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Marcelo Auler*(***)

Ciro Gomes "esculhambar com deputado em aeroporto é muito bom. Muito bom mesmo". Foto: Marcelo Auler

Ciro Gomes “esculhambar com deputado em aeroporto é muito bom. Muito bom mesmo”. Foto: Marcelo Auler

Conhecido pela sua fala franca, críticas ácidas, até entre os amigos e aliados – como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva -, o  ex-governador do Ceará e ex-ministro de Lula , Ciro Gomes, mostra ceticismo com relação ao futuro da Republica. Para ele existe apenas uma saída: as manifestações nas ruas. Porém, exige mais: “é preciso aquecermos a linguagem dos protestos. Estamos lidando com uma república de bandidos”. A quem se mostra admirado com suas proposições de radicalização, ele alerta que ao se lidar com bandidos, “quem dá a arma é o inimigo”. Exemplifica:

Se a gente esquentar o protesto, a gente mostrar que nós, o povo brasileiro, unido, por esmagadora maioria, estamos de olho no que eles vão fazer e que não vamos aceitar trambique, nem soluções menores, eles são capazes até de mudar o seu próprio interesse pragmático do momento, em nome de uma sobrevivência política ou física“.

Física?

“Física, claro!  Porque se as pessoas mostrarem que estão zangadas, os políticos começam a temer. Esse negócio de esculhambar com deputado em aeroporto é muito bom. Muito bom mesmo. Tem que fazer. Estou dizendo a você, o país paga um preço também pela passividade”.

Ciro Gomes sobre black blocs: "eu compreendo com o meu coração" - Foto: Francisco Proner Ramos no Ocupa Brasília

Ciro Gomes sobre black blocs: “eu compreendo com o meu coração” – Foto: Francisco Proner Ramos no Ocupa Brasília

Dentro dessa sua linha de pensamento, até reconhece a ação dos black blocs :”Ah, eu compreendo com o meu coração“. Adverte, porém, para a necessidade de se evitar infiltrações. Segundo diz, elas contam com pessoas “muito provavelmente do próprio dispositivo policial. Infiltrados, para descaracterizar, diante de uma certa classe média, que está zangada, mas que fica assustada… Então temos que achar fórmulas de, organizadamente, esquentar o protesto, mas não se deixar manipular por infiltrados”.

Durante aproximadamente 30 minutos de conversa, da qual participou a nosso convite Maurício Dias, colunista da CartaCapital, Ciro deixou claro que pretende lutar pelo direito do povo eleger seu presidente, até em conformidade com a linha programática do PDT. O seu partido defende a antecipação das eleições de 2018 para a escolha não apenas do presidente e vice, como também de deputados e senadores. Mas, se mostra cético de que isso ocorra.

Assim como não acredita que a situação se resolva por algum gesto de Michel Temer, por ele tratado como “temerário”, ou mesmo do Congresso – ambos brindados com diversos adjetivos: reacionários, corruptos, inescrupulosos, sem dignidade, golpistas, salafrários, canalha, chicaneiros, entre outros -, também não dá crédito ao Supremo Tribunal Federal (STF) ou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Por isso, insiste que a saída só será conquistada se aumentarem as manifestações públicas. Porém, lembra, que não é possível convocar a população para “defender em abstrato a democracia“:

 “A descrença do povo é muito justa. Isso (defender a democracia de forma abstrata) é muito fácil para nós outros, com o bucho cheio, com quatro refeições

Critica ainda a manipulação de lideranças das organizações sociais, como fizeram “muitos do nosso lado, as forças progressistas”. A cooptação levou as lideranças a perderem “o veio de transmissão com a base“.

Nas palavras de Ciro Gomes, Lula deve se responsabilizar pelo "temerário": "Você deixar que um canalha desse se ponha na linha de sucessão, não ia esperar outra coisa".

Nas palavras de Ciro Gomes, Lula deve se responsabilizar pelo “temerário”: “Você deixar que um canalha desse se ponha na linha de sucessão, não ia esperar outra coisa”.

Apesar de sua metralhadora crítica se voltar mais para o “temerário” e sua base aliada no Congresso, o ex-ministro de Lula e Dilma não deixa de desaprovar também práticas e alianças dos governos petistas. Critica o próprio ex-presidente, mesmo ressaltando os lados positivos dos últimos 12 anos de governo. Censuras que considera necessário que sejam debatidas na hora de se buscar a construção de uma aliança:

Vamos continuar engabelando o povo com esse papo furado? Isso que precisa ser dito com clareza. O Povo está pronto. Agora, o povo precisa das mediações corretas para não se sentir engabelado, de novo. Quem é que botou o Michel Temer na linha de sucessão? Quem fez o Eduardo Cunha ter poder para eleger-se presidente da Câmara? (…) Na hora que a gente quiser construir unidade, eu exijo que a gente discuta tudo”.

Com este discurso, em que elogia as conquistas sociais promovidas pelo PT, mas bate nas alianças, no apoio aos políticos que classifica de salafrários e também na política econômica liberal, Gomes, na verdade, apresenta-se ao público como uma opção a Lula. Principalmente aos petistas desgostosos e críticos aos mesmos pontos. Mas, aparentemente, é algo para o futuro.

A entrevista com Ciro Gomes é apresentada aqui sem nenhum corte. Ela apenas foi editada, de forma a que suas explicações sejam contextualizadas. A ordem cronológica das perguntas também foi mantida. A edição dos vídeos contou, mais uma vez, com a ajuda de Américo Vermelho, fotógrafo e cinegrafista amigo do Blog. A ele e a Dias, agradeço a ajuda.

A Nação é a última preocupação – No seu entendimento, ao se violentar a regra básica da democracia com o golpe que destituiu Dilma Rousseff, transformou-se o processo político em uma “certa selva“. Hoje há uma conflagração absoluta, assentada no ódio, e os “principais homens do país não estão em conversa, não dialogam, não explicitam suas diferenças”. Aparentemente o país e a Nação são suas ultimas preocupações. Querem é sobreviver politicamente. E, possivelmente, longe da cadeia.

O Supremo em descrédito – Para Gomes, o descrédito da população com relação ao Supremo Tribunal está no fato dele ter ouvido “silente” a cassação do mandato de Dilma.

Cem por cento dos ministros do Supremo, não precisa ser muito profundo em Direito, sabem que a única circunstância que justificaria o impeachment seria o cometimento doloso, ou seja, com responsabilidade consciente, pessoal, personalíssima, da presidente da República… Nenhum deles duvida de que isso jamais aconteceu no país“.

Luta, lutar, lutar – O ex-governador está certo que Temer, “que não tem dignidade nenhuma” fará chicana no julgamento do Tribunal Superior Eleitoral, no próximo dia 6, para evitar seu afastamento. Enquanto ele não cai, prevê, “o país vai sangrar“.

Diante da constatação de que “o país precisa trabalhar, produzir, estudar”, conclui:

Nós precisamos ir para a rua para não deixar que nenhuma das conquistas que nos custaram muito sacrifício ao longo de anos, décadas, até séculos, sejam violentadas por um governo golpista e um Congresso majoritariamente salafrário“.

Precisamos esquentar os protesto – Ao explicitar sua tese de que Temer usará de todos os meios para permanecer no cargo, ele ataca: “Nós temos um canalha na presidência da República. Cansei de avisar isso antes”. Em consequência, expõe a necessidade de “esquentar a linguagem dos protestos”:

É tudo chicana. É tudo bandalheira. É tudo faroeste. Por isso, que eu, inclusive, apoio que a gente aqueça a linguagem dos protestos. Esse negócio de pacífico, não sei o que… tudo bem, nós devemos buscar os meios pacíficos que a democracia nos ensina. Mas quem dá a arma é o inimigo. Eu defendo que a gente esquente os protestos. Estamos lidando com uma república de bandidos“.

Em seguida admitiu compreender os black blocs “com o coração“.

Chamar o povo para resolver o problema –  Ao expor seu entendimento sobre a reforma do Código Eleitoral que instituiu a eleição direta, ele contesta que isto sirva para a substituição de presidente e vice. Porém, lembra que o Supremo tem sempre a última palavra na interpretação dos textos legais. Defende que isso aconteça: “seria uma grande providência pois entregaria ao conjunto da sociedade brasileira o deslinde desta crise“. Mas não acredita que ocorrerá. A quem acha que brigar pelas diretas é fazer o jogo de Lula, ele rebate:

É tão grave, tão importante, que se restaure a prevalência do voto popular sobre tudo mais na constituição da liderança do país, que pouco importa quem seria, mais ou menos, beneficiado se isto acontecesse. Podemos especular sobre a qualidade das candidaturas“.

Nas indiretas, Tasso é o melhor – Provocado pelos jornalistas, ele não se esquivou de falar sobre as chances do seu velho amigo, embora hoje adversário político no Ceará, Tasso Jereissati. Acha que o senador tem pouquíssimas chances. Entende que os deputados, maioria no Congresso, escolherão um dos seus. Mas, não esconde que diante das candidaturas indiretas que estão sendo colocadas, Jereissati seria a melhor opção pois, apesar de conservador, não se inclui, como a maioria, entre os picaretas. Bate firme também na suposta candidatura de Rodrigo Maia, atual presidente da Câmara, que considera “representante do baixo clero“:

Me parece que ele não tem qualificação em nenhum requisito para ser. Mas é uma potencialidade real

Esculhambar deputado é muito bom – A defesa da pressão em cima dos parlamentares surgiu quando justificou a tese da necessidade de esquentar a linguagem dos protestos. Segundo afirma, parlamentares, pressionados, “são capazes até de mudar o interesse pragmático em nome da sobrevivência política. Ou física“.

O povo se sentiu traído – Ao explicar a “passividade” que reconheceu como um dos males ao país, Gomes eximiu de responsabilidade o povo e assumiu-a para os que chamou de “nós outros”.

“Não digo o povo, não. Digo nós outros. Nós outros. O povo brasileiro se sente objeto, se sente cliente. O povo brasileiro não se sente agente do seu destino. Ele é vítima. Ele não é culpado de nada. O povo brasileiro se sentiu traído pelo PT, pela Dilma. Por isso que o povo brasileiro ficou perplexo”.

Apesar de toda a perplexidade popular, no seu entendimento, o que leva a população às manifestações são os casos concretos que todos repudiam – “concretudes antipopulares“, no linguajar do  ex-governador do Ceará. Exemplos são as violações dos direitos previdenciários e trabalhistas.

À mobilização também contribuiu “a novelização do escândalo”. Da mesma forma, as atitudes de Temer, totalmente condenáveis. Caso do seu relacionamento com “um cidadão que foi pilhado, filmado, recebendo uma mala de dinheiro”. Assim como o fato dele ter recebido “um gangster no Palácio do Jaburu, fora de agenda, conversando conversa porca”. Por fim, questiona:

“Aonde é que nós vamos mais?”

Conspiratas em Brasília – Para Gomes, no meio de mil conspiratas que ocorrem em Brasília, o presidente Temer “está agindo, sem nenhum tipo de escrúpulo, pensando em si mesmo. O país que se lasque. Mas está conseguindo sobreviver“.

Ele é do ramo. Bota essa turma toda, mexe com as ambições de todos e todos começam a deixar e ele ganha mais uma semana, ganha mais cinco dias, ganha mais dez dias, que é o que ele precisa (…) Como macaco velhíssimo que é, como mafioso que é, ele sabe mexer com essas ambições”.

Vamos continuar engabelando o povo? – As críticas ao PT, a Lula e a Dilma além de relacionadas às alianças com Temer e o PMDB se estendem, principalmente, à condução da política econômica, entregue a Joaquim Levy por Dilma. Lula é responsabilizado pela sua tentativa, às vésperas do impeachment, de entregar a economia nas mãos de Henrique Meirelles.

Aí nós dizemos ao povo que houve um golpe de estado e, o golpista, bota Meirellles como ministro da Fazenda. Tem alguma coisa errada aí“.

Mas, o foco principal está nas alianças políticas, mesmo depois da derrubada de Dilma “sem cometimento de qualquer crime de responsabilidade, apenas por conta do mau governo”:

“Quem cassou? O Senado. Como o PT votou para a mesa do Senado, agora? O PT elegeu Eunício de Oliveira, em troca de um carguinho e de sinecuras. Ou seja, nós vamos continuar engabelando o povo com esse papo furado?

Críticas ao PT, Lula e Dilma – Uma das críticas do ex-governador aos petistas é justamente a falta de censo crítico. O fato deles quererem aparecer como vítimas de perseguições políticas, sem admitir os erros cometidos no governo:

A turma não quer pensar. É toda uma história de vitimização, de nós somos perseguidos políticos. Parece que não cometemos erro nenhum. Não estou falando deste moralismo boboca, não. Estou falando de quem é que botou o Michel Temer ali na linha de sucessão? Quem deu poder a Eduardo Cunha para se eleger presidente das Câmara? O Lula entregou Furnas para ele. Na hora em que a gente quiser discutir unidade, eu exijo que a gente discuta tudo“.

Lava Jato: aplausos e vaidades – Ao falar da Operação Lava Jato, Gomes lembrou que ela era uma tábua de esperança no combate à corrupção no país, na medida em que sinalizou para o fim da impunidade “à safadeza dos grandes“.

Adverte, porém, que “o aplauso geral e a vaidade” subiram à cabeça dos operadores da operação que, de algum tempo para cá, “começaram a praticar irregularidades que vão dar nulidades“. Lembrou, inclusive, da Operação Satiagraha que terminou por dar a um acusado, “francamente culpado, de per si, pelo conjunto da obra, o banqueiro Daniel Dantas”, um certificado de inocência.(**)

Ainda tenho esperanças que eles se compenetrem

(**) Ao falar, no vídeo, da Operação Satiagraha, o ex-governador Ciro Gomes fez confusão com nomes e situações. Referiu-se a um procurador que teria sido afastado, citando Joaquim Fernandes de Souza que teria sido expulso da Procuradoria. Na verdade ele parece se referir ao procurador Luiz Francisco Fernandes de Souza, afastado por 45 dias pelo Conselho Nacional do Ministério Público, após representação de Eduardo Jorge Caldas Pereira, ex-secretário-geral da Presidência, na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Já o principal procurador da Operação Satiagraha foi Rodrigo de Grandis, que continua atuando no MPF. O juiz do caso, hoje desembargador do TRF-3 (São Paulo e Mato Grosso do Sul), é Fausto Martin De Sanctis.

(***) Reeditado às 21H40 para retirar a citação, errada, de que Ciro Gomes foi ministro de Dilma Rousseff. Na verdade, não foi. Ele ocupou o ministério de Itamar Franco (Fazenda, setembro de 1985 a janeiro 1985) e de Lula (Integração Nacional, janeiro de 2003 a março de 2006). Aos leitores peço desculpa pelo erro e agradeço aos que me alertaram.

amaerico-vermelho * A entrevista contou com a participação especial de Maurício Dias, colunista e editor da revista CartaCapital. A edição dos vídeos teve a ajuda de Américo Vermelho, da Luz e Sombra fotografias e vídeo. A ambos, renovo o meu agradecimento

10 Comentários

  1. oscar disse:

    fora pmdb, fora pt, fora psdb…corruptos, ladrões,…O temer diz que não há dinheiro, colocam o teto de gastos, ZERO de investimentos na educação, ZERO na saúde…pois dizem não haver dinheiro. Entretanto MALAS com milhões de reais circulam por aqui e por alí, enchendo os bolsos dos políticos deste país. QUE CRISE É ESSA?…Mentirosos, salafrários….

  2. Marcia disse:

    Um candidato a altura do tamanho do Brasil. Conhece nosso país como nenhum outro político. Eh preparado, bem qualificado e não podemos fechar os olhos para a grande verdade: eh o melhor nome para a presidência do Brasil.
    Admiro demais o político q passou por vários cargos: prefeito de Fortaleza, governador do Ceará, deputado estadual, deputado federal, ministro da fazenda, ministro da integração, secretário da saúde de Fortaleza, professor universitário etc
    Um abraço ao Ciro Gomes

  3. JOÃO BATISTA disse:

    Antes de tudo, antecipo que sou mineiro e não votei em Ciro quando ele foi candidato a presidente, mas votarei com gosto e proporei a quantos eu puder o voto nele na próxima eleição. Ciro é um grande político, que reúne experiência, bem sucedida e imaculada, na gestão pública como prefeito, governador, ministro da fazenda e ministro de integração, além de deputado estadual e deputado federal. Portanto, conhece por dentro os meandros do executivo e o legislativo. Jovem para resistir ao modelo de conciliação que levou ao golpe e maduro para enfrentar os grandes temas, está preparado para formar um governo que reúna as diferentes correntes políticas em torno de si, sem se deixar enredar por políticos tradicionais viciados de esquerda ou de centro. É Ciro!

  4. Allex disse:

    É muito fácil, cômodo e até oportunista você esculhambar o pt agora, Ciro Gomes. Quero ver é governar sem o pmdb (pelo menos até antes de todo esse circo de horrores), sem ceder cargos, sem fazer acordos para conseguir um mínimo de governabilidade. Outra coisa: você fala, fala, fala, mas não participa de nenhum ato pelas diretas, contra as reformas do temeroso, contra os abusos do judiciário.

  5. Ricardo Ernesto Vasquez Beltrão disse:

    Sempre bom ouvir e ler sobre Ciro Gomes, um grande quadro da esquerda brasileira, liderança destemida, esperança para 2018 (ou 2017?) para reconstituir o pacto democrático, e lançar o país a um novo patamar de desenvolvimento econômico voltado para a justiça social.

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