Sem dúvida deve ter sido algo bastante poderoso, do tipo que só quem tem muita fé ou, quem sabe, diálogo direto com o Onipotente, seria capaz de fazer. Dá até para criar inveja aos mais simples, mesmo aqueles evangélicos que ultimamente se acham acima do bem e do mal, como alguns curitibanos.
Segundo a versão divulgada sexta-feira (16/12) no UOL notícias, o pastor Sillas Malafaia, Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo,
“exaltado, confirmou ter recebido um cheque no valor de R$ 100 mil de um amigo, que também é pastor, depositado diretamente em sua conta bancária. Ele disse que o valor era uma “oferta” por ter orado por uma pessoa, em 2011“.
Afinal, por que razões procuradores, juízes e policiais, responsáveis pela Operação Timóteo, que investiga fraudes nas cobranças de royalties das mineradoras, desconfiam que uma doação de cunho religioso seja coisa do diabo – ops! -, da corrupção? Como o pastor afirmou no Twitter, ele recebeu ‘uma oferta de R$ 100 mil, de um membro da Igreja do meu amigo pastor Michael Abud’. Tudo explicado com a oração feita em 2011.
“Não sei e não conheço o que ele faz. Tanto é que o cheque foi depositado em conta. Por causa disso sou ladrão? Sou corrupto? Recebo ofertas de inúmeras pessoas”, desabafou Malafaia, acrescentando: “Quer dizer que se alguém for bandido e me der uma oferta, sem eu saber a origem, sou bandido?”.
A questão do valor depositado, ao que parece, não foi o que mais incomodou a Malafaia, mas sim a forma como a Polícia o procurou, com um mandado de condução coercitiva. Tal e qual ocorreu em vários casos, inclusive com Lula.
“Agora, eu pergunto: como é que um juiz faz uma condução coercitiva? Não sou bandido, não estou envolvido com corrupção, não sou ladrão, estou indignado, que Estado de direito é esse?”
Neste ponto, ele tem toda a razão. O Estado Democrático de Direitos tem que valer para todos. Não pode haver tratamentos diferenciados. Assim como todos os que se envolveram em possíveis falcatruas e/ou crimes devem passar pelo crivo de uma investigação – de acordo com as leis e normas constitucionais – também se deve protestar quando desrespeitam as normas legais, seja com quem for. Ainda que com quem aplaudiu quando as normas legais foram desrespeitadas com seus “inimigos/adversários”. Como ocorreu com Malafaia anteriormente.
O curioso é quem saiu na defesa dele, não foram seus aliados políticos, aqueles que ele apoiou nas eleições e no golpe do impeachment que derrubou a presidente eleita legitimamente, Dilma Rousseff. A voz que se levantou contra mais esta ilegalidade foi justamente do último ministro da Justiça do governo que ele ajudou a derrubar, o subprocurador-geral da República, Eugênio Aragão.
A condução coercitiva é mais uma “inovação da Lava Jato” que vem sendo adotada por diversos juízes, ainda que com algum tipo de diferença nas decisões. O ex- ministro Carlos Gabas, por exemplo, por determinação do juiz da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, Paulo Bueno de Azevedo, teve a opção de acompanhar a polícia ou marcar data posterior para seu depoimento, com a presença de advogados. Até porque, como lembrou Bueno de Azevedo, o investigado tem direito ao silêncio.
Já Sérgio Moro e outros juízes não dão opção. Levam o “convidado” na marra. Como ocorreria com Malafaia, se ele estivesse no Rio, onde foram procurá-lo. E com Lula e vários outros. Na época em que Lula foi a vítima desta arbitrariedade, Malafaia não protestou, ao contrário, elogiou. Como lembrou na sexta-feira o Brasil 247 em MALAFAIA COMPROVA: PIMENTA NO DOS OUTROS É REFRESCO
Esta prática, ilegal – pois os códigos não a preveem – virou regra sem que os tribunais superiores se manifeste especificamente a respeito. Tampouco o Legislativo modificou qualquer lei para dar garantia a este método. Ela surgiu através da interpretação do procurador da República Vladimir Aras, Respalda-se na tese que uma condução coercitiva é menos gravosa do que as prisões temporárias ou preventivas. Mas não está prevista em lei. É algo “ajeitado”, que tem virado prática.
Por isso é que no entendimento de Aragão, como consta do artigo postado no blog Conversa Afiada, de Paulo Henrique Amorim, ele indica que o pastor Malafaia foi mais uma vítima da “da meganhagem”. Abaixo transcrevo o artigo, cujo original foi editado na sexta-feira (16/12) no Conversa Afiada.
A vida tem dessas coisas. O pastor Silas Malafaia que tanto estrebuchava contra nós, os “esquerdopatas”, contra nós, os inimigos da decência por criticarmos os abusos do complexo policial-judicial, foi conduzido coercitivamente sem antes ter sido regularmente intimado, em apenas mais uma das aberrações processuais em franco confronto com a norma posta. Vemo-nos, agora, na contingência de defender Silas Malafaia. Quem diria!
O clamor das ruas desconhece essas particularidades do direito penal. Infelizmente, sob sua perspectiva, ele é sempre bom para os inimigos e profundamente injusto para os amigos. Pois, para quem defende o estado democrático de direito, não pode haver dois pesos e duas medidas: um abuso contra Silas Malafaia vale tanto quanto um abuso contra Lula. Ambos, independentemente de suas orientações políticas, têm o mesmo direito à dignidade, de não serem expostos como troféus pela meganhagem persecutória e de expressarem com veemência seu protesto. Sem mais nem menos.
É vergonhoso que no Brasil de 2016, depois do aprendizado democrático intenso dos últimos treze anos, ainda tenhamos que ver pessoas embrutecidas baterem palmas para o arbítrio, seja de que lado for.
Talvez, quem saiba, a lição do próprio padecimento traga alguma luz ao eloquente pastor e o faça ver que o direito de Chico deve ser o mesmo direito de Francisco”.
*Eugênio José Guilherme Aragão – jurista brasileiro. Membro do Ministério Público Federal desde 1987, foi Ministro da Justiça no governo Dilma Rousseff.
4 Comentários
Poderosa reza. Podia dar umas aulinhas ao Arcebispo do Rio, pois para rezar pela PEC da morte junto com o Temer, precisou de ajuda do Arcebispo de SP, mesmo sendo a CNBB contrária à maldita PEC.
Líderes religiosos fracos e hipócritas. Com certeza um dia, responderão pelos seus atos contra o povo de Deus.
Pois é. Quando é contra ele é ilegal. Mas quando foi o Lula, o juiz estava certo. Vai saber o que se passa na cabeça deste mercador da fé.
Esse sujeito de pastor evangélico não tem nada,é do time de Eduardo Cunha.
Podridão na PGR: Superfaturamento e propina na construção da suntuosa sede em Brasília JAMAIS FORAM APURADOS:
http://justificando.cartacapital.com.br/2016/12/19/o-inspetor-seu-pau-e-seu-dilema/