Em nota divulgada na tarde desta quinta-feira (26/10), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) posiciona-se de forma ambígua com relação ao momento político que o país vive.
Na nota assinada pelo comando da conferência – cardeal Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília e presidente; Dom Murilo Krieger, arcebispo de Salvador e vice-presidente; e Dom Leonardo Ulrich Steiner, bispo auxiliar de Brasília e secretário-geral – ao optarem por falar genericamente, não deixam claro o que defendem.
É verdade que a nota denuncia como grave “o divórcio entre o mundo político e a sociedade brasileira”.
Repudia ainda “a falta de ética, que há décadas, se instalou e continua instalada em instituições públicas, empresas, grupos sociais e na atuação de inúmeros políticos que, traindo a missão para a qual foram eleitos, jogam a atividade política no descrédito”.
Constata ainda que “a apatia, o desencanto e o desinteresse pela política, que vemos crescer dia a dia no meio da população brasileira, inclusive nos movimentos sociais, têm sua raiz mais profunda em práticas políticas que comprometem a busca pelo bem comum, privilegiando interesses privados”.
Classifica também como grave “tirar a esperança do povo”.
Depois, fala da necessidade de “vencer a tentação do desânimo. Só uma reação do povo0, consciente e organizado, no exercício de sua cidadania, é capaz de purificar a política, banindo de seu meio aqueles que seguem o caminho da corrupção e do desprezo pelo bem comum”.
Incentiva a população a ser protagonista das mudanças de que o Brasil precisa, manifestando-se de forma pacifica, sempre que seus direitos e conquistas ficarem ameaçados.
Na postagem inicial erroneamente cobramos que a nota não se posicionava sobre a questão do Trabalho Escravo. Ela realmente nada fala a respeito porque, na verdade, o assunto foi abordado em uma outra nota oficial: Bispos repudiam Portaria nº 1.129 do Ministério do Trabalho do Governo Federal. Dela destacamos o seguinte trecho:
“A desumana Portaria é um retrocesso que, na prática, faz fechar os olhos dos órgãos competentes do Governo Federal que têm a função de coibir e fiscalizar esse crime contra a humanidade e insere-se na perversa lógica financista que tem determinado os rumos do nosso país. Essa lógica desconsidera que “o dinheiro é para servir e não para governar” (Evangelii Gaudium, 58). O trabalho escravo é, hoje, uma moeda corrente que coloca o capital acima da pessoa humana, buscando o lucro sem limite (cf. Papa Francisco, Mensagem para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, 2014)“.
Aos leitores e à CNBB pedimos desculpas pelo nosso erro de não ter visto esta segundas nota.
Porém, na nota sobre o Atual Momento Político, um alerta necessário nos dias atuais em que muitos pregam soluções extravagantes e antidemocráticas, se encontra pedido no meio do texto.
Ao longo de 29 linhas espalhadas por seis parágrafos, o alerta aparece na 17ª linha, sem maior destaque:
“Urge ficar atentos, pois, situações com esta abrem espaço para salvadores da pátria, radicalismo e fundamentalismos que aumentam a crise e o sofrimento, especialmente dos mais pobres, além de ameaçar a democracia do país“.
Este o grande perigo por conta do passado da própria igreja. Convocar o povo às ruas para se manifestar é ótimo.
Mas, ao não se definir de forma clara a bandeira de luta – seja ela diretas Já, ou outra qualquer – acaba se abrindo espaço para “os salvadores da pátria” que surgirão defendendo intervenções, militares ou não.
Faltou defender a democracia e o Estado de Direito de forma mais explícita. Clara. Direta.
Quem conhece a CNBB de hoje e está atento ao que o Papa Francisco fala, certamente considerará difícil que a Igreja pregue uma nova Marcha de Deus Com a Família. Tal e qual ocorreu em 1964 quando ajudou a derrubar um governo legitimamente eleito e levou o país a 21 anos de ditadura militar.
Mas, nem todos a conhecem. Logo, a CNBB deveria ser mais clara e explícita para não dar margem a alimentar os “salvadores da pátria”, radicais e fundamentalistas.
Ou seja, a Igreja precisa descer do muro.
Leia a íntegra da nota da CNBB abaixo:
O Atual Momento Político segundo a CNBB
3 Comentários
Será que a igreja católica está a par de situações como esta?
Médico denuncia situação de calamidade extrema em hospital de Mato Grosso, onde trabalha:
https://youtu.be/qYWDB-0PnAA
A ambiguidade é o caminho de uma igreja conservadora governada por um papa progressista. Sou (ou fui) católica pensando na igreja dos pobres, mas vi que a meta cobiçada é a celebração de rituais para as elites. Mas não generalizo: há ministros e missionários vocacionados ao trabalho com os pobres, mas aparecem pouco. É possível um paralelo com a OAB, outrora tão vibrante.
Ótimo comentário Regina!!! Parabéns!!!