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Juiz anula sua ridícula sentença contra Lula
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Marcelo Auler

Ao desprezar o parecer do Ministério Público e assinar uma sentença na qual declarou a “nulidade do ato administrativo que condecorou o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva , em 23 de agosto de 2017” com o título de Doutor “Honoris Causa” da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL), o juiz da 4ª Vara Cível de Arapiraca (AL), Carlos Bruno de Oliveira Ramos, ganhou seus quinze minutos de fama. Ao fazê-lo, atraiu as atenções para o processo que, nas suas 100 páginas, revela o desleixo como o feito foi tratado na Vara que preside. Nos três anos de tramitação da ação popular, o caso ficou parado em alguma prateleira por nada menos que 30 meses.

A sentença mostra-se ridícula, nem tanto pela sua parca e fraca fundamentação, mas por tentar cassar um título aprovado pelo Conselho Superior da UNEAL, em março de 2012, entregue ao ex-presidente cinco anos depois, em agosto de 2017. Logo, a decisão, mesmo que não seja revista, mostra-se inócua, por não ser possível retirar uma premiação já oficializada. Ainda que fosse possível ao magistrado mandar um oficial de Justiça recolher o diploma na casa de Lula, o título conferido poderá continuar sendo invocado. Será mais um, entre os 35 que o ex-presidente recebeu, 14 deles de universidades no exterior, como mostrou o Brasil 247. A diferença é que o da UEAL gerou uma cassação que acabará dando maior visibilidade à premiação.

Muito provavelmente porque estava interessada em uma liminar que impedisse a entrega da premiação em agosto de 2017, a própria autora da Ação Popular, a advogada Maria Tavares Ferro, candidata não eleita a deputada federal pelo partido Novo em 2018, abandonou o caso e não voltou a se manifestar nos autos. Pelo que se depreende, seu interesse ao ingressar com a ação popular em 22 de agosto era impedir a festa que acabou ocorrendo no dia seguinte, quando a caravana do ex-presidente passou por Arapiraca, cidade a 132 quilômetros da capital alagoana.

Três anos de tramitação: 30 meses parado

O juiz Carlos Bruno de Oliveira Ramos acabou deixando transparecer no processo o desleixo da atuação da sua |Vara (Foto: Caio Loureiro Ascom/TJAL)

O que o juiz Oliveira Ramos, certamente não previu é que sua sentença, além de inócua, acabaria por revelar a maneira relapsa como o processo circulou na 4ª Vara Cível de Arapiraca (AL). Ao atrair as atenções para o caso, a sentença acabou revelando o desleixo com que a ação popular foi tratada.

A leitura dos Autos nº: 0704999-51.2017.8.02.0058 mostra que ele permaneceu longo tempo parado nas prateleiras da Vara, hoje comandada pelo magistrado Oliveira Ramos. Nestes pouco mais de três anos de tramitação do feito, os autos ficaram sem receber qualquer manifestação por aproximadamente 30 meses. Além disso, foram necessários mais 77 dias para emitirem um simples mandado de citação para que a UNEAL tomasse conhecimento da decisão.

A liminar pedida na ação popular visava a suspensão da entrega da comenda. Foi negada por um antecessor de Oliveira Ramos, o juiz pelo juiz Giovanni Alfredo de Oliveira Jatubá, em 22 de agosto de 2017, mesma data em que a ação foi impetrada. Ele alegou que o argumento alinhado pela autora – “o uso eleitoral do evento, vez que o ex-presidente possivelmente será candidato nas eleições/2018” -, deveria ser avaliada pela Justiça Eleitoral, “que tem competência para presidir pleitos eleitorais em todos os seus aspectos, sejam anteriores ou posteriores ao pleito”.

O segundo argumento apresentado pela advogada que, ao contrário de Lula, virou candidata na eleição de 2018, era que a premiação deveria ser anulada “em função da impessoalidade e desvio de finalidade do ato administrativo”. Na inicial ela juntou apenas a Resolução nº 004/2012, que outorgou a comenda. Para a resolução existir, porém, foi necessário a tramitação de um processo administrativo – nº 4104-2117/2011 – e, ao final dele, a aprovação por pelo menos dois terços do Conselho Superior da Universidade.

Esse processo administrativo, contudo, não foi levado à apreciação do juízo, o que fez Oliveira Jatubá recusar o pedido de liminar. Viu-se na “impossibilidade da verificação da natureza, dos fundamentos, do rito processual administrativo adotado para escolha do homenageado ao título”. Após isso, o magistrado intimou Lula e a Universidade a se manifestarem nos autos.

As duas partes apresentaram suas argumentações em 23 e 25 de outubro, respectivamente. A defesa de Lula, a cargo do escritório Teixeira Martins Advogados, alegou até mesmo que não cabia o ex-presidente aparecer como polo passivo na ação. Afinal, ele não participou da decisão da outorga do prêmio, tampouco a solicitou. Apenas foi recebe-la. Ainda assim, Cristiano Zanin Martins e os demais advogados se estenderam por 31 laudas com argumentações variadas para no fim proporem que a demanda fosse extinta sem resolução do mérito.

Já o procurador da UNEAL, Sérgio Ricardo Vieira Leite, ao defender a moralidade e legalidade do ato, lembrou que àquela altura, “já se passaram mais de cinco anos do ato que resolveu conceder o título honorífico. Apesar de todo esse tempo, somente agora a autora ingressa com Ação Popular para sustar os efeitos do ato administrativo de concessão do título honorífico”. Com o argumento da data da decisão também afastou qualquer viés eleitoral na premiação, pois à época o governo de Dilma Rousseff estava iniciando e ainda teve uma segunda eleição em que ela foi reeleita.

Juiz ameaçou, mas não cumpriu

Maria Tavares ingressou com a ação, dizendo que Lula estava em campanha e depois virou candidata pelo Novo. Não se elegeu, (Foto: reprodução)

O argumento principal, porém, foi “que as Universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial (art. 207 da Constituição Federal), ou seja, não deve haver qualquer interferência externa no funcionamento das mesmas. A aprovação da entrega do título de doutor “honoris causa” se deu há longínquos cinco anos e dentro do que reza o regimento interno da UNEAL. A aprovação se deu dentro da legalidade e respeitando a autonomia universitária consagrada constitucionalmente. Não há que se falar em desobediência aos princípios administrativos insculpidos na Constituição”. Ele, tal como Zanin, defendeu que a ação fosse “extinta sem resolução do mérito”. Alegou “ausência de um dos requisitos da ação – interesse”.

Após essas manifestações, em 23 de novembro de 2017, o juízo abriu vistas das duas manifestações para a autora da ação popular, Maria Tavares. Seu prazo venceu em 19 de dezembro, sem que ela falasse no processo. O caso ficou simplesmente parado na 4ª Vara Cível por mais de ano – de novembro de 2017 a janeiro de 2019 -, quando então o juízo encaminhou-o para o Ministério Público. Coube ao promotor Rogério Paranhos Gonçalves constatar o óbvio, em despacho datado de 17 de janeiro de 2019:

“Em análise, constata-se que a solenidade de concessão do título sob
comento foi realizada, conforme amplamente noticiado pela imprensa, sendo fato notório, nos termos do artigo 374, I, do Novo Código de Processo Civil.

Em sendo assim, e por entender que a presente ação perdeu seu objeto,
posiciono-me no sentido da extinção do processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, VI, do Código acima indicado”.

Em 22 de janeiro, novamente abriu-se prazo para a autora, Maria Tavares, falar sobre a posição do promotor. Mas ela se calou. O processo permaneceu na prateleira da 4ª Vara.

Um ano depois, em 15 de janeiro de 2020, o juiz Oliveira Ramos voltou a intimar a autora. No despacho pedia que ela “manifeste seu interesse no prosseguimento do feito, no prazo de 5 (cinco) dias, diante da alegada perda superveniente do objeto/interesse processual pelo Ministério Público”. O juiz ainda a alertou de que “a ausência de resposta acarretará a extinção do feito por abandono processual”.

Embora intimada em sua residência, como demonstrou o Aviso Resposta do Correio, ela nada juntou ao processo. Permaneceu calada e a ação popular, por sua vez, permaneceu parada na Vara por mais cinco meses. Somente em 8 de junho houve a certificação pelo cartório de que a autora não se manifestou.

Ao sentenciar o caso, o juiz esqueceu o que havia dito em janeiro – “a ausência de resposta acarretará a extinção do feito por abandono processual”. Mesmo diante do silêncio de Maria Tavares, apesar das manifestações da defesa de Lula e do procurador da UNEAL pela extinção do feito, desprezando ainda a posição do Ministério Público, Oliveira Ramos decidiu enfrentar o mérito e apoiou a tese da autora sem qualquer fundamentação mais detalhada..

Em uma decisão com apenas 457 palavras, incluindo a data e local em que se deu o ato, espalhadas por 42 linhas que se dividem em 21 parágrafos, em momento algum ele enfrentou as questões levantadas pela defesa de Lula e o procurador da universidade. Passou bem longe da discussão em torno da “autonomia universitária”.  Não há fundamentação, por menor que fosse. Também não abordou a presunção de inocência. Mais curioso ainda, tendo sentenciado em 2020 – dois anos após a eleição da qual Lula sequer participou, pois foi impedido – o juiz ainda apelo para o “fim político-eleitoral” do evento realizado em agosto de 2017.

Ele endossou a tese de que “não é razoável nem atende à moralidade administrativa conceder honraria a alguém condenado judicialmente e que ainda responde a outras ações penais”. Sem explicar direito, considerou que “há hostil violação da regra administrativa na aprovação do título por desvio de finalidade revelador de ofensa à moralidade administrativa, além de propiciar manifestação de fim político-eleitoral na concessão do título”. Foi o que considerou suficiente esclarecer para “para declarar a nulidade do ato administrativo que condecorou o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva em 23 de agosto de 2017, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil”.

Apesar de sentenciado em 23 de julho, o processo continuo a dormitar nas prateleiras da 4ª Vara. Em nova demonstração de desleixo, falta de zelo ou negligência, somente em 9 de outubro, ou seja, 77 dias depois é que foi expedido o mandado de intimação para a Universidade tomar ciência da sentença. Só então sua decisão tornou-se conhecida e ele ganhou seus quinze minutos de fama.

 

 

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1 Comentário

  1. Fernando Cravo disse:

    Mais um juizeco… deveria ser demitido.

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