Na última sexta feira (6/10), a Associação Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa – ACIPG-, no Paraná, mandou publicar nos jornais locais uma carta aberta de apoio ao General Antônio Hamilton Mourão, aquele que, numa conferência em Brasília, ameaçou com a volta da ditadura militar caso a crise econômica-institucional persista no País.
Os 25 sindicatos empresariais que compõem esta associação assinaram o tal manifesto e avisaram em alto e bom som que concordam, plenamente, com ideário de Mourão. Com a arrogância dos que só conseguem enxergar os próprios umbigos “exigiram que o Poder Judiciário cumprisse com sua função de afastar da vida pública essas pessoas que estão acabando com as riquezas do País”.
Ponta Grossa é das muitas cidades do Brasil beneficiadas pelo ótimo desempenho colecionado pela agroindústria, nas últimas décadas. De acordo com o IBGE seu Produto Interno Bruto é da ordem de 6 bilhões por ano. Nela vivem, hoje, 341 mil pessoas e o seu IDH é de 0,763. É a terceira maior cidade do interior paranaense e está entre as cem maiores do País.
Obviamente, a opinião estampada na tal carta dos empresários reflete única e exclusivamente o pensamento de um segmento de Ponta Grossa. Ao longo dos seus 95 anos de existência essa entidade de classe sempre cultivou posições reacionárias.
Basta lembrar que na antevéspera das eleições presidenciais de 2014, esta mesma associação chamou a atenção do País com a estapafúrdia ideia de impedir os beneficiários do programa Bolsa Família de votar. De tão absurda, a sugestão caiu no esquecimento. Antes, porém, foi destroçada pelo bom humor dos pontagrossenses que sempre cultivaram o salutar hábito de se divertirem com suas próprias mazelas.
Exatamente, como a maioria dos municípios que vivem do agrobusiness, os ânimos de Ponta Grossa estiveram muito mais voltados para o que acontece em Chicago, nos Estados Unidos, do que as peripécias de Brasília. É que na metrópole norte-americana funciona a principal bolsa de gêneros do mundo. Do seu pregão saem, diariamente, as cotações da soja, milho e trigo. Justamente, os grãos que garantem a pujança e a alegria dos pontagrossenses.
Em termos ideológicos, Ponta Grossa sempre teve uma posição pendular. Nas eleições presidenciais de 1989, por exemplo, refugou os nomes de Collor, Lula e Brizola para dar a maioria dos seus votos para Guilherme Afif Domingos. Trata-se do eterno presidente da Associação Comercial de São Paulo, que encantou os eleitores locais com seu discurso neoliberal de apoio às pequenas e médias empresas.
O que não a impediu, nos anos 90, de colocar no comando da prefeitura um petista, antes mesmo de Lula chegar ao Planalto. Aliás, Ponta Grossa nunca teve sorte quando buliu com questões políticas de dimensões nacionais. Graças à rigorosa censura que imperava no País nos anos 70, não entrou para o index das “cidades rebeldes” ou “covil de comunistas” como esbravejavam os militares no poder.
No dia 26 de julho de 1973, a Câmara de Vereadores de Ponta Grossa negou a concessão de título de cidadão honorário a nada mais nada menos do que o general-presidente Emilio Garrastazu Médici. Um atrevimento inadmissível. É bom não esquecer que naqueles dias a Nação vivia subjugada a uma das mais ferozes ditaduras da sua história.
Seis meses antes, preocupados com a profusão e o amesquinhamento com que se concediam títulos de cidadão honorários, os vereadores resolveram dar um basta na folia. Suspenderam a honraria por dois anos. Só que um desses edis, ligados à Arena (o partido dos milicos) contrariou a determinação propondo assim mesmo o título para Médici. A maioria seguiu o que havia combinado anteriormente, sem se dar conta da tremenda confusão em que estavam se metendo.
Era uma terça-feira. A sessão noturna nem bem havia se encerrado e blindados do 13º Regimento de Infantaria (um dos quatro quartéis instalados na cidade) começaram a rondar as porta da Câmara Municipal. Um pandemônio!
Rapidinho, o mal-entendido foi desfeito. Revogou-se a lei pretérita, o título foi prontamente aprovado. E, de lambuja a Prefeitura emprestou o nome de Garrastazu Médici para uma das avenidas locais.
Esta história só não foi parar no anedotário político nacional porque a grande imprensa foi proibida de noticiá-la. Por coincidência, o autor deste texto, trabalhava, na época na redação carioca do “Jornal Nacional” da Globo e foi escalado para atender a ligação do agente da Censura Federal.
Sem maiores prolegômenos o censor de Brasília mandou que o então jovem repórter anotasse a seguinte ordem: “está proibida a divulgação de notícias e comentários sobre a negativa da Câmara Municipal de Ponta Grossa, Paraná, em conceder ao presidente, Garrastazu Médici, o título de “Cidadão Pontagrossense”“.
Establishment reacionário é fato corriqueiro em todo o País. Está aí a FIESP que não nos deixa mentir. Só não podemos esquecer que o golpe de 64 começou com o setor empresarial fazendo fila nas portas dos quartéis, implorando para que os canhões viessem para as ruas botar ordem na “balbúrdia que tomou conta do Brasil”.
Lamenta-se apenas por Ponta Grossa. A pujante cidade que quase cassou Médici, agora aparece como uma das pioneiras entre as vivandeiras que pedem a volta da ditadura.
(*) Arnaldo César é jornalista, colaborador deste blog e pontagrossense.
1 Comentário
Olhem aí. Eu não apoio não qualquer intervenção minoritária em nosso país. Que autoridade tenho? Sou uma cidadã, paguei e pago minhas dívidas e meus impostos. Com o suor do rosto, ou melhor, com o conhecimento que adquiri, pois não sou trabalhadora braçal. Os remédios de nosso país são democracia, democracia e democracia.