Na sexta-feira (16/09) o governo do presidente golpista Michel Temer anunciou que não irá cumprir o acordo firmado entre a presidente eleita e deposta por ele e sua trupe, Dilma Rousseff, com os Defensores Públicos da União, uma categoria que conta hoje com 620 defensores, espalhados em todo o país, servidores, muito além das necessidades da população de baixa renda – são cerca de 14o milhões de pessoas na linha de pobreza que quando necessitam recorrem a uma defensoria.
Basta ver as filas que se formam em todas as defensorias públicas espalhadas pelo país, sejam da união ou dos estados. Ou seja, mais uma vez o governo golpista atingiu os mais necessitados e não empresários, políticos corruptos ou outros que têm posse e bancam grandes escritórios de advocacia.
Na verdade, o acordo que o presidente golpista, um professor de Direito Constitucional, que gaba-se de conhecer e seguir a Carta Magna, deixará de cumprir era apenas para fazer valer o que manda a Constituição de 1988: equiparar os defensores ao Ministério Público Federal. Um defensor hoje tem salário inicial de R$ 17.330, enquanto um procurador do Ministério Público Federal (inclui procuradores da República, do Trabalho, do Distrito Federal e da Justiça Militar), no início de carreira, ganha R$ 25.260,20.
Os R$ 17 mil , explique-se é o salário de mais de 500 defensores, a imensa maioria porque não há na Defensoria estrutura de carreira que permita a promoção rápida como em outras carreiras. Além disso, o número de vagas em carreira de primeira categoria e especial, aqueles que atuam respectivamente na segunda instava e nos tribunais superiores, é muito pequeno. A maioria recebe os R$ 17 mil brutos que com descontos, cai para R$ 12 mil. A categoria, ao contrário do judiciário e do Ministério Público, não tem auxílio moradia e goza de apenas 30 dias de férias ao ano.
O reajuste que Temer vetou, não seria pago de uma única vez. O aumento seria escalonado em quatro etapas até janeiro de 2018. “O governo usou a DPU, órgão de defesa dos pobres e minorias, como boi de piranha para o discurso de ajuste fiscal. A DPU foi o único veto! A mensagem de veto diz que a valorização da DPU é contra o interesse público. Veja bem, é contra o interesse público fortalecer o órgão de defesa do povo? É um contrassenso! O ajuste fiscal também não cola, já que nosso reajuste é o que tem menor impacto (0,01% dos R$ 67 bilhões) e não vincula os governos estaduais”, desabafa um defensor.
Ao vetar este aumento e descaracterizar o serviço da DPU afirmando que a valorização dela é contra o serviço público, na verdade, os golpistas que ocupam o Planalto desconhecem o que faz um destes servidores. Um exemplo claro ocorreu nesta sexta-feira(16/09) e neste sábado (17/09) com presos da Operação Hashtag. Do total de 20 investigados nesta operação, que tem por objetivo impedir a criação de uma suposta célula do Estado Islâmico no Brasil, 15 suspeitos são assistidos pela Defensoria Pública da União de Curitiba. A defensora Rita Cristina de Oliveira assiste a 14 e o seu colega João Nunes Morais Junior mais um.
Mas o serviço não envolve apenas os dois. Como os 15 presos estavam em Campo Grande (MS), durante 60 dias, coube ao defensor Silvio Rogério Grotto dar assistência aos presos, indo vê-los na penitenciária Federal. Atendeu até mesmo quem tem advogado particular, mas que ficam em outros estados. Com base no que ocorreu neste final de semana, a defensora Rita Cristina de Oliveira escreveu o texto abaixo que mostra que um defensor cuida muito mais do que da simples defesa de um acusado.
Provavelmente quem concordou com o veto do Presidente ao PLC 32 não sabe, não precisa e acha que nunca vai precisar.
Conhecido como projeto de lei de reajuste dos defensores públicos, mas que na verdade é nada mais que um instrumento legal que dá cumprimento parcial ao mandamento do art. 134, parágrafo 4, da Constituição Federal. Por ele, se equipara a carreira dos defensores à da magistratura e do ministério público, como manda a Constituição. Mas, o projeto foi integralmente vetado pelo professor constitucionalista, atual presidente Michel Temer. O fundamento do veto? A dita austeridade fiscal.
A par desse breve relato, volta-se a responder à questão a partir de um exemplo que aconteceu na sexta-feira (16/09) mesma data em que a Defensoria da União sofreu esse duro “golpe” de um constitucionalista.
Naquela noite, como noticiado. A Justiça Federal relaxou a prisão de alguns investigados da chamada operação Hashtag, os quais não foram denunciados pelo MPF. A decisão judicial autorizou a saída imediata de três deles, sem nenhum monitoramento eletrônico e apenas sob condição de prestarem satisfação mensal à polícia sobre atividades e endereço.
Tudo indica que não serão denunciados e que a polícia não deve encontrar provas do envolvimento dos mesmos com práticas terroristas, pois decorridos 60 dias de suas prisões, até agora nada encontraram.
A decisão mesmo depois de toda repercussão do caso, da exposição midiática de suas imagens e nomes e da rotulação como terroristas que destruiu suas identidades socialmente, limitou-se a determinar que o sistema penitenciário federal arcasse com os custos de suas passagens de volta às cidades de origem. Mais uma vez ignoraram um pedido da Defensoria Pública. Reivindicou-se que fossem adotadas cautelas para o retorno dos mesmos em segurança, inclusive em face de assédios da imprensa.
Simples assim: as pessoas foram presas, colocadas em uma prisão de segurança máxima em Campo Grande (MS), tachadas de terroristas e sairiam só com uma passagem na mão e a roupa do corpo com que foram presos dois meses atrás.
Mas não foi assim. E não foi porque se no Brasil faltam juízes mais sensíveis com os problemas dos cidadãos, há defensores que mesmo diante da invisibilidade de seus pleitos, não se curvam às dificuldades.
A Defensoria Pública da União no Paraná, atenta às dificuldades que os presos teriam ao serem libertados, tão logo percebeu a omissão judicial e ciente do anseio de liberdade dos seus assistidos já se colocava desde cedo em contato com o defensor-público federal de Campo Grande, responsável pelo atendimento aos presos, de modo a articular uma saída segura e digna dos possíveis libertos.
Foi através do empenho do defensor Silvio Rogério Grotto que o Conselho da Comunidade conseguiu um hotel para que os libertos pernoitassem até embarcar de volta pra casa. Foi quem serviu de motorista para pegá-los e transportá-los ao hotel. No seu carro próprio, já que a Defensoria Pública diferentemente da magistratura e do Ministério Público não dispõe de carro funcional em horário de plantão.
O defensor Silvio encarregou-se voluntariamente de conduzi-los nos 16 quilômetros que separam a penitenciária do aeroporto, cuidando para que não fossem vítimas de qualquer infortúnio até chegarem lá.
Ele não ganha um centavo a mais por trabalhar em regime de plantão e nem estaria obrigado a fazer isso no seu plantão. Também não será reembolsado pelas despesas de gasolina, lanches, etc.. Agora, nem o reajuste que a Constituição determina que lhe fosse dado, ele terá.
Mas a paga do defensor Silvio foi enorme: na satisfação de presenciar a cena em que os recém libertos se viram no espelho depois de 60 dias em um cela em que nada havia além do lençol, da roupa que vestiam e um silêncio ensurdecedor.
Ao sair da prisão um deles ainda confessou: “sabe doutor o que eu queria muito era comer aquele pétit gateau de que uma agente penitenciária falava enquanto eu aguardava a assinatura do termo do meu interrogatório”.
Não foi possível. Àquela hora, todo o comércio estava fechado e o singelo desejo deixou de ser atendido.
A preocupação de outro deles era maior, com o seu futuro. Ao ser preso, estava prestes a ser chamado para assumir um cargo público, após ser aprovado em concurso. Agora, não sabe se perdeu a vaga, se o inquérito lhe impedirá a posse e se ainda terá oportunidade de emprego na sua pequena cidade. Afinal, foi apontado como terrorista, ligado ao EI. Coube ao defensor Silvio tranquilizá-lo, prometendo o empenho da Defensoria em ajudá-lo das formas que forem possíveis.
Uma ironia e tanto constatar que pessoas tachadas da mais alta periculosidade e radicalidade – “terroristas” -, saíram da penitenciária de segurança máxima acompanhados por um só homem, armado apenas de boa vontade e movido por uma única missão: conferir-lhes tratamento digno e assegurar-lhes o retorno para seus lares.
Neste sábado (17/09), lá foi o Dr. Silvio novamente pegar outra leva de libertos, aqueles que terão que usar tornozeleiras eletrônicas. O que criou um problema as mais. Um deles trajava a mesma bermuda com que foi preso. O defensor ainda teve que providenciar uma calça comprida para que o aparato eletrônico não ficasse visível. Sem falar no almoço que pagou aos dois, em um MCDonald, quando viram na Globo News a informação de que eles estariam no aeroporto. Houve ainda a preocupação de acompanhá-los até o embarque para desembaraçar a passagem pelo detector de metais com o aparelho preso ao tornozelo.
O fim de semana foi intenso para o Defensor Silvio. Não pôde dedicar toda atenção ao seu companheiro, com quem vive em união estável há muitos anos, para conferir dignidade às pessoas que há pouco tempo eram rotuladas de periculosidade máxima, mas com as quais tem convivido nos últimos 60 dias. Tratou-os com o respeito e dignidade devidos, mesmo a cidadãos apenas suspeitos, pois sequer foram denunciados de alguma coisa pelo MPF.
Um respeito que foi mútuo, durante as visitas semanais que o defensor fez ao Presídio Federal de Segurança Máxima de Campo Grande. Talvez o Juiz que decretou tantas prisões na operação Hashtag ficasse surpreso em conhecer o Dr. Silvio ou os assistidos que indiretamente lhe atribuiu.
Agora, respondendo à pergunta inicial: Quem precisa de um defensor?
Somente aqueles que sabem quanto custa não ter um.
* Rita Cristina de Oliveira, 38 anos, advogada criminal há 12 anos, os últimos três na Defensoria Pública da União (DPU) e, desde janeiro, atuando em Curitiba (PR).
10 Comentários
Nossa, que sorte desse grupo ter encontrado um defenso publico desse calibre. Paranbéns ao doutor Silvio Grotto e a todos os defensores publicos que fazem um trabalho digno de todo aquele que entende a justiça para muito além de penas, castigos e burocarcia.
Realmente é um desmonte da máquina pública. Atitude de um governo ilegítimo. Composto por pessoas denunciada em diversos delitos de corrupção e outros mais. O quê será do nosso país?
Quanta diferença entre esses abnegados defensores públicos e os 11 Chupins Togados que rasgaram a nossa constituição e avalizaram o Golpe. Tudo por alguns trocados de aumento salarial negociados com a escória da política nacional.
Acho você um fantástico jornalista. Deixarei quase nada porque sei que sabe encontrar. A primeira página do google dá 5 defensorias estaduais. Uma das minhas heroínas pessoais chama-se Érica Meireles… descubra porquê.
Os Defensores Públicos Rita e Silvio são os modelos de servidores públicos que toda a nação gostaria de ver em TODOS as instituições outrora republicanas. Apenas uma pequena minoria de juízes e membros do MP são capazes de atuar com a humanidade e o espírito público que demonstraram os DP Rita e Silvio na defesa da ridícula acusação de terrorismo que foi fabricada contra seus clientes, DF que merecem nossa admiração e apoio por ser um exemplo a ser seguido por todos, servidores públicos ou não. Claramente são pessoas de bem e que não foram atingidos pela arrogância que caracteriza hoje a grande maioria dos membros do nosso sistema jurídico. Meu pai foi procurador e em sua época nem ele e nem a maioria de seus colegas ostentavam a empáfia que se vê hoje nos membros do MP e do judiciário desde que entram na carreira na base da decoreba, da sorte e/ou da proteção na hora da “entrevista” e passam, não se sabe por quê, a se considerarem acima do bem e do mal. Se nossas instituições “republicanas” não forem totalmente transformadas e democratizadas (recomeçarem do zero mesmo), são as piores possíveis a perspectiva de avanço do nosso país em direção à civilização.
Uma reportagem e um relato de uma defensora pública, como os que compõem esta postagem, falam por si e dispensam comentários sobre o episódio tema.
O que me chama a atenção é a orientação acusatória e persecutória de nosso Estado, cada vez mais longe do Direito e que estuprou, degolou e esquartejou a Democracia. O MP, em tese fiscal da Lei, recebeu pós a CF/1988 ilimitados poderes e nenhum controle; ao perceber isso, Sepúlveda Pertence sentenciou com sabedoria: “Criamos um monstro.” É sintomático, preocupante e muito perigoso que toda a sanha acusatória e persecutória do MP se volte contra os poderes democráticos do Estado (Executivo e Legislativo), contra os cidadãos comuns e seus representantes políticos eleitos pelo voto popular, mas deixe intocáveis a casta judiciária, a casta a que pertencem os MPs, assim como as oligarquias plutocráticas e escravocratas, herdeiras diretas da Casa grande. Mais grave ainda que a instituição que deveria fazer o contraponto ao MP, defendendo os cidadãos contra as arbitrariedades, abusos e ilegalidades criminosas cometidas por agentes do Estado – a Defensoria Pública – receba esse tratamento discriminatório, sem plano de carreira, sem estrutura física, sem o número adequado de servidores, para atender à imensa maioria da população brasileira, que não pode contratar advogados, sem orçamento e autonomia funcional, sem vencimentos a que fazem jus os abnegados defensores (que demonstram muito mais espírito público e humanidade que os torquemadas que infestam os MPs e o Judiciário).
O governo golpista do traidor-golpista-usurpador-corrupto profissional, michel temer, com esse veto ao reajuste para os defensores públicos e à equiparação destes aos procuradores do MP, mostra claramente de que lado está e a serviço de quais classes, grupos e categorias, os governos golpistas sempre estão: dos que sempre detiveram e detêm o poder econômico (banca financeira, latifundiários, belicistas, charlatães e fundamentalistas religiosos, empresariado anti-nacionalista, classe média-alta reacionária e conservadora, mídia comercial golpista e criminosa, etc.). Invocar um passado ‘constitucionalista’ e de magistério nessa área do Direito não me parece expor contradições desse verme político e moral que usurpou a presidência da república. A carreira política medíocre e a atuação de michel temer como informante de consulados e embaixada dos EUA sempre deixaram claro, para mim, que ele NUNCA foi digno de confiança e respeito.
Só sabe o valor do defensor público aquele que precisa de um. A matéria infelizmente esqueceu de mostrar que Magistratura e Ministerio Público evoluíram sua remuneração R $19.000,00 em 2012 para R $40.000,00 em 2016. Um aumento de mais de 50% para carreiras importantissimas, MAS que possuem fantastica estrutura com dezenas de servidores pra fazer a maior parte do trabalho.
Enquanto isso, filas infindaveis na Defensoria, pessoas passando fome, sofrendo violencia domestica ou do Estado, perdend o suas casas por minimas dívidas, tendo direitos surrupiados pelo Estado,…tudo porque os defensores estão indo embora para outros cargos que paguem um valor CONDIZENTE COM SUA CAPACIDADE E PREPARO. É uma pena que esse governo TEMER torturara os pobres mais uma vez!!!
Pequena retificação: …aumento de mais de 100% para Magistratura e MP.
Quero deixar meus sentimentos de orgulho, carinho e admiração pela atuação de todos os Defensores Federais e Estaduais! Vcs são heróis! Meu sentimento de desesperança e indignação para os governos que cada vez mais querem marginalizar tudo aquilo que é para o povo. Mas também, o povo não luta! Se bobear, vai contra a categoria achando q querem muito.
É uma realidade terrível. E diante do governo do Sr. Michel Temmer, continuará intocável. Infelizmente é o que aponta. Eu já vi Defensor Público atender num banco de praça por não ter outro lugar disponível para o atendimento. Precisamos nos unir, recompor e continuar a luta que não é nossa, é de toda a sociedade. Meus parabéns aos colegas que não mediRAM esforços para dar um pouco de dignidade aqueles que lhe foram tiradas. Avante, com firmeza e determinação.