segunda-feira, durante o seminário “Novos Desafios da Democracia”, promovido em São Paulo pelo instituto que leva seu nome.
Não é para menos. Nas últimas semanas, fechou-se o cerco político-jurídico-midiático para tirá-lo de combate a qualquer preço e impedir que volte a disputar eleições. Para quem acompanha este Balaio, não deve surpreender o que está acontecendo.
“O alvo agora é Lula na guerra sem fim”, escrevi aqui no dia 2 de novembro de 2012, lembrando na abertura da matéria um episódio da campanha em que ele seria reeleito presidente:
Pouco antes do segundo turno das eleições presidenciais de 2006, o sujeito viu a manchete do jornal na banca e não se conformou. “Esse aí, só matando!”, disse ao dono da banca, apontando o resultado da última pesquisa Datafolha que apontava a reeleição de Lula.
Passados seis anos desta cena nos Jardins, tradicional reduto tucano na capital paulista, o ódio de uma parcela da sociedade _ cada vez menor, é verdade _ contra Lula e tudo o que ele representa só fez aumentar.
Nem se trata mais de questão ideológica ou de simples preconceito de classe. Ao perder o poder em 2002, e não conseguir mais resgata-lo nas sucessivas eleições seguintes, os antigos donos da opinião pública e dos destinos do país parecem já não acreditar mais na redenção pelas urnas.
(…) Ato contínuo, os derrotados de domingo passado (eleições municipais de 2012) mudaram o alvo diretamente para Lula, o inimigo principal a ser abatido, como queriam aquele personagem da banca de jornal e o antigo líder dos demo-tucanos (JorgeBornhausen que, em 2005, prometeu “acabar com esta raça”).
De lá para cá, como vimos na última campanha presidencial, este ódio só fez aumentar em vez de diminuir, ao contrário do que eu previa então.
O antipetismo se alastrou como uma febre e o índice dos eleitores que declaravam simpatia pelo PT, que era de 29%, em 2013, caiu agora para 9%, segundo o Datafolha, apenas dois pontos a mais do que o PSDB.
Desencantado com o partido que criou há 35 anos e o governo que elegeu quando deixou a presidência, com 80% de aprovação popular, Lula já não esconde as causas do seu sofrimento e, melhor do que ninguém, sabe que estamos nos estertores de um ciclo político. “O PT está velho”, constatou. O pior, para o país, é que o eleitorado não encontra opções: na mesma pesquisa, 67% dos entrevistados declararam não ter preferência por nenhum partido.
“Nós só não podemos errar na política”, costumava repetir Lula aos seus ministros e assessores quando assumiu o poder central em 2003.
Pois foram exatamente as escolhas erradas na política que levaram Lula e o PT à dramática situação em que se encontram hoje, sem saber que rumo tomar. Lula acertou e errou muito, e sabe que já não resolve nada colocar a culpa na imprensa, nos adversários e nas elites, mas não tem a menor ideia de por onde começar a “revolução interna” no partido proposta por ele durante o discurso em que constatou: “Temos que definir se queremos salvar nossa pele, nossos cargos ou nosso projeto”.
Pois é, caro Lula, parafraseando o velho Chico, o tempo passou na janela e só o PT não viu.
Vida que segue.