Por Arnaldo César (*)
Entrevistas de pergunta e respostas (apelidadas nas redações de pingue-pongue) costumam ser cruéis para quem a faz e para quem as lê. Invariavelmente, funcionam como se fossem correias de transmissão, nas quais o entrevistado fala o que bem entende. Ou melhor, mente à vontade.
Não se poderia esperar nada, além disso, da espalhafatosa entrevista, estampada em O Globo, deste último domingo, com o Senhor Fora Temer. Os seis profissionais escalados pelo matutino carioca para a missão até que se esforçaram um pouquinho. O resultado do que colocaram em quatro páginas, contudo, foi pífio.
O Senhor Fora Temer repetiu para eles que é contra o reajuste de ministros do STF. O que foi tratado como uma grande revelação, merecendo inclusive a manchete de primeira página.
Todo mundo que transita pelos bastidores do poder, em Brasília, sabe que o presidente usurpador vem sendo pressionado pelos governadores dos estados para não fazer isso. Caso contrário, as finanças dos governos federal, estaduais e municipais que já vão de mal a pior desandarão de vez.
Nem mesmo a tão propalada reforma da previdência, cantada em prosa e verso pelo governo golpista, mereceu um cadinho de contundência. Vai tentar, antes, convencer os trabalhadores homens e mulheres para, depois, aplicar o remédio amargo. Mesmo porque, aposentado aos 55 anos idade, com um vistoso salário de R$ 30.613,24 mensais falta-lhe coturno moral para ferrar o restante de seus compatriotas.
Comédia – A entrevista vem recheada de disparates. A justificativa apresentada pelo golpista mandatário para não assinar um documento garantindo que não irá se candidatar em 2018 é hilária. Com toda a candura do mundo disse o pai do Michelzinho: “Não faço porque todo mundo que assina não cumpre”.
Quando lhe questionam sobre um pacote de concessões a ser lançado esta semana confessou, com toda a franqueza, que não sabia do seu conteúdo. Mas asseverou que ele será feito sem preconceito. Aliás, na opinião dele, “o que precisa acabar no Brasil é o preconceito”.
Num texto final no qual dão o clima de duas horas de entrevista, os repórteres reproduzem, entre aspas, que o Senhor Fora Temer quando despacha da mesa presidencial “sente-se como Carlos Magno e os cavaleiros da Távola Redonda”.
Estultices – Professor por trinta anos, que sempre fez questão de recomendar aos seus alunos que lessem muito, o presidente usurpador parece não aplicar seus próprios ensinamentos, quando se trata de história antiga. Misturou o “Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda” que viveu no século V com “Carlos Magno e os 12 Pares de França”, do século VIII.
Não vamos crucificá-lo por tal tropeço. Há estultices mais preocupantes. Especialmente, quando ele justifica o aumento da carga horária de trabalho de 12 horas como uma oportunidade para que os trabalhadores possam ter um segundo emprego, se assim o desejarem. Nem FHC, o príncipe do neoliberalismo e da plutocracia reinantes, se atreveu a tanto.
Desprovidos de qualquer preconceito, devemos nos concentrar cada vez mais nas “Diretas Já” ou “Fora Senhor Fora Temer”.
(*) Arnaldo César é jornalista