STF, ao rever censura ao Blog, criticou a DPF Érika
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Marcelo Auler

Após negar ao Blog informações a respeito da transferência do delegado federal Eduardo Mauat da Silva, entre as quais o motivo de sua convocação para trabalhar na Operação Lava Jato, em Curitiba, mesmo ele tendo pedido espontaneamente, por interesse pessoal,  transferência para Santa Cruz do Sul (RS), o Departamento de Polícia Federal (DPF) foi intimado pelo juiz Jaime Alves de Oliveira, do Juizado Especial Cível Adjunto daquela cidade gaúcha, a responder às perguntas formuladas com base na Lei de Acesso às  Informações.

A decisão do juiz foi tomada no processo 9001100-64.2018.8.21.0026. Trata-se da ação que o delegado move contra o editor do Blog com pedido de indenização por danos morais. Ela foi ajuizada em consequência de um questionamento que lhe fizemos, em julho de 2016, na reportagem Delegado Eduardo Mauat: foi por ideologia ou pelas diárias?. O artigo surgiu a partir de uma postagem do próprio delegado, nas redes sociais, na qual incitou a sociedade a cobrar informações das autoridades a respeito da Lava Jato. Na época, sua convocação para a Lava Jato foi suspensa e ele teve que retornar à delegacia de Santa Cruz do Sul na qual estava lotado desde junho de 2014.

Quase dois anos depois de o Blog lhe pedir explicações sobre a sua permanência em Curitiba apesar de pedir, espontaneamente, repita-se, a sua transferência, ele decidiu processar-nos. Na inicial, a advogada Márcia Eveline Mialik Marena – irmã da delegada Érika Mialik Marena que também processa o Blog – alega que houve ofensa direta ao delegado “no seu íntimo, na sua dignidade moral, na sua honra e caráter”. Por conta dessas alegadas ofensas, quer nossa ao pagamento da indenização máxima permitida em Juizado Especial: 40 salários mínimos (R$ 37.480).

As informações que o Blog buscou junto ao DPF, entre as quais os valores das diárias pagas a delegados, deveriam ser públicas, como são públicos os salários de todos os servidores. No Ministério Público Federal (MPF), por exemplo, os valores das diárias de viagem constam no site da instituição, junto com o que é pago aos procuradores a título de remuneração e auxílios. Mas, na Polícia Federal o assunto ganha ares sigiloso sob alegação de que são informações pessoais. Por essa lógica, os salários dos servidores jamais seriam tornados públicos.

O DPF alegou que as informações pedidas são consideradas dados pessoais (reprodução editada)

Ao negar o que o Blog perguntou, o Diretor de Gestão de Pessoal, delegado Delano Cerqueira Bunn, em ofício de junho de 2018, alegou que estas “informações tem o acesso restrito, independentemente da classificação de sigilo, e não pode ser fornecida pela via estreita do E-SIC, por tratar-se de solicitação de informações pessoais, não estando abrangidas pela LAI” (sic).

No questionamento encaminhado à Polícia Federal a partir da ação movida pelo delegado Mauat, não há nenhum pedido de informação de cunho pessoal. Muito menos questões confidenciais.

O que se questionou – como pode ser visto abaixo, na íntegra do requerimento – foram os motivos que levaram o Departamento aceitar o pedido de transferência feito pelo delegado para, em seguida, reconvocá-lo para a equipe da Lava Jato, em Curitiba, onde ele já estava lotado anteriormente.

O Concurso Interno de Remoção no qual o delegado se inscreveu espontaneamente foi aberto em março de 2014, poucos dias depois de iniciada a Operação Lava Jato. A decisão que atendeu ao seu pedido, acatando sua transferência para a delegacia de Polícia Federal em Santa Cruz do Sul, foi de junho de 2014. Em seguida ele foi mantido em Curitiba, por convocação, com direito às diárias.

Diárias que também passaram a ser pagas a delegados de Curitiba designados para Santa Cruz do Sul onde preencheram a vaga deixada em aberto com a convocação de Mauat para permanecer na capital paranaense. Foram, pelo que o Blog conseguiu apurar, ao menos dois delegados que, em períodos distintos, atuaram no lugar que o colega deveria ter – a seu pedido, repita-se – preenchido: os DPFs Vitor Lopes e Fabrício Blini.

Os dois estão arrolados como testemunhas pelo advogado Antônio Carlos Porto Jr., de Porto Alegre, que defende o Blog sem cobrar honorários – Pró Bono. Por decisão do juízo, serão ouvidos em Curitiba, através de Carta Precatória.

Após ver suspensa sua convocação para a Lava Jato, Mauat gravou vídeo incitando a população a questionar as autoridades. Ao ser questionado, sentiu-se atingido em sua honra.

A insatisfação de Mauat com a direção-geral do DPF surgiu em 2106, ao ver suspensa sua convocação para a Lava Jato. Obrigado a assumir suas funções na delegacia de Santa Cruz do Sul, recorreu à página do Movimento Vem Para a Rua, na rede social, com um vídeo incitando a população a questionar as autoridades sobre a continuidade da Lava Jato.

A partir da sua postagem, e seguindo a própria orientação dele, lhe dirigimos o questionamento, que provocou a ação por danos morais quase dois anos depois. Nesta postagem, indagamos:

“Se o próprio Mauat pediu a sua remoção e se ele mesmo diz que na instituição há profissionais com capacidade para tocar a operação, sem que ela corra risco, é de se questionar o por que dele não ter efetivamente acatado a transferência pedida? Não soa incoerente pedir a transferência, ser atendido, permanecer aonde estava e depois reclamar quando a Direção Geral efetivamente o faz cumprir a remoção? Como, diante do seu próprio pedido de remoção, entender seu comentário que: “Meu afastamento foi determinado pelo diretor-geral. Meu planejamento era continuar lá até agosto, para tentar encaminhar as demandas que estavam sob minha responsabilidade. Então, enquanto o Dr. Leandro (Daiello) for diretor-geral, eu não vou retornar à operação Lava Jato.“”

Apesar de sua advogada alegar que na reportagem postada houve ofensa direta ao delegado “no seu íntimo, na sua dignidade moral, na sua honra e caráter”, na audiência de instrução do processo, em junho passado, essas “ofensas” parecem ter sido esquecida pelo próprio delegado ao fazer uma proposta completamente absurda para suspender a ação.

Queria que “o requerido (o jornalista) retire o seu Blog do ar, bem como todas as postagens depreciativas em relação à pessoa do autor, bem como que indique quem são as fontes na Polícia Federal, que lhe passam informações, o que não foi aceito pelo réu”, como consta da ata de audiência.

Proposta prontamente recusada por nós e nossa defesa como aqui narramos em: DPF Mauat quer fechar o blog e conhecer nossas fontes.

Diante da recusa do Diretor de Gestão de Pessoal do DPF em nos fornecer os dados solicitados com base na Lei de Acesso às Informações, o advogado Porto Jr. oficiou ao juízo esclarecendo e solicitando:

O réu buscou e segue tentando obter tais informações junto à Polícia Federal. Esbarrou, todavia, em toda a sorte de negativas, conforme comprovam os documentos já juntados aos autos.

A reportagem está correta. O autor (da ação) buscou remoção para a cidade de Santa Cruz do Sul, foi atendido, permaneceu no Grupo de Trabalho da Lava Jato, percebeu inúmeras diárias e precisou se ausentar com frequência de sua lotação original para atender os seus compromissos em Curitiba.

Tais fatos são verdadeiros, são informação jornalística, não são injuriosos e, muito menos, caluniosos. Não há suporte fático para o dano material. O autor (do questionamento) quer demonstra-lo com os dados oficiais da Policia Federal.

Nesse sentido, o réu (na ação) requer seja oficiado à Diretoria de Gestão de Pessoal, da Polícia Federal, para que informe ao Juízo os questionamentos não atendidos, conforme Mensagem Eletrônica 161/2018-SIC/DGP/PF anexo, que provarão o informado na matéria“.

O ofício do juiz, como reproduzimos acima, foi encaminhado dia 10 de outubro. Até sexta-feira (23/11) não tinha merecido resposta.

Esta semana o advogado também levou ao conhecimento do Juízo, ao considerar que na ação, fundamentalmente, se discute “a liberdade de imprensa e a democracia, o direito à crítica e a tentativa de busca da verdade e da informação ao público, protegidos pelo STF”, a íntegra do Acórdão do julgamento que acatou a Reclamação do Blog contra a censura imposta pelo Juizado Cível do Paraná, como aqui noticiamos em STF, ao rever censura ao Blog, criticou a DPF Érika.

Embora o acórdão do que foi aprovado pela Primeira Turma do STF trate da ação em que a delegada Érika obteve a censura do Blog, os votos dos ministros Luiz Fux e Luiz Roberto Barroso são muito claros na defesa do direito de informação, da liberdade de imprensa, inclusive, o direito de reportagens críticas, em especial a agentes públicos, como os delegados. Por isso Porto Jr. entendeu pertinente dar conhecimento dele ao Juizado Especial de Santa Cruz do Sul.

Questionamento do Blog ao DPF não respondido

AGRADECIMENTOS: Registramos aqui o apoio fundamental que temos recebido de diversos advogados que abraçam nossa causa, gratuitamente, a começar por Antônio Carlos Porto Jr, de Porto Alegre que nos defende nessa ação em Santa Cruz do Sul. A ele juntam-se ainda Rogério Bueno da Silva, de Curitiba. Outros foram Luís Guilherme Vieira, Aline Amaral de Oliveira, Lucas Rocha e Ana Carolina Soares, que atuaram inicialmente em uma ação criminal no Rio. Hoje, nesta ação somos defendidos pelo professor Nilo Batista e os advogados Carlos Bruce Batista e Matheus Tessari Cardoso. Em Belo Horizonte, onde uma nova ação foi ajuizada, o apoio vem do escritório DECLATRA – Defesa da Classe Trabalhadora, pelos advogados Cristiane Pereira, Humberto Marcial Fonseca e Juliana Magalhães Loyola. Em Brasília o Blog tem sido apoiado pelos advogados Claudio de Souza Neto, Beatriz Veríssimo de Sena, Ana Beatriz Vanzoff Robalinho Cavalcanti e Claudismar Zupiroli. Acrescento ainda Wilson Ramos Filho que nos ajuda na articulação destas defesas. A todos nosso agradecimento público.

 

AOS LEITORES: Faz parte do Estado Democrático de Direito pessoas que se sentem lesadas por matérias jornalísticas, recorrerem à Justiça. O que é um direito, porém, também pode ser usado como arma para tentar em vão, intimidar. Muitos dos que nos processam não admitem a crítica e apelam para a censura, que é inconstitucional.  Estas ações têm ainda o objetivo de sufocar o Blog, na medida em que nos consomem tempo na preparação da nossa defesa e nos impelem gastos com viagens e deslocamentos, como a nossa ida à Brasília em busca da publicação de um acórdão, e a Curitiba. Atualmente respondemos a cinco ações em quatro estados diferentes. Como é do conhecimento de todos, dependemos da ajuda dos leitores e seguidores. Essa ajuda é fundamental na divulgação de nossas publicações para que atinjam um maior número de leitores. Da mesma forma, sobrevivemos com colaborações financeiras – em qualquer valor e/ou periodicidade – que nos permitam cobrir estas despesas de deslocamentos e custas judiciais, além da nossa sobrevivência. Concordando, compartilhe nossas reportagens. Podendo, colabore com o Blog através da conta bancária exposta no quadro ao lado. Mais uma vez agradecemos as importantes contribuições que nos são dadas e àqueles que vierem a contribuir.

3 Comentários

  1. C.Poivre disse:

    Porquê o genro de Léo Pinheiro vai ser o novo presidente da Caixa Econômica Federal:

    http://www.plantaobrasil.net/news.asp?nID=102428

    #LulaLivre

  2. Porquê o que se refere aos integrantes da lava jato, tem que ficar em segredo de justiça? Se são servidores públicos, tudo deve ser transparente. Está certo o juiz!

  3. C.Poivre disse:

    A bandidagem contida na PLP 459/2017, é denunciada por Maria Lúcia Fattorelli em Audiência Pública na Câmara dos Deputados

    https://youtu.be/HSizo6EJeP4

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