Reitor da UFRJ: “essa lógica de segurança faliu!”
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Marcelo Auler

Matéria publicada na edição deste sábado (10.03) do Jornal do Brasil.

A movimentação dos militares no Rio de Janeiro sob o comando do general Braga Netto, nomeado interventor, já está sob o foco e as atenções de distintos grupos, conselhos e observatórios.

Na mesma segunda-feira (05/03) em que o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, à noite, juntou setores da universidade e movimentos sociais para criar mecanismo de acompanhamento das ações militares, como noticiou o Jornal do Brasil e este Blog em Reitor da UFRJ quer monitorar a intervenção no Rio, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) promoveu encontro semelhante, à tarde, também no Rio. O Blog também apresentou entrevista com o reitor da UFRJ, professor Roberto Leher em que fala da falência da política que vem sendo adotada para o combate a violência – Reitor da UFRJ: “essa lógica de segurança faliu!”.

Após este encontro, a presidente do CNDH, a defensora pública da União Fabiana Severo, anunciou que o Conselho “questionará os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário sobre violações de direitos humanos decorrentes da intervenção militar”. Pedirá um encontro com a Procuradora Geral da República Raquel Dodge para solicitar alguma ação do MPF questionando o decreto que presidencial.

A reunião da tarde teve como anfitriã a procuradora Federal dos Direitos Humanos, Deborah Duprat – que tem assento no CNDH. Participaram ainda as Defensorias Públicas do Estado do Rio e da União; o MPF; o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro; e a OAB – Seccional RJ. Os movimentos sociais e comunitários presentes estão sendo preservados pela segurança dos seus membros. Muitos residem ou atuam nas comunidades onde ocorreram operações. Eles levaram os informes das violações dos direitos humanos.

Fabiana Severo, presidente CNDH (Foto: Ricardo Joffily/DPU)

Nem todos os casos, porém, chegaram ao conhecimento de Fabiana e Deborah. Por medo de retaliação, famílias cujos filhos – sem qualquer envolvimento com ações criminosas – tombaram em operações policiais, a partir da intervenção, silenciaram. Temem retaliação.

Com isso, os casos mais conhecidos são das prisões, por pára-quedistas, na manhã do sábado (03/03), na Vila Kennedy, zona Oeste do Rio. Um deles, com pouco mais de 20 anos, preso por se recusar a deitar no chão. Não foi prisão em flagrante. Teve apenas o chamado Termo Circunstanciado. Por isso, na Justiça Militar, no domingo à tarde, ganhou a liberdade.

Já o homem com 30 anos que não se deixou revistar e foi acusado de injuria racial contra um militar, teve flagrante registrado no Batalhão de Pára-quedistas. Só foi liberado na Audiência de Custódia, terça-feira (06/03). Ambos responderão processos na Auditoria Militar. Ou seja, serão submetidos ao Conselho de Justiça, composto pelo juiz togado e quatro oficiais militares.

O julgamento de civis pela Justiça Militar é uma das anomalias apontadas pelos que defende os direitos humanos.

Outra questão levantada por juristas, aí incluindo a Procuradoria Federal dos Direitos Humanos e o próprio CNDH, é a “falta de determinação clara dos fundamentos jurídicos e normativos que lastreiam as medidas implementadas”. Motivam a chamada insegurança jurídica, como disse a presidente do CNDH:

“O decreto de intervenção no Rio se sobrepõe a um decreto anterior de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que abre a possibilidade de atuação das Forças Armadas na segurança pública do estado. Segundo os relatos de organizações e movimentos presentes, a dificuldade de caracterização dos limites de cada ato normativo tem se mostrado uma das principais fontes de arbítrio e de violações de direitos, confundindo o papel do interventor com o papel de general em comando das tropas das Forças Armadas. É uma intervenção que, na prática, tem caráter militarizado”.

Respaldado nesta dubiedade é que o CNDH quer questionar o presidente da República, o Poder Legislativo e o Sistema de Justiça sobre a medida.

Oficialmente, o decreto de intervenção, de fevereiro deste ano, deu ao general Braga Netto o poder de gerir a segurança no Estado. Segundo o entendimento dos juristas, uma missão civil exercida por um militar.

Mas o decreto da intervenção não lhe deu poderes para o uso das tropas. Isto é feito com base no decreto de maio de 2017 que instituiu a GLO. Ele autoriza a atuação das Forças Armadas na segurança pública do estado.

Há, porém, outras iniciativas. A Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (FAFERJ), entidade com mais de 40 anos de existência criou comitês que monitorarão a movimentação das tropas em comunidades. O mesmo ocorre com a Câmara Municipal, a Assembleia Legislativa e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

Junto ao Ministério Público Federal, o procurador da República Júlio José Araújo Junior, lotado em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, instaurou Inquérito Civil Público “com o objetivo de  acompanhar, na Baixada Fluminense, os desdobramentos da intervenção federal decretada no Estado do Rio de Janeiro”.  Na Portaria 04/2018, ele determina, de pronto, que se solicite:

informações ao Centro Integrado de Comando e Controle da intervenção, para que este apresente, no prazo de 10 dias: i) os relatórios acerca das operações de GLO ocorridas na Baixada Fluminense desde a expedição do decreto de 28 de julho de 2017; ii) a relação de ações a serem adotadas para a Baixada Fluminense, apresentando, se existente, o respectivo plano; iii) as medidas que serão implementadas para promover a transparência e o diálogo com a população de forma permanente, bem como os mecanismos a serem utilizados;

informações à comissão de advogados da União destacados para acompanhar as atividades de intervenção acerca da existência de procedimentos pré-estabelecidos sobre os trabalhos a serem realizados, no prazo de 10 dias“.

Ainda marcou uma audiência pública para o dia 20 de março, no auditório desta Procuradoria, com o fim de colher demandas da população e garantir a prestação de informações sobre os desdobramentos da intervenção nesta região. Para a serão convidados além de “cidadãos em geral, entidades, acadêmicos, universidades e as autoridades, em especial as responsáveis pelo comando das operações durante a intervenção e as respectivas assessorias“. (Leia íntegra da Portaria abaixo)

Mobilização da Sociedade – A mobilização social em torno desta intervenção tem tido um efeito multiplicador. A preocupação no momento é fortalecer essas articulações que se espalham pela cidade e outros municípios, como deixou claro a professora Mariana Trota, na reunião realizada na UFRJ, segunda-feira (05/03). Já houve reunião com mais de 70 entidades. Há apoio, inclusive da Caixa de Assistência aos Advogados do Rio de Janeiro – CAARJ, em cujas instalações funcionou a Comissão Estadual da Verdade (CEV-RJ), para a criação da “Comissão Popular da Verdade”. Terá como objetivo uma maior articulação dos defensores dos direitos humanos, advogados que atuam nas favelas, nos movimentos sociais e na defesa dos direitos humanos.

Na próxima terça-feira (13/03), na UERJ, será lançada a Frente Contra a Intervenção Militar Federal no Rio de Janeiro. É uma iniciativa da Frente Nacional em Defesa das Instituições Públicas de Ensino Superior-RJ, juntamente com a FAFERJ e outras entidades. No dia 14, na Faculdade Nacional de Direito (FND) da UFRJ, na Rua Moncorvo Filho, no centro da cidade, junto ao Campo de Santana, haverá Aula Pública Contra a Intervenção Federal/Militar no RJ, ao meio dia,na porta da instituição.

Nesse domingo, 11 de março, às 11h00, o professor Michel Misse dará uma aula aberta para debater a intervenção em si e o papel dos militares no combate à violência – Que intervenção é essa? Trata-se de uma iniciativa de movimentos que defendem as eleições diretas já como solução para a crise política do país, como o Copacabana Por Diretas e Por Direitos.  Será na Praça Serzedelo Correia – Copacabana (Quadra da praia, entre as ruas Hilário de Gouveia e Siqueira Campos). Ou seja, debates não falta. Resta saber se conseguirão mobilizar o público.

Portaria 04/2018 do Procurador Júlio José instaurando ICP

(*) Esclarecimentos do Blog – Esta reportagem saiu publicada na edição deste sábado (10/03) do Jornal do Brasil impresso. Dentro do acordo firmado entre o editor do Blog e o JB, as matérias produzidas para o jornal estarão liberadas para o Blog, após a circulação do impresso. Como previsível, o espaço físico do jornal impresso limita o tamanho dos textos. A versão do Blog, portanto, contém informações que não couberam no impresso.

 

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5 Comentários

  1. C.Poivre disse:

    Igrejas cristãs se calam diante da violenta execução de Marielle Franco. Será porquê ela era pobre, negra, favelada, LGBT, de Esquerda e ativista em favor dos Direitos Humanos?

    https://caviaresquerda.blogspot.com.br/2018/03/para-que-servem-as-igrejas.html

  2. C.Poivre disse:

    PM está profundamente envolvida na execução da vereadora Mariello Franco:

    https://caviaresquerda.blogspot.com.br/2018/03/vereadora-marielle-franco-e-executada.html

  3. C.Poivre disse:

    Para não haver mais dúvidas sobre se estamos ou não sob uma ditadura:

    https://outraspalavras.net/maurolopes/2018/03/01/isso-que-esta-ai-nao-e-mais-democracia/

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