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Marcelo Auler, de Curitiba

Comentário irônico nas redes sociais.

Em uma tirada irônica, enviada por uma das minhas filhas, Alexandre França (que não conheço), postou nas redes sociais um resumo do que ocorreu na quinta-feira no Supremo Tribunal Federal; “Por 6 a 5 STF decide que sabe ler”. Naquela sessão histórica, seis ministros fizeram respeitar aquilo que, há 31 anos, 559 parlamentares (72 senadores e 487 deputados federais) decidiram escrever na Constituição Cidadã: a presunção de inocência vale até o trânsito em julgado de uma sentença condenatória.

Foi, sem dúvida, um passo importante para retirar o país dessa insanidade em que submergiu nos últimos anos. Falta, ainda, os ministros da Suprema Corte voltarem a enxergar direito, sem travas nos olhos, para perceberem os desmandos cometidos pela Força Tarefa da Lava Jato de Curitiba, capitaneada pela dupla Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. Somente assim poderão rever decisões tomadas ao arrepio da lei e debaixo de fortes manobras ilegais, inclusive as condenações impostas por Moro e mantidas pelo TRF-4.

Durante a interminável fala dos ministros na quinta-feira foi possível perceber que, pelo menos da parte de três deles, a visão que estava embaçada começa a clarear com relação aos métodos nada republicanos utilizados por Moro, como juiz, Dallagnol e sua tropa no Ministério Público Federal (MPF) do Paraná e os policiais federais de Curitiba, através de delegados como Igor Romário de Paulo, Erika Mialiki Marena e Marcio Adriano Anselmo.

O mais enfático nas críticas à Força Tarefa, tal como têm ocorrido há tempos, foi Gilmar Mendes. Ele, inclusive, estendeu-as à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e à ONG Transparência Internacional (TI), por conta das críticas de que a “atuação recente desta Suprema Corte estaria afastando o Brasil da realização de uma agenda internacional anticorrupção”.

As críticas da OCDE versaram sobre a aprovação da Lei de Abuso de Autoridades. Ao considerar descabidas tais críticas, Mendes alertou:

Gilmar Mendes voltou a criticar fortemente a Força Tarefa de Curitiba (Foto: Rosinei Coutinho -SCO/STF)

É inconteste que o que aconteceu no Brasil nos últimos anos foi justamente a contaminação dos órgãos de persecução estatal por influências políticas“.

Após estender-se nos comentários sobre o organismo internacional e as próprias diretrizes por ele traçadas para o combate à corrupção, Mendes voltou à ironia:

Aqui, clamo para que a própria OCDE ensine ao Brasil como combater a corrupção que é cometida pelos próprios agentes encarregados da tarefa de ‘lutar contra a corrupção’.”

Ao falar da Transparência Internacional, o ministro mostrou o envolvimento dos membros da ONG por aqui – Transparência Brasil – com os suspeitos movimentos dos procuradores de Curitiba, notadamente em torno de um fundo de R$ 2,6 bilhões repassados pela Petrobras a partir de uma negociação com autoridades norte-americanas.

Nesse acordo, o MPF indicou a Transparência Internacional como uma das entidades a compor o chamado “Comitê de Curadoria Social”, que ajudaria na constituição da fundação do Ministério Público que iria gerir os recursos. Novamente, a falta de clareza nas regras do acordo impede-nos de saber se havia alguma forma de remuneração à TI“.

Mendes ainda relembrou entendimentos entre Dallagnol e Bruno Brandão, representante da Transparência Internacional no Brasil, para que a ONG bancasse a viagem de procuradores venezuelanos ao Brasil em missão não oficial, sigilosa. Consta do voto:

Nos termos do diálogo de 28 de agosto de 2017, Deltan perguntava: “a TI bancaria a hospedagem e alimentação de promotores da Venezuela para passar uma semana conosco, de modo confidencial, trabalhando nas investigações da Venezuela?”. O Procurador deixava claro que essa solicitação era feita por debaixo dos panos: “Não comente com ninguém. Se for necessário de autorização superior, adiamos pra ver no momento necessário e da forma certa”.”

Após recorrer mais uma vez às ironias com frases que já pronunciara antes – “A Força Tarefa tem melhores publicitários do que juristas” e “no Brasil, lutar contra a corrupção dá lucro” – acrescentou:

Portanto, acredito que as avaliações feitas pela Transparência Internacional no Brasil acabam sendo contaminadas pela parcialidade com que os representantes da organização têm investigado os episódios recentes de corrupção no país“.

Surpreendentemente, porém, durante a manifestação de Mendes, Dias Toffoli o interrompeu com comentários críticos à pretensão dos procuradores da Lava Jato de Curitiba em usar os R$ 2,6 bilhões que receberiam da Petrobras, garças a entendimentos com autoridades norte-americanas. Foi auxiliado por Alexandre de Moraes, o ministro responsável pela suspensão do acordo que a juíza Gabriela Hardt homologou e que daria a ONG a ser criada pelos procuradores metade deste valor.

Outra metade se destinaria aos chamados “pequenos acionistas” da petroleira brasileiro, garantindo a título de honorários uma boa parcela ao advogado Modesto Carvalhosa, que trabalhou em conjunto com a Força Tarefa, como revelaram os diálogos publicados pelo The Intercept.

Amarras na Força Tarefa

A sessão de quinta-feira do STF, mais do que rever a posição que autorizava o início do cumprimento de uma pena privativa de liberdade após julgamento de apelação por tribunal de segunda instância – decisão que beneficiará cerca de cinco mil presos, entre os quais o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-ministro José Dirceu e outros presos da Lava Jato – mostrou para muitos que no plenário começa a se formar uma maioria que pretende enquadrar a Força Tarefa da Lava Jato. Notadamente a de Curitiba.

Gleisi à militância: pressão para o STF anular as condeações impostas por Moro (Foto: Ricardo Stuckert)

Sinal de que, aprofundando o comentário do Alexandre França reproduzido na epígrafe desta postagem, além de aprender a ler o que diz a nossa Constituição, o STF pode estar voltando a enxergar o que fizeram os membros da Força Tarefa da Lava Jato comandada por Moro e Dallagnol.

Em Curitiba, aqueles que mesmo à distância acompanham os bastidores do Supremo, estão confiantes que, ainda em novembro, a 2ª Turma do STF apreciará e acatará o Habeas Corpus apresentado pela defesa de Lula questionando a falta de isenção por parte de Moro e da Força Tarefa da Lava Jato. Acreditam, até, que a suspeição de Moro pode ser decidida por quatro dos cinco ministros da turma, o que incluiria Cármen Lúcia votando da mesma forma que Celso de Mello, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. A verificar.

Como disse a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, ainda na noite de quinta-feira, à militância petista que a 580 dias permanece na Vigília Lula Livre, a briga por este Habeas Corpus será a próxima batalha a ser travada. Demonstrar claramente ao STF a necessidade de anular as condenações impostas ao ex-presidente em processos conduzidos sem a imparcialidade e isenção que deveriam ter.

A presidente do PT, que à tarde tinha estado com Lula juntamente com o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto, e de um dos coordenadores do MST, João Carlo, voltou à Vigília às 22h00 para comemorar com cerca de 50 militantes que ali estavam a decisão do STF. Foi uma comemoração comedida, para evitar transtornos à vizinhança. Ainda assim a Polícia Militar foi chamada, mas os policiais nem desceram do carro. Houve entendimento e logo o silêncio voltou a se impor na região.

Nesta sexta-feira (08/11), porém, a mobilização em Curitiba é pela libertação de Lula. Advogados do ex-presidente estão reunidos com ele desde cedo traçando os planos. Ao entrar na Superintendência, Cristiano Zanin Martins anunciou que proporia a Lula “o protocolo imediato de um pedido ao juízo da execução para que ele saia da prisão com base no julgamento de ontem do STF, sem prejuízo de continuarmos a priorizar o HC da suspeição”. Pedido protocolado no final da manhã.

Tudo, portanto, ainda depende da liberação do preso, a cargo da juíza da Vara de Execuções Penais, Carolina Lebbos, a quem caberá emitir o Alvará de Soltura. Informações de bastidores dão conta de que a juíza pode querer despachar logo esse processo e livrar-se de vez do preso político que mais lhe deu desprazeres. Mas ela, também pode procrastinar uma decisão, por exemplo, abrindo vistas ao Ministério Público do pedido feito pela defesa de Lula.

Desde cedo militantes se aglomeram novamente à frente do prédio da Superintendência Regional do DPF no Paraná, no bairro de Santa Cândida, com o intuito de pressionarem pela pronta libertação de Lula. A movimentação, bem como a possibilidade de libertação atraiu também grande quantidade de jornalistas.

Os planos são de que ao deixar o prédio o ex-presidente percorra os menos de 50 metros da Rua Professora Sandália Monzon que separam o portão principal da superintendência da Vigília Lula Livre, para, finalmente, conhecer aqueles que desde a sua prisão se revezam em um plantão diário na sua defesa. Um nítido sinal de resistência.

Lula, que na quinta-feira recebeu a visita dos filhos Fábio e Lurian, do neto mais velho Thiago e da namorada, a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, evitou fazer planos antecipados. Depois que o STF encerrou a sessão ele não teve contatos com ninguém além dos carcereiros. Por isso, as conversas ficaram para esta sexta-feira.

Sabe-se, porém, que além de visitar a vigília ele poderá ficar em Curitiba para se encontrar com a rede de amigos que durante todo o seu período de prisão o apoiou nos bastidores.

Turma que lhe levava comida, material de higiene, roupas limpas – a cada entrevista ele sempre apareceu bem trajado, com ternos e camisas passadas – além de outras necessidades do dia a dia. Advogados que compareceram diariamente à sua cela, de segunda a sexta-feira, durante estes 580 dias, inclusive com pen-drives contendo noticiário do dia e portando as cartas de militantes – consta que são mais de 35 mil.

Provavelmente ele ainda optará por passar uma noite livre com a Janja, sua nova namorada que, na quinta-feira, após o resultado da votação, postou nas redes sociais que iria buscá-lo, como mostra a ilustração ao lado.

Ao mesmo tempo estão programando o retorno dele a São Bernardo, sua residência, com uma passagem obrigatória pelo Sindicato dos Metalúgicos do ABC, de onde Lula saiu na noite do sábado, dia 7 de abril de 2018, para se entregar à Polícia Federal, um dia depois da data imposta pelo juiz Moro.

Prepara-se ali outra grande recepção do líder operário ao seu berço sindical, a casa que lhe lançou no mundo político. Um grande retorno.

 

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