Crítico à intervenção militar, em especial à política de combate à violência, o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, quer que a “academia” crie um “espaço aglutinador de todas as iniciativas dos diversos setores sociais para acompanhar, monitorar, reunir e analisar informações da ação dos militares na área de segurança”.
“Nós entendemos que a UFRJ, como uma instituição que produz conhecimento, uma instituição que forma pessoas de uma maneira muito sofisticada, não pode estar alheia a este movimento que está em curso na sociedade em busca de políticas que realmente enfrentem o problema crucial, legítimo e que atormenta a população do estado do Rio de Janeiro, que é o problema da violência e insegurança”, disse ele.
Leher tem a convicção de que “a linha de trabalho que concebe a segurança pública como uma lógica de guerra, com uma lógica militar, não é resposta e isso somente vai agravar os problemas de violência. Nós vimos em outros países, como na Colômbia, no México. Enfim, a Universidade tem compromisso para buscar soluções no que diz respeito às políticas que possibilitem controle do tráfico de armas, controle dos mercados financeiros, monitoramento do mercado financeiro de lavagem de dinheiro, em suma, os grande motivadores do crime, que de fato produz muita insegurança, muita dor muita tristeza, na população do Estado do Rio de Janeiro”.
Leia e ouça a entrevista do reitor Roberto Leher ao Blog, na qual ele detalha seu ponto de vista sobre o assunto e o papel que a UFRJ quer ter diante desta Intervenção Militar em: “Reitor da UFRJ: essa lógica de segurança faliu“.
Depois de reunir, na noite de segunda-feira (05/03) vários segmentos da própria UFRJ e representantes dos movimentos sociais, ele participará, nessa quinta-feira (08/03), de um encontro com reitores de instituições de ensino no Rio para debater a proposta. A reunião será na PUC-RJ. Sendo aceita a proposta, deverão emoldurar a forma de atuar.
O reitor Leher, nesta quinta-feira, após a publicação da reportagem no Jornal do Brasil, esclareceu que não se trata de monitorar a figura do general em si:
“Não se trata da pessoa do general, isso é irrelevante. O problema não é a pessoa do general. Mas o processo da intervenção e da ação militar nos territórios das favelas e, particularmente a difusão de uma doutrina de segurança que não se coaduna com os direitos fundamentais”.
Na reunião ele e os demais participantes partiram de uma certeza. Nenhum movimento social individualmente conseguirá dialogar com o comando militar instalado no Estado. Na universidade se considera que o próprio general Braga Netto demonstrou, na entrevista coletiva que concedeu na terça-feira retrasada (27/02), não estar muito aberto ao diálogo.
A reunião dos reitores na PUC não será pública. Entre o encontro de segunda-feira à noite e a reunião dos reitores na tarde desta quinta-feira surgiu a entrevista do general Braga Netto à GloboNews. Nela, ao contrário do que pareceu na primeira coletiva dada pelo interventor, Braga Netto abriu as portas ao diálogo, justamente ao comentar os diversos “Observatórios” criados para acompanhar os passos da intervenção e as ações dos militares nas comunidades. Isso certamente facilitará o diálogo com esse grupo que o reitor da UFRJ propôs criar.
A saída discutida na reunião de segunda-feira, pode ser a proposta apresentada pela professora da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, Carol Proner:
“Neste primeiro momento temos que constituir uma “autoridade” legitimada pela sociedade civil e pela comunidade acadêmica. Uma autoridade que, para ser efetiva, deve ser bastante representativa e respaldada. Um “reitor”, no sentido da palavra, um regente, um lugar de autoridade, uma pessoa ou um conselho de reitores e entidades da sociedade que se proponha, como tal, a servir de interlocutor junto à autoridade interventora”, explicou.
Na visão dela é uma tarefa imediata, até para que se tenha um canal junto aos militares que, como tem sido difundido, a contragosto receberam uma missão espinhosa do presidente da República, cujo interesse foi o de melhorar sua popularidade. Algo bastante duvidoso. Carol explica a urgência:
“Uma vez que os planos de intervenção federal-militar não são conhecidos, os responsáveis não pretendem contar previamente o que farão para evitar críticas – a exemplo do que aconteceu na Maré – o resultado é a imediata desconfiança e o repúdio em geral pela percepção de violência sistêmica e o papel repressor do Estado. Dado que as ações já estão acontecendo e estamos recebendo as primeiras denúncias de violência, que ocorreram já no marco da intervenção, é urgente que se constitua um interlocutor que centralize as demandas, as críticas, as queixas e as denúncias junto ao Estado”
E por que a universidade? Na visão de Leher, por ser também sua missão proteger os Direitos Humanos, favorecer a vida, acompanhar a situação de vida das pessoas que moram nas favelas.
“A universidade tem um compromisso ético com todos aqueles que vivem do próprio trabalho, que são expropriados. Nós temos sempre uma dedicação muito especial para as questões sociais, relativa à situação, perversa, absurda, de desigualdade social que temos em nosso país”, justificou.
Como detentora do conhecimento, detentora de estudos e pesquisas a respeito das causas e motivações da violência no estado, na proposta de Leher e de Proner, a universidade assumiria um papel que outrora entidades civis e movimentos sociais assumiram no passado.
O Viva Rio – entidade com representantes da sociedade fluminense -, por exemplo, na exerceu este papel de dialogar e cobrar das autoridades, quando de intervenções militares anteriores. Hoje, já não age com a mesma desenvoltura.
O movimento que a UFRJ está desencadeando deverá englobar diversas outras iniciativas que já surgiram, como os Observatórios criados, entre outros, na Câmara Municipal e na Assembleia Legislativa; a Comissão Popular da Verdade que tem o respaldo da Caixa de Assistência dos Advogados do Rio de Janeiro – CAARJ. Engloba ainda representantes e comissões criadas por tradicionais entidades civis como a Federação das Associações de Favelas do Rio de Janeiro – FAFERJ, o Movimento Humanos Direitos (MHUD) que reúne artistas e intelectuais – as duas presentes na reunião – as Defensorias Públicas do Estado e da União no Rio de Janeiro, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.
Enfim, diante do fato consumado com relação à intervenção, a ideia é organizar a sociedade para interferir de alguma forma – não apenas com críticas e denúncias, mas também apontando outras saídas – para esse enfrentamento da violência, como o reitor Leher expôs na entrevista que deu ao Blog. Sempre dentro de uma linha de não gerar mais violência. Tampouco sacrificar a população carente das comunidades, espaços vistos pela intervenção como áreas hostis.
“É urgente, tático e humanitário que as entidades do Rio de Janeiro sejam capazes de se auto-organizar para constituir o interlocutor da intervenção. E a UFRJ está chamando para si essa responsabilidade o que, dado seu papel histórico em defesa da democracia e dos Direitos Humanos, é excelente”, defende Carol.
Mobilização da Sociedade – A mobilização social em torno desta intervenção tem tido um efeito multiplicador. No próximo domingo, 11 de março, às 11H00, o professor Michel Misse dará uma aula aberta para debater a intervenção em si e o papel dos militares no combate à violência. Trata-se de uma iniciativa de movimentos que defendem as eleições diretas já como solução para a crise política do país. Será na Praça Serzedelo Correia – Copacabana (Quadra da praia, entre as ruas Hilário de Gouveia e Siqueira Campos).
(*) Matéria compartilhada com a edição desta quinta-feira (08/03) do Jornal do Brasil.
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1 Comentário
Esse não foi o cara que deixou o Museu Nacional pegar fogo? Não sabe cuidar nem da instituição que dirige e acha que vai ser útil se metendo no que não entende.