Há 15 dias, logo após celebrar a missa dominical pela manhã, Frei Gilberto Teixeira, franciscano da Fraternidade Santa Maria dos Anjos, pároco da igreja de Santo Antônio, em Belisário, distrito de Muriaé, uma das cidades no entorno da Serra do Brigadeiro, na Zona da Mata de Minas Gerais, recebeu uma estranha visita. Não era nenhum paroquiano conhecido. Tampouco alguém que já tivesse visto pela cidade. O diálogo, à porta fechada, no salão paroquial, deu-se mediante a ameaça de uma arma. O recado foi simples, direto e contundente, como o próprio religioso relatou depois:
“Frei, o senhor está falando demais em mineração. Estou vindo aqui só para dar um aviso. Da próxima vez, se eu vier, não será agradável para o senhor. É para o senhor parar de falar de mineração nos seus espaços e aonde o senhor for”.
A ameaça veio acompanhada de detalhes da vida do frei. O desconhecido deixou claro que o religioso vem sendo seguido, seja pessoalmente, seja – como suspeitam alguns na região -, pelo rastreamento do seu celular (*). Utensílio que depois da visita ele abandonou, como descreveu o biólogo Luiz Paulo Guimarães de Siqueira, do Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM. Outro detalhe importante é que, no sábado anterior (18/02) ele presidiu uma reunião para discutir a Campanha da Fraternidade de 2017. O tema deste ano está relacionado aos biomas brasileiros. A Diocese de Leopoldina – município a 61 quilômetros de distância, à qual a Igreja de Santo Antônio pertence – escolheu o distrito de Belisário para representar a zona da Mata Mineira, em parceria com biólogos e ativistas ambientais. Na reunião falou-se sobre a mineração e o pistoleiro que visitou Frei Gilberto soube descrever com detalhes o que havia passado durante o encontro. Siqueira, recorda do relato feito pelo frei após a ameaça sofrida:
“O sujeito falou que sabia onde o frei esteve na semana anterior, mencionou que ele passou três dias em Contagem (cidade na região metropolitana de Belo Horizonte), que parou em Ouro Preto, almoçou em Rosário de Limeira. Demonstrou que de alguma forma ele estava rastreando o frei. Nós acreditamos que seja através do celular do Frei Gilberto.”
A ameaça foi devidamente registrada na Polícia de Muriaé e o religioso, de imediato, recebeu a solidariedade e o apoio do bispo Dom José Eudes Campos do Nascimento, da Diocese de Leopoldina. Na nota, porém, o bispo omite qualquer problema com a mineração e apenas menciona o trabalho do religioso em defesa dos pequenos produtores rurais. Fato que descontentou a muitos militantes da causa ecológica na região, pois a ameaça maior que estes produtores sofrem hoje vem da tentativa de exploração da bauxita (rocha de cor vermelha formada principalmente por óxido de alumínio, principal fonte natural de alumínio).
Na nota (veja ao lado), o bispo destaca o trabalho do religioso e lembra o assassinato da irmã Dorothy Stang, com seis tiros, aos 73 anos de idade, em fevereiro de 2005, em uma estrada de terra de difícil acesso, a 53 quilômetros da sede do município de Anapu, no Estado do Pará:
“Frei Gilberto, em sua função missionária, como deve ser, vem prestando assistência e apoio aos pequenos agricultores de sua comunidade, na luta contra a espoliação de suas terras e a degradação das áreas de lavouras familiares. Em nosso País, como temos assistido com muita dor, os ditos “grandes empreendimentos” não suportam argumentação que contrarie seus planos, sabedores de que sempre sairão vitoriosos. Pelo que, ignoram qualquer bem-estar ou direito dos fracos. Se entender necessário, desprezam até mesmo a vida humana dos contraditores. Irmã Dorothy é uma das nossas mais recentes e dolorosas memórias…”
Se não há como deixar de relacionar a ameaça sofrida por Frei Gilberto à questão da mineração na região, ainda é impossível apontar quem estaria por trás do recado que o “visitante” lhe levou no domingo, 19 de fevereiro. Ao longo do seu trabalho pastoral, o religioso desenvolve campanhas em favor do meio ambiente. Com isso, desagrada a muitos.
A Serra do Brigadeiro, na Zona da Mata mineira é, ao mesmo tempo, conhecida por sua rica biodiversidade, com amplas áreas preservadas de Mata Atlântica, mas também uma região com algumas das maiores reservas de bauxita. Mapeamentos feitos por geólogos a serviço de mineradoras mostram, por exemplo, que o distrito de Belisário é quase todo coberto pela rocha avermelhada. Outra característica da região é a chamada agricultura familiar, com uma forte produção de olerícolas (legumes), café, frutas (como uvas orgânicas), além de ser um forte polo de produção leiteira. A bauxita, por ser porosa, não atrapalha a produção agrícola ou pecuária.
Pela preservação do ambiente, os moradores da região desde 2011 lutaram contra a instalação de um mineroduto que levaria minério de ferro de Congonhas (MG) para Presidente Kennedy (ES), atravessando 22 municípios, muitos deles no entorno da Serra do Brigadeiro, como explica ainda o biólogo Siqueira:
“Esse projeto caiu depois de muita luta, de muita organização das cidades atingidas, dos movimentos populares, principalmente em torno da cidade de Viçosa (MG). Teve um embate, desde 2011. No ano passado (2016) conseguimos consagrar a vitória e impor a derrota à Ferrous Resources do Brasil, autora do projeto. Era para transportar minério de ferro, saindo de Congonhas, cortaria 22 municípios, entre eles alguns municípios da Serra do Brigadeiro, como Ervália, Rosário de Limeira e Muriaé. Muriaé também. Mas, não passaria por Belisário“.
Ainda assim, em Belisário também teve manifestações contrárias ao mineroduto. Com seu apoio, lá esteve Frei Gilberto, que não pertence a qualquer dos movimentos sociais, mas sempre os apoia, inclusive abordando as causas desses grupos em seus sermões, homilias e palestras.
Todo 22 de março, por exemplo, ele realiza um grande ato por conta do Dia Mundial da Água. Neste ano, será no domingo 26, quando as ameaças que lhes foram feitas servirão também para mobilizar populares fiéis.
Há, portanto, na região, um histórico de mobilização popular que envolve alguns movimentos como o MAM, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e diversos sindicatos como o dos Trabalhadores Rurais de Muriaé, Barão do Monte Alto, Rosário da Limeira e São Sebastião da Vargem Alegre, presidido por Eduardo Antônio de Alcântara.
“Em Belisário, desde o ano passado, fizemos uma serie de atividades, uma serie de mobilizações nas comunidades e, depois, uma assembleia popular. Um dos encaminhamentos desta assembleia foi a realização de um ato político, de uma manifestação, naquele distrito, denunciando a mineração. Ocorreu no final do ano e teve como lema “Mineração Aqui Não!”. Isso causou um alvoroço muito grande“, recorda-se Siqueira.
Alcântara – para quem a nota da Diocese foi “fraca”, por não abordar o problema da mineração – admite que os produtores da cidade ainda não receberam nenhuma proposta das mineradoras. São duas que atuam na região. A maior delas é Companhia Brasileira de Alumínio, CBA, com 60 anos de existência, braço do Grupo Votorantin. Em 2016, ela deixou de fazer parte da estrutura da Votorantim Metais, e ganhou vida independente em busca de novos sócios. Outra, de menor porte, é a Bauminas Mineração, do Grupo Bauminas, com meio século de atividades.
A mineração não começou na jurisdição de seu sindicato, mas os preparativos já foram feitos. Uma empresa terceirizada tratou de fazer o cadastro social dos pequenos agricultores. Em municípios vizinhos, como Miraí e São Sebastião da Vargem Alegre, segundo Alcântara, já há mineração há seis para sete anos. “A próxima cidade da lista seria de Rosário da Limeira, que é da nossa base. Lá sim, eu creio que já teve alguma conversa sim. A mineradora já veio”, explica
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) da região tenta fazer um levantamento do numero de famílias atingidas. Ninguém sabe quantos propriedades rurais serão alvo dos interesses das mineradoras. Mas nos quatro municípios em que o sindicato presidido por Alcântara atua, pelos dados do Censo Agropecuário de 2006, havia um total de 7.710 pessoas, entre homens e mulheres, ocupadas em estabelecimentos agropecuários. O sindicato em si tem 7.800 associados, mas este número não reflete a realidade, uma vez que alguns morreram, migraram ou mudaram de profissão.
A bauxita tem suas jazidas aparentes e estas podem se estender até 15 metros de profundidade. Logo, sua exploração provoca a degradação do solo. As mineradoras falam em projetos de recuperação, como plantio de branquearia, para fazer pasto, ou eucalipto. Os eucaliptos que vemos, não crescem. O solo fica extremamente instável, frágil. Quando você coloca o pasto, se você pisa, você afunda. Então não dá para colocar a criação. Se o ser humano pisando já afunda, imagina o boi. A CBA utiliza essa narrativa de que é possível recuperar ambientalmente as regiões mineradas. Mas, na prática, não há recuperação”, alerta o biólogo Siqueira.
As mineradoras, na verdade, não adquirem a propriedade, mas o chamado “uso de servidão”, para, durante um período, retirar a bauxita. Pagam uma indenização ao proprietário antecipadamente, sem relação coma produção do mineral, Se as jazidas forem grandes, faturam mais sem novos gastos.
Há produtores interessados e que já fecharam acordos. Outros, correm o risco de verem o negócio dar para trás, por conta do movimento “Mineração Aqui Não!”. Mas também os prefeitos defendem essa exploração, uma vez que recebem 2% do faturamento líquido da mineradora, a título de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais – CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, como se fosse o royalties da mineração, o chamado royalty da mineração.
No entendimento dos militantes dos movimentos contra a mineração naquela região, estes ganhos não compensam, por conta da degradação do terreno e do prejuízo da chamada agricultura familiar:
“Na visão dos sindicatos e das comunidades, o projeto da agricultura familiar compensa muito mais do que a exploração de bauxita. Até porque, com a agricultura familiar você tem um projeto a médio e longo prazo, com a bauxita é curto prazo. Explora em meses e depois vai comer em outras serras“, explica Siqueira.
Justamente por conta do envolvimento de muitos interessados é que ninguém aponta ao certo que estaria por trás das ameaças ao Frei Gilberto e o seu apoio a favor dos pequenos agricultores e à condenação da mineração na região. Há muitos interesses, inclusive, intermediários entre as mineradoras e os produtores rurais. Caberia à polícia investigar a fundo o que realmente aconteceu, mas os entrevistados pelo blog não têm notícia de nenhum avanço nesta investigação. Daí porque, prometem começar as denúncias nacionalmente e até a entidades internacionais.
Muito embora não se possa fazer nenhuma acusação direta, mais de 70 organizações, movimentos sociais, populares e sindicais emitiram nota em solidariedade ao Frei Gilberto Teixeira e exigindo a apuração da ameaça (leia íntegra e a relação das entidades abaixo). Nela, sem relacionarem a mineradora com a ameaça feita ao religioso, apontam o jogo pesado que a CBA faz junto aos pequenos produtores:
“Apesar de a CBA utilizar inúmeras estratégias de má fé para enganar as famílias, as comunidades não têm aceitado a possibilidade da perda de seus modos de vida para um projeto de mineração que nada tem a oferecer ao bem-estar social local. Nesse sentido, diversas organizações, entre movimentos populares, sindicatos, pastorais sociais, grupos religiosos, ONGs e pesquisadores tem atuado conjuntamente na defesa do território, construindo lutas e fazendo resistência aos intentos dos interesses do capital mineral em saquear o território”.
Notificação Judicial da CBA – Curiosamente, a CBA saiu do silêncio através de uma notificação extrajudicial enviada ao Blog do Pedlowski, um dos primeiros a noticiar as ameaças de morte contra Frei Gilberto.
Nela, escritório de advocacia “Moraes Pitombo Advogados”, de São Paulo, em nome da empresa tenta negar a ocorrência da ameaça, alegando inexistir registro da mesma na Polícia de Muriaé, e rebate qualquer acusação de que a CBA tenha participação na mesma. Pedlowski, porém, rebate qualquer insinuação nesse sentido afirmando que:
“Deixo claro que não fiz qualquer referência à CBA como partícipe da ameaça feita ao Frei Gilberto e, inclusive, estranho que essa ligação tenha sido feita por quem diz representar a empresa.
Um aspecto que parece ter fugido à atenção de quem produziu esta notificação extrajudicial é que este blog opera amparado numa ampla rede de contatos que colaboram com materiais que normalmente ainda não chegaram à atenção da mídia corporativa. Além disso, antes de publicar quaisquer postagens relacionadas à conflitos socioambientais, realizo uma verificação direta antes de publicar. Talvez por isso é que tenha demorado tanto tempo para uma notificação de esta natureza aparecer”.
Abaixo, a íntegra da nota de solidariedade ao Frei Gilberto assinada pelas mais de70 entidades:
A região da Serra do Brigadeiro, situada na Zona da Mata de Minas Gerais, é conhecida nacionalmente pela sua rica biodiversidade, amplas áreas preservadas de mata atlântica, belezas naturais e uma agricultura familiar e camponesa consolidada com forte matriz agroecológica. Além disso, a região abriga a segunda maior reserva de bauxita do país, o que despertou, desde a década de 80, o interesse de mineradoras em explorar as jazidas minerais objetivando o lucro sem se importar com as consequências nefastas da mineração na região.
Dentre as mineradoras que atuam na região, a principal delas é a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), que no último período tem intensificado a pressão nas comunidades para a expansão do empreendimento e exploração dos territórios.
Apesar de a CBA utilizar inúmeras estratégias de má fé para enganar as famílias, as comunidades não têm aceitado a possibilidade da perda de seus modos de vida para um projeto de mineração que nada tem a oferecer ao bem-estar social local. Nesse sentido, diversas organizações, entre movimentos populares, sindicatos, pastorais sociais, grupos religiosos, ONGs e pesquisadores tem atuado conjuntamente na defesa do território, construindo lutas e fazendo resistência aos intentos dos interesses do capital mineral em saquear o território.
No último período, diversas ações foram realizadas na região da Serra do Brigadeiro para denunciar e repudiar a atuação da CBA. Estas ações têm gerado cada vez mais a ampliação da consciência das comunidades locais sobre os impactos e riscos da chegada deste modelo de mineração e ao mesmo tempo gerado também reações de coação às lutas e, até mesmo, ameaças aos sujeitos envolvidos na defesa do território.
No último domingo, dia 19 de fevereiro, o companheiro Frei Gilberto, franciscano da Fraternidade Santa Maria dos Anjos do distrito de Belisário (Muriaé – MG), ao finalizar a celebração da missa de domingo foi covardemente abordado por um pistoleiro armado que o ameaçou devido aos seus posicionamentos contrários aos projetos pretendidos pelas mineradoras.
O pistoleiro enfatizou em sua abordagem que naquele momento era só um aviso, mas que, se o Frei Gilberto continuasse atuando junto aos movimentos de resistência e se posicionando contra a mineração ele retornaria para matá-lo. Além da ameaça à vida, o pistoleiro ainda sinalizou que Frei Gilberto está sendo monitorado de perto: forneceu informações sobre todas as viagens recentes e ainda sabia conteúdo da fala do Frei em diversos eventos. O que pode significar que o Frei Gilberto está sendo grampeado e seguido em todas suas ações.
Diante do episódio, manifestamos publicamente o repúdio ao tal acontecimento e exigimos dos órgãos responsáveis a garantia de segurança à vida e do direito de lutar pelas causas coletivas. Ao mesmo tempo expressamos nosso total apoio e solidariedade ao companheiro Frei Gilberto e aos sujeitos que se dedicam na luta em defesa do território da Serra do Brigadeiro contra os interesses do capital mineral na região.
Muriaé – MG, 23 de fevereiro de 2017.
(*) O paradeiro de qualquer pessoa é rastreável por meio do celular ligado que acompanha a pessoa. Para isso basta ter acesso à companhia telefônica, que rastreia por meio da antena que o telefone captou sinal nos últimos dias. Isso se chama o sinal da ERB (Estação Rádio Base).
(**) Por erro do editor, a legenda de uma foto referente ao mineroduto que se queria construir, na edição anterior saiu como sendo impacto ambiental provocado pela exploração de bauxita. Peço desculpa aos leitores pelo erro cometido.
7 Comentários
[…] e os movimentos em defesa do meio ambiente. Nessa queda de braço, como já mostramos no Blog em O frei ameaçado pela bauxita (5/3/17) e O dilema mineiro: mineração ou preservação? (19/3/17), um dos líderes é o franciscano Frei […]
Sou Irmã Iolanda, franciscana d eAllegany e solidarizo com Frei Gilberto e todas as pessoas que fazem o enfrentamento impedindo a entrada das mineradoras. Trabalhei os três últimos anos na Diocese de Santarém -PA. Onde a Alcoa quer estender seus tentáculos, a Cargil e muuuuitos outros grupos!
A estratégia que precisamos modificar facilmente é, em meu ponto de vista, e lá tentamos melhorar e: A ALCOA NÃO VAI ENTRAR PORQUE NÃO ACEITAMOS E NÃO DEIXAREMOS!
Isto é: Em nossa rede neuronal vamos fazendo valer IDÉIAS POSITIVAS que causam medo nos GRANDES! Eles sabem que pessoas animadas, encorajadas, ORGANIZADAS VENCEM! VOCÊS CITARAM AS VITÓRIAS!
Estou convicta que a CRENÇA EM LUTAR E VENCER faz a diferença e com a graça de Deus pretendo aperfeiçoar meus conhecimentos na Física Quântica e utilização da mesma para ajudar pessoas e grupos que são PROFETAS E PROFETISAS DE DEUS neste nosso pais querido.
Sou natural de Perdizes M. G. apaixonada por Minas Gerais e nosso Brasil!
Um abraço a vocês e minhas orações.
Ir. Iolanda
[…] O frei ameaçado pela bauxita […]
Grande reportagem, que jamais ocupará a pauta do PIG/PPV.
Atividade essencial e estratégica em qualquer país, a mineração SEMPRE produziu e CONTINUA a produzir grandes impactos ambientais, a maioria deles irreversíveis. É impossível extrair minerais e minérios, beneficiá-los e processá-los economicamente sem que grandes impactos ambientais sejam causados. Em minas a céu aberto os impactos são quase sempre maiores e SEMPRE mais visíveis; as minas subterrâneas escondem grande parte dos impactos, mas eles são, também, muito grandes, principalmente na saúde dos trabalhadores e nos mananciais de água da região minerada.
A reportagem, ao revelar as ameaças de morte sofridas por um líder religioso, mostra que os expedientes usados pela Casa Grande, pelas empresas mineradoras, pelos proprietários que já negociaram com elas, pelas oligarquias políticas e judiciárias locais – beneficiárias diretas da atividade mineradora, seja por meio de suborno ou pela arrecadação de royalties e tributos – continuam sendo os mais primitivos: a intimidação, a coação, a ameaça de assassinato dos que se opõem à implantação dos projetos minerários. Observem os leitores que isso acontece em MG, estado que nasceu com a mineração e tem minas no nome; se assim ocorre na Zona da mata Mineira, dá para se ter uma idéia do que acontece na Amazônia e nos rincões do brasil profundo.
Miraí, Muriaé, Cataguases e outras cidades da ZM e do Leste de MG são afetadas pela mineração; há poucos anos o rompimento de uma barragem de rejeitos da mineração de bauxita e processamento para redução do alumínio poluiu o Rio Pomba, matando toda a biodiversidade do rio, além de comprometer o abastecimento de água em cidades que ficam à jusante de Miraí, onde ocorreu o ‘acidente’. Os que conhecem o processo minero-metalúrgico para obtenção do alumínio metálico sabem que grandes quantidades de soda cáustica (NaOH – hidróxido de sódio) compõem aquela lama vermelha que escoou pelo Rio Pomba. Os resíduos desse tipo de barragem são MUITO mais poluidores e prejudiciais ao MA do que os decorrentes da extração e beneficiamento de minério de ferro.
Quem viaja por MG e observa os milhares de crateras, túneis, galeria, valas, voçorocas, barragens de rejeito, poeira marrom, vermelha ou preta que impregna vegetação e casas situadas nas regiões de mineração vê o meio ambiente dessa vasta região como um corpo repleto de feridas, que sangram ou que se mostram inflamadas e purulentas.
Por serem estratégicos e não renováveis, TODOS os minerais e minérios pertencem (ou deveriam pertencer) à União e sua extração e beneficiamento rigorosamente controlados. Mas o DNPM, órgão responsável pelas concessões de lavra, nada mais é que uma agência de lobby e corrupção, como qualquer repórter investigativo pode constatar. Desde os tempos do Brasil colônia, a mineração é controlada pelos colonizadores (primeiro pelos portugueses, depois pelos ingleses); após as guerras mundiais o domínio passou a ser dividido entre europeus, estadunidenses e australianos; nas últimas décadas os asiáticos aumentaram seu apetite em relação às nossas grandes reservas minerais (primeiro vieram os japoneses, depois os indianos e chineses). Com a tomada do poder pelas quadrilhas políticas, empresariais e judiciárias que representam a Casa Grande, TODA a mineração tende a ser entregue aos colonizadores de agora (basta ver o que estão a fazer com a CVRD).
Outro aspecto da mineração e processamento da bauxita para obtenção do alumínio que uma série de reportagens pode mostrar é o ENORME impacto energético associado. Para se produzir um kg de alumínio fundido são necessários 15 kWh de energia, ou seja, para se produzir 10 kg do meta são necessários 150 kWh, o consumo de um residência média por um mês inteiro. O trecho seguinte ilustra isso
“De acordo com dados da Secretaria Estadual de Energia, enquanto todas as residências da cidade de São Paulo gastam 11.127.288.780 de KWh (dados de 2010), a área industrial de Alumínio, onde está instalada a CBA, gasta aproximadamente 5,46 bilhões de KWh. Esse consumo é bem superior, por exemplo, ao do município de Sorocaba que totaliza 1,87 bilhão de KWh, distribuídos em: residencial (0,106 bilhão de KWh), rural (0,0074 bilhão de KWh), comercial (0,003 KWh), e iluminação pública, poderes públicos, serviços públicos e consumo próprio (0,140 bilhão KWh). ”
Portanto vários questionamentos podem ser feitos quanto ao destino que terá a energia gerada em Belo Monte, quem serão os maiores beneficiários, etc. Nota: o alumínio fundido, embora consuma mais de 80% da energia, possui valor agregado relativamente baixio, quando comparado ao alumínio laminado e em ligas. Portanto JAMAIS deveria ser permitida a exportação do alumínio em tarugos.
[…] O frei ameaçado pela bauxita […]
[…] O frei ameaçado pela bauxita […]
Como outrora, a casa grande tentando silenciar a senzala, pela ameaça, coação e força. Analogamente ao contexto da fé é preciso anunciar e denunciar, sempre! Parabéns pelo texto, Marcelo!